• Carregando...
A eutanásia dos rentistas e a revolução dos baixos juros
| Foto:

O ministro Paulo Guedes, em inúmeras ocasiões, apontou para a armadilha do baixo crescimento brasileiro, culpando basicamente o modelo falido da social-democracia, que produziu uma hipertrofia estatal. Com um estado obeso, e sem o “imposto inflacionário” como alternativa, o custo para fechar os rombos orçamentários recai sobre o mercado de crédito. Isso, por sua vez, pressiona a taxa de juros.

Traduzindo: um governo deficitário e sem perspectivas de inverter a tendência explosiva pagará sempre elevada taxa de juros para financiar seus rombos. Essa tem sido a história do Brasil há décadas. E o paraíso dos rentistas. Ou seja, emprestar para o governo e ir à praia tem rendido um retorno maior do que se arriscar no empreendedorismo, na bolsa, no mundo dos negócios. É uma distorção gigantesca que afeta inclusive a cultura.

Mas isso está mudando. Reformas importantes, começadas na gestão Temer, ganharam fôlego no governo Bolsonaro. A principal delas é a previdenciária, para estancar a sangria fiscal, já que os gastos com aposentadorias representam a maior parcela no todo, além de trajetória insustentável. Além disso, temos a MP da Liberdade Econômica, que reduz a burocracia para se empreender, as mudanças nas leis trabalhistas, flexibilizando o mercado de trabalho, e a reforma tributária, em discussão, e as privatizações, que trazem racionalidade para setores importantes.

Tudo isso produz um cenário de maior otimismo à frente. Os investidores sentem que a economia terá mais estabilidade no futuro. O que ainda produz maiores incertezas é o lado político, a instabilidade gerada pelo “gabinete do ódio”, como o Estadão chamou o núcleo duro do bolsonarismo, sob liderança do filho do presidente, Carlos, e do guru, Olavo de Carvalho. Esse clima de permanente guerra na política em nada ajuda, assim como a insegurança jurídica gerada pelo STF.

Não obstante, alguns indicadores, influenciados pelo ambiente externo também, acusam o golpe das mudanças positivas. O Brasil vai mudando, aos poucos, tornando-se mais civilizado em termos financeiros. O CDS, um seguro que mede o risco do governo, vem caindo sistematicamente e está em patamares mínimos históricos. E a própria taxa de juros, medida pelo Selic, segue em ritmo de queda, também no mínimo histórico.

Ao reduzir a taxa básica de juros (Selic) de 6% para 5,5%, o menor patamar da história, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, sinalizou que a porta para novos cortes está aberta, o que animou o mercado nesta quinta-feira (19/9). Em meio ao cenário econômico com inflação controlada, mas com baixo crescimento, economistas reduziram as projeções para a Selic no fim do ano a um patamar inferior a 5%, podendo permanecer assim ao longo de 2020. Alguns, inclusive, admitem que é possível ter juro real negativo durante o processo.

A previsão para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) é de 3,45%. Logo, é bem possível que os juros reais (descontada a inflação) fiquem negativos. Essa possibilidade é cogitada caso as previsões do BNP Paribas, que estima que a Selic chegará a 4,25% no fim do ano, se concretizem.

Para o diretor da Mirae Asset, Pablo Spyer, o país está prestes a entrar em uma nova era se a Selic atingir esse patamar, com juros reais negativos. “Com a Selic a 5,5%, e se tirarmos, em média, 20% de Imposto de Renda, uma aplicação indexada a essa taxa daria 4,40%  ao ano, o que, descontado o IPCA a 3,45%, levaria o ganho real para 0,95%. Mas, se a Selic ficar em 4,40% ou abaixo disso, o Brasil entra no rol dos países com juros reais negativos. Será preciso tomar riscos para ganhar dinheiro no país”, destacou.

Trata-se de um quadro totalmente novo para a realidade brasileira. O poupador brasileiro está acostumado a investir em títulos públicos de renda fixa, quando não na poupança. Mas isso não deverá mais gerar um retorno razoável. É a “eutanásia do rentista”, que terá de buscar alternativas mais arriscadas.

Em parte, o Ibovespa acima dos 100 mil pontos é reflexo disso. Mas se a tendência se mostrar sustentável, se for uma mudança estrutural, o que depende das reformas continuarem, haverá muito mais espaço para altas. O mercado de capitais como um todo tende a se desenvolver mais. Poderemos ter mais IPOs, mais empresas buscando essa rota de financiamento para seus projetos, abrindo capital. Fundos “anjos” ou “venture capital”, que atuam na fase inicial dos negócios, podem deslanchar também.

De olho nisso, várias empresas se mexem, e o caso de maior sucesso, claro, é o da XP Inc, que poderá fazer seu próprio IPO este ano ou ano que vem. Consultorias e gestoras independentes também crescem, pois o consumidor vai precisar de conselho profissional, de auxílio na hora de investir sua poupança. Acabou a molezinha de colocar em fundos DI e curtir a vida, com elevado retorno garantido pela excrescência do quadro fiscal. Essa situação, aliás, foi a responsável pela produção da maior desigualdade de renda da história.

Se o Congresso deixar, se o STF não estragar tudo, se o governo não se perder em polêmicas desnecessárias causadas pelo “gabinete da raiva”, então o Brasil tem, de fato, uma oportunidade única nas mãos. É deixar a brilhante equipe liberal de Paulo Guedes seguir com seus trabalhos, aprovar as principais reformas, conter o buraco fiscal, facilitar a vida dos empreendedores, abrir mais a economia, e colher os frutos do “milagre” capitalista.

* Disclaimer: Sócio da SameSide, Gestora Independente

Rodrigo Constantino

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]