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Marine Le Pen tem uma agenda nacionalista e antiliberal
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Sou um economista liberal que critica o excesso de foco dos liberais na economia, lembrando que nem tudo se resume ao aspecto econômico e que devemos, sim, beber da fonte conservadora em muitos casos, pois a liberdade individual não sobrevive num vácuo de valores morais e sem ordem social. É um grande erro, em minha opinião, o liberal confundir liberdade com libertinagem e ignorar a agenda cultural da esquerda, que vem minando todas as tradições que sustentam nossa civilização.

Dito isso, não poderia jamais cair no outro extremo, qual seja, ignorar que certos “direitistas” abandonam completamente a agenda liberal econômica, mostrando-se nacionalistas e intervencionistas de uma forma absurda e incompatível com o liberalismo que defendo. Trump flertou com isso, e mereceu várias críticas minhas nesse sentido. Jair Bolsonaro claramente segue nesse caminho, quando critica as privatizações ou defende a mão visível do estado como locomotiva do progresso (na exploração do nióbio, por exemplo).

Mas o pior caso, de longe, é o de Marine Le Pen, associada à “extrema-direita” francesa. A candidata, que disputará o segundo turno com o mais moderado Macron (um tanto adesista ao establishment para o meu gosto), tem uma agenda nacionalista que delega ao estado um papel enorme na economia, o que é inaceitável para liberais. Leandro Narloch, em seu blog Politicamente Incorreto na Gazeta, resume algumas bandeiras que se confundem com as do PSOL, de Jean Wyllys:

  • Barrar a reforma da Previdência e diminuir a idade de aposentadoria para 60 anos.
  • Barrar a reforma trabalhista e o aumento da jornada de trabalho.
  • Proteger a indústria nacional por meio de impostos de importação.
  • Abandonar tratados de livre comércio internacional que levariam empresas a “explorar mão-de-obra barata na Ásia”.
  • Cortar impostos das famílias mais pobres e ao mesmo tempo investir mais em serviços públicos. O dinheiro para compensar a queda da arrecadação viria do combate à sonegação e evasão fiscal.

Por suas posições nacionalistas e contrárias à imigração, Marine Le Pen ocupa o lugar da extrema-direita na eleição da França. Esse rótulo esconde a semelhança de suas propostas econômicas com as da esquerda brasileira. As cinco medidas acima sairiam com naturalidade do gabinete do deputado Jean Wyllys, mas todas integram o programa da candidata francesa.

[…] Le Pen é uma antiliberal em quase todos os sentidos. Se liberais defendem a livre circulação de ideias, pessoas e coisas, a francesa só não avança sobre a livre circulação de ideias. Quer mais governo nas fronteiras, mais serviços públicos que parecem grátis, mais protecionismo, menos produtos importados nas prateleiras dos mercados.

Não há como discordar. A questão da fronteira talvez seja o ponto-chave aqui: os liberais mais ingênuos acham que ainda dá para defender fronteiras abertas no mundo de hoje, como se a imigração de muçulmanos não representasse uma ameaça concreta ao Ocidente. Quem quer que se coloque contrário a tal visão romântica terá o apoio de boa parte da população, como vemos, e será acusado de “xenófobo” e “ultraconservador” pela imprensa.

Os liberais não podem fingir que o dilema não existe. Ele é real. Escancarar as fronteiras no contexto de hoje significa colocar em risco a própria sobrevivência da liberdade, e todos devem estar atentos a isso. Não é para se fechar ao mundo, claro, mas para endurecer nos critérios de aceitação de quem pode migrar. O mínimo que se espera é que o imigrante aceite o básico dos valores do lugar que escolheu viver, ou seja, que ele esteja disposto a assimilar a cultura local, não impor a sua própria.

Tirando isso, não dá mesmo para confundir uma intervencionista como Le Pen com o que prega a direita liberal, ou mesmo a conservadora de boa estirpe! Misturar Edmund Burke com Le Pen é uma injustiça com o “pai do conservadorismo”. Marcelo Faria, do ILISP, foi ainda mais fundo na análise da agenda de Le Pen, e fica claro que ela não guarda ligação alguma com o liberalismo ou com o conservadorismo da linhagem britânica.

Nós, liberais e conservadores, não devemos aceitar de forma apressada qualquer um em nossos redutos políticos, sem a devida crítica, só porque endossam algumas bandeiras de nossas doutrinas. Não basta atacar os “globalistas” para ser um liberal ou um conservador, até porque muitos têm usado essa desculpa para atacar junto a globalização, a abertura dos mercados, e a livre iniciativa, em troca de um governo autoritário e intervencionista. Desses, queremos distância.

Rodrigo Constantino

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