Por João Luiz Mauad, publicado pelo Instituto Liberal
Donald Trump e Theresa May, dois mandatários empossados recentemente, oriundos de partidos genuinamente conservadores em seus respectivos países, têm mostrado visões absolutamente distintas a respeito de comércio internacional. Trump, em seu discurso inaugural, reiterou suas diatribes de campanha contra os produtos importados de outros países, prometendo que, de agora em diante, tudo será diferente:
“Estamos emitindo um novo decreto para ser ouvido em cada cidade, em cada capital estrangeira e em cada corredor de poder. A partir deste dia, uma nova visão governará nossa terra. A partir deste dia em diante, será apenas a América em primeiro lugar, a América em primeiro lugar.
Todas as decisões sobre comércio, impostos, imigração e assuntos externos serão feitas para beneficiar os trabalhadores americanos e as famílias americanas. Devemos proteger nossas fronteiras dos estragos de outros países que fabricam nossos produtos, roubam nossas empresas e destroem nossos empregos. Essa proteção levará a grande prosperidade e força. Eu vou lutar por vocês com todas as forças do meu corpo e nunca vou deixar vocês por baixo.
A América vai começar a ganhar novamente. Ganhando como nunca antes.
Nós vamos trazer de volta os nossos empregos, vamos trazer de volta as nossas fronteiras, vamos trazer de volta a nossa riqueza, e vamos trazer de volta os nossos sonhos.”
Esse tipo de discurso costuma fazer muito sucesso nos ouvidos daqueles que sabem pouco ou quase nada de economia. Daqueles que ignoram o fato de que, como ensinava Bastiat, “na esfera econômica, um ato, um hábito, uma instituição, uma lei, não geram somente um efeito, mas uma série de efeitos. Dentre esses, só o primeiro é imediato. Manifesta-se simultaneamente com a sua causa. É visível. Os outros só aparecem depois e não são visíveis. Podemo-nos dar por felizes se conseguirmos prevê-los… Entre um bom e um mau economista existe uma diferença: um se detém no efeito que se vê; o outro leva em conta tanto o efeito que se vê quanto aqueles que se devem prever.”
Não é o caso da primeira-ministra Theresa May, que parece entender perfeitamente as vantagens do livre comércio, tanto que, três dias antes do discurso inaugural de Trump, ela falou aos europeus sobre as intenções da Grã-Bretanha com o “Brexit”, cuja implementação será operada por ela.
May deixou claro que a Grã Bretanha tem a intenção de abraçar e expandir seu papel como uma nação de livre comércio. Não se ouviu ali nenhuma conversa de que seu país está sendo prejudicado ou “estuprado” por seus sócios comerciais. Não se mencionou ali uma palavra sobre “compra britânica” ou tarifas punitivas sobre companhias que investem no exterior.
Em vez disso, May falou de aproveitar o Brexit “para construir uma verdadeira Grã-Bretanha Global. Um país que deseja manter os velhos amigos e fazer novos aliados. Uma nação grande, global, negociadora. E uma dos mais firmes defensoras do livre comércio em qualquer parte do mundo”.
Mas deixemos que a própria May nos fale de suas intenções e projetos:
“Não é simplesmente porque nossa história e cultura são profundamente internacionalistas, embora isso seja importante. Muitos na Grã-Bretanha sempre sentiram que o lugar do Reino Unido na União Européia veio à custa de nossos laços globais e de um abraço mais ousado no livre comércio com o mundo mais amplo. …
Não queremos voltar o relógio para os dias em que a Europa era menos pacífica, menos segura e menos capaz de negociar livremente. [Brexit] Foi um voto para restabelecer, como se vê, a nossa democracia parlamentar, a autodeterminação nacional e nos tornarmos ainda mais globais e internacionalistas, na ação e no espírito.
Continuaremos a ser parceiros confiáveis, aliados dispostos e amigos próximos. Queremos comprar os seus bens e serviços e vender a vocês os nossos, negociar com vocês o mais livremente possível e trabalhar uns com os outros para garantir que todos estejamos mais seguros e mais prósperos, através da amizade permanente. …
[Um acordo pós-Brexit] deve permitir o comércio mais livre possível de bens e serviços entre a Grã-Bretanha e os Estados-Membros da UE. Deveria dar às empresas britânicas a máxima liberdade para negociar e operar nos mercados europeus – e permitir que as empresas européias façam o mesmo na Grã-Bretanha. …
[Mas] Nós queremos também fazer parte de um mercado mais amplo, negociar e fazer negócios em todo o mundo. Países como a China, o Brasil e os Estados do Golfo já manifestaram seu interesse em negociar conosco. Começamos discussões sobre futuros laços comerciais com países como Austrália, Nova Zelândia e Índia.
Nossos fins são claros: queremos remover tantas barreiras ao comércio quanto possível. Queremos que a Grã-Bretanha seja livre para estabelecer seus próprios acordos tarifários na Organização Mundial do Comércio, o que significa que podemos chegar a novos acordos comerciais não apenas com a União Europeia, mas também com antigos amigos e novos aliados fora da Europa. …
… O tipo de acordo que descrevi hoje é a coisa economicamente racional que tanto a Grã-Bretanha como a UE devem procurar. Porque o comércio não é um jogo de soma zero: é algo que nos torna a todos mais prósperos. O comércio livre entre a Grã-Bretanha e a União Europeia significa mais comércio e mais comércio significa mais emprego e mais criação de riqueza. A criação de novas barreiras ao comércio, entretanto, significa o inverso: menos comércio, menos empregos, menor crescimento.
Quanta diferença, não é mesmo? Quem tem razão? Só o tempo dirá. Porém, no que depender de quem entende do assunto, do homem cujo livro texto de economia é o mais vendido do mundo há anos, a razão está com a primeira ministra.