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O estado brasileiro é paquidérmico e esmaga a energia criadora de riqueza no país O estado brasileiro é paquidérmico e esmaga a energia criadora de riqueza no país

É preciso separar a crise atual que assola o Brasil em duas partes distintas, uma conjuntural e outra estrutural. De um lado temos toda a incompetência ideológica do PT, a roubalheira desenfreada, o intervencionismo estatal, a expansão irresponsável de gastos e crédito públicos; do outro, temos a Constituição “cidadã” que não cabe no PIB, fruto de uma demanda social reprimida, do clima de vingança ao regime militar e assinada um ano antes da queda do Muro de Berlim.

Quando dividimos a análise por horizonte, fica claro que as divergências entre os três economistas ligados ao PSDB, que responsabilizam parcialmente o modelo social que vem de antes do PT, e o jornalista Guilherme Fiuza não chegam a ser tão graves assim. Samuel Pessôa, Marcos Lisboa e Mansueto Almeida acertam ao também incluir o “pacto social” no rol dos culpados, e Fiuza está certo ao chamar a atenção para o estrago enorme que o populismo corrupto do PT causou nos últimos anos.

É importante separar a análise por prazo, pois remédios tanto conjunturais como estruturais são necessários. No curto prazo, tirar o PT do poder, mudar o rumo da economia, resgatar a confiança e as finanças públicas é questão de sobrevivência, de evitar o destino trágico da Argentina. Mas no longo prazo, quando a meta mais premente de se livrar do PT for alcançada, mudanças estruturais serão fundamentais para colocar o país na rota do desenvolvimento sustentável.

O editorial do GLOBO de hoje fala sobre a falência do estado tutor, justamente o que está previsto na Constituição “besteirol”, como dizia Roberto Campos. Logo na abertura, o jornal reconhece que o rebaixamento do grau de investimento pela S&P é obra petista, mas isso não o impede de se afastar um pouco da árvore podre e enxergar a floresta – também apodrecida:

O aspecto negativo da Carta deriva de uma visão ideológica de mundo por meio da qual ela foi redigida, com o Estado sendo colocado sobre a sociedade, no papel de uma espécie de tutor que concentraria o máximo das rendas da sociedade, extraídas por elevados impostos, com a finalidade de distribuí-las para mitigar a pobreza. O Estado seria o agente do “bem”.

Já naquela época se tratava de uma percepção míope da realidade. A prova veio em 1989, logo no ano seguinte ao da promulgação da Carta, quando caiu o Muro de Berlim, símbolo do modelo da centralização extrema de tudo pelo Estado, sistema testado na União Soviética, e reprovado.

A Constituição seguiu essa tendência nos gastos sociais. Caberia unicamente ao Estado eliminar a pobreza. Foi assim que, em mais ou menos uma década, entre governos tucanos e petistas, a carga tributária deu um salto de dez pontos percentuais, de 25% para 35% do PIB. Estima-se que esteja hoje na faixa de 37%, uma enormidade, se comparada com outras economias emergentes. Chega mesmo a rivalizar com a soma dos tributos de sociedades desenvolvidas —, mas estas dão em troca ao contribuintes serviços básicos de boa qualidade. Não é o caso do Brasil.

Sem dúvida não é nosso caso. Mas a insistência na crença do estado tutor, empresário e justiceiro é espantosa. O resultado é que cerca de 90% do orçamento público é dinheiro carimbado, gasto mandatário sem muita margem de manobra. A Previdência Social é o maior dreno, mas temos também os “programas sociais”, a folha de pagamento dos servidores públicos e vários outros itens não-discricionários. As trapalhadas do PT encurtaram o encontro com a dura realidade, mas ele seria inevitável mais cedo ou mais tarde, sem reformas estruturais.

Claro, o poder de estrago do lulopetismo não pode ser subestimado. Ele pegou algo que já era ruim e conseguiu piorar muito. E sua reação também é assustadora: quer mais impostos, quer taxar “grandes fortunas”, quer a volta da CPMF. Está em seu DNA lutar por mais estado sempre, e o artigo de contraponto ao editorial é prova disso. Escrito por Enio Verri, deputado federal do PT, mostra que não entenderam nada, que insistem nessa mentalidade de estado tutor, claramente falida.

Diante desse quadro, alguns economistas sérios ainda alimentam esperanças de que a própria presidente Dilma pode ter algum lampejo de bom senso e seguir na direção correta. O diagnóstico e as receitas propostas por Arminio Fraga neste domingo, que comentei aqui, seguem nessa linha, e a coluna de hoje de Paulo Guedes endossa o receituário, com alguma esperança de que Dilma possa segui-lo e tentar salvar seu nome na História. Sonhar não custa nada, e Guedes decide sonhar:

Mas imagine agora que Dilma encaminhe ao Congresso um programa emergencial de controle de gastos públicos para seus três próximos anos de governo, garantindo superávit primário crescente, de 1%, 2% e 3% do PIB, como proposto por Armínio Fraga em O GLOBO de ontem.

Imagine também que a presidente tivesse sucesso em convencer a assumir o Banco Central o próprio Armínio Fraga, o que lhe seria certamente ainda mais desagradável de fazer e difícil de conseguir do que foi nomear Levy seu ministro da Fazenda.

Dilma estaria se propondo a devolver o país à mesma rota em que o recebeu, com as finanças públicas razoavelmente em ordem, um Banco Central operacionalmente autônomo e a inflação de volta à meta dos 4,5% ao ano. A flexibilidade cambial terá feito o ajuste das contas externas.

Dilma não vai fazer nada disso, e a crise econômica vai se agravar. Não é de seu perfil ter a humildade para reconhecer os erros dessa forma e mudar totalmente a rota. É por isso que gosto de separar a análise por horizonte. Partindo da premissa realista de que o PT não vai mudar, que sua essência é o estatismo doentio e ideológico, resta somente a alternativa de se livrar dos petistas no curto prazo, para impedir uma desgraça ainda maior.

Mas, isso conquistado, que não parece pouco, claro que há o dia seguinte, como nos lembra o jornalista Carlos Alberto Di Franco em sua coluna de hoje:

di franco

Apear o PT do poder é uma meta nobre e necessária, mas concordo que é muito pouco. O estado faliu com a enorme ajuda dos petistas, mas ele iria falir inevitavelmente um dia sem reformas estruturais. O papel do PT foi amplificar e antecipar o estrago. Mas os problemas estruturais persistem. O modelo do estado tutor e empresário está esgotado.

Um artigo excelente publicado no Estadão semana passada por Marcos Mendes, que tem graduação, mestrado e doutorado em economia, mas não assina como economista, “pois não é filiado ao conselho regional de economia e não quer ser processado por isso”, toca na ferida ao relatar uma divertida fábula da improdutividade brasileira. Ele conclui, condenando o sistema e o mecanismo de incentivos:

Nenhum dos personagens acima citados tem comportamento ilegal. Eles jogam o jogo de acordo com as regras que estão postas. O erro está nas regras. Mudá-las requer superar as dificuldades das decisões coletivas. Não mudá-las implica continuar com talentos profissionais e dinheiro público mal alocados, empregos improdutivos, potenciais inexplorados, gasto público excessivo, oportunidades perdidas, incentivos errados. Uma fábula de improdutividade. 

O Brasil precisa reformar suas instituições, ao mesmo tempo que precisa mudar sua mentalidade, sua cultura estatizante. O foco precisa estar no curto prazo – eliminar o PT da política para impedir um estrago ainda maior, e no longo prazo – mexer nas regras do jogo, reduzir o tamanho e o escopo do estado, fazer as reformas estruturais. Não são metas excludentes. Ao contrário: somente atacando o PT teremos chance de realizar as mudanças estruturais. Mas derrotar o PT é apenas o primeiro passo nessa longa jornada liberalizante.

Rodrigo Constantino

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