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Carne faz inflação ultrapassar a meta em 2019: e agora?
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O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), considerado a inflação oficial do Brasil, fechou 2019 em 4,31%, ultrapassando o centro da meta para o ano, que era de 4,25%. Em 2018, o índice ficou em 3,75%.

Trata-se da maior inflação anual desde 2016, quando o índice ficou em 6,29%, segundo divulgou o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) nesta sexta-feira (10).

Em dezembro, o IPCA acelerou para 1,15%, após ter registrado taxa de 0,51% em novembro, segundo divulgou nesta sexta-feira (10) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Trata-se do maior resultado para um mês de dezembro desde 2002, quando o IPCA ficou em 2,10%.

A inflação de 4,31% em 2019 foi pressionada principalmente, pelo grupo "Alimentação e bebidas", que apresentou alta de 6,37% no ano e impacto de 1,57 ponto percentual no acumulado de 2019. Na sequência, pesaram os custos dos "Transportes" (3,57%) e "Saúde e cuidados pessoais" (5,41%), com impactos de 0,66 p.p. e 0,65 p.p., respectivamente.

O grande vilão da inflação em 2019 foi, sem dúvida, a carne, que teve alta de 32,40%, representando um impacto de 0,86 pontos percentuais (p.p.) no indicador geral. Ou seja, se o preço das carnes tivesse ficado estável no ano, a inflação de 2019 teria fechado em 3,54%.

Algumas considerações importantes. Em primeiro lugar, cada indivíduo tem sua própria inflação, pois nenhuma cesta de consumo é exatamente igual. Claro que, para efeitos macroeconômicos, precisamos de alguma medida, de uma média qualquer com base na escolha relativamente arbitrária de itens.

A carne, que pesa bastante no IPCA, disparou por conta de problemas na China. Logo, essa alta tem um fator pontual, conjuntural, que precisa ser levado em conta, ainda que poucos esperem uma queda brusca no curto prazo. Os problemas persistem.

O outro ponto importante é que inflação é sempre um fenômeno monetário, como sabia Milton Friedman. Choques de oferta e demanda causam variações relativas, mas não aumento sistemático de preços na economia. Se a carne subiu por mais demanda chinesa, por exemplo, o brasileiro vai cortar seu consumo e a menor demanda reduziria o preço, ou vai consumir mais de outro produto, pressionando seu preço. O que ocorre são mudanças nos preços relativos, portanto.

Para um aumento geral dos preços é preciso ter uma política governamental de expansão da base monetária e/ou do crédito. Aqui entra a questão relevante: estamos com a menor taxa básica de juros da história, com a Selic fechando o ano passado em 4,5% ao ano. E os bancos públicos estão forçando uma queda dos juros para ampliar a base de crédito.

O presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, quer reduzir a taxa do cheque especial para o patamar de 2% ao mês. Em entrevista exclusiva ao GLOBO, ele disse que o banco aposta na redução da inadimplência e na ampliação da base de clientes para viabilizar esse movimento e já determinou à sua equipe que se debruce sobre o tema.

Ele reforçou ainda a determinação de fazer uma “revolução” no financiamento habitacional no Brasil, com a nova linha de financiamento com juros fixos, sem correção, a ser anunciada em meados de março.

Ou seja, a combinação de uma demanda mais forte de certos produtos, de choques de oferta, e de expansão monetária não costuma ser das mais amigáveis para a inflação. É verdade que ainda temos um índice dentro da meta, mesmo com o fenômeno da carne. Não é nada assustador ainda, portanto. Mas todo cuidado é pouco.

Se a inflação voltar a subir de forma consistente, o Banco Central terá de interromper o ciclo de redução dos juros ou mesmo voltar a aumentar a Selic. Nunca se pode brincar com o dragão inflacionário, ainda mais num país como o Brasil, com seu terrível histórico nessa área. A conquista do controle inflacionário veio para ficar, e o governo que flertar com a leniência nesse sentido pagará elevado custo, como Dilma pode dizer.

Com a equipe técnica de primeira que esse governo tem, a maioria com sólida formação liberal, estou confiante de que esse não será o caso. Se a inflação se mostrar resiliente, o Banco Central vai agir de forma preventiva, com custo menor. A autonomia do BC, aliás, é um dos projetos apresentados pelo governo que devem ser votados neste ano. Bom sinal.

Mas essa postura agressiva dos bancos públicos na concessão de crédito deveria ser analisada com muita cautela. É aí que mora o maior perigo, em minha opinião. Resistir à tentação eleitoreira é sempre um desafio e tanto.

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