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Guerra entre mídia e Bolsonaro interessa a ambos, mas não ao Brasil
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A imprensa precisa ser independente, corajosa e fazer as perguntas incômodas. O governo precisa ser transparente, governar para o povo em geral, e prestar contas à população. Isso numa democracia saudável, quiçá ideal. Estamos longe disso.

No Brasil, boa parte da mídia torce contra, tem claro viés ideológico e não suporta o presidente ou qualquer coisa à direita dos tucanos esquerdistas. Como reação a isso, o presidente ataca a mídia, xinga jornalistas, cria factoides e evita entrevistas.

Essa guerra interessa a ambos os lados. A imprensa militante do contra pode perder alguma verba estatal, mas ganha audiência por ser alvo de tantos ataques do presidente. O presidente ganha aplausos da sua militância por "mitar" contra a imprensa enviesada. Mas quem perde é o público interessado nas notícias relevantes.

O melhor exemplo se deu hoje mesmo, e eu estava lá para ver in loco. O presidente, falando nesta segunda para a comunidade brasileira de Miami, repleta de fãs que gritavam "mito" e "amém", sentiu-se à vontade no clima favorável e descontraído e acabou subindo o tom.

Ele disse que aquela grande emissora não é lixo, pois lixo é reciclável, e que o "jornaleco Folha alguma coisa" só sabe critica-lo, distorcendo o que diz, ou inventando quando não diz. E criou o factoide: teria provas de que a eleição foi fraudada pelas urnas, e que sem isso teria vencido no primeiro turno.

Era dada a deixa para as manchetes. Todos nós, na mesma hora, farejando a chamada, digitamos às pressas a bomba: presidente acusa eleição de fraude! E nada mais vira notícia ali, não há mais assunto. O presidente foge, assim, das questões delicadas como coronavírus ou derretimento das bolsas, e os jornalistas ignoram as conquistas da viagem.

Bolsonaro parou para falar com os jornalistas que cobriam sua passagem pela Flórida pela primeira vez nesta terça, e cobrou uma condição: "É para falar da viagem?". Mas após duas perguntas sobre o tema, logo quiseram saber sobre a pauta do dia: as eleições foram fraudadas mesmo? Você não confia na Justiça? Isso o irritou e a entrevista foi encerrada ali. Pena, pois eu tinha perguntas sobre a viagem, como dá para ouvir nesse vídeo que gravei, onde tento saber sobre a Venezuela:

Bolsonaro partiu logo depois para Jacksonville e meus dias de repórter chegaram ao fim. Volto ao meu trabalho de comentar o que os repórteres publicam de notícias (e também o que não publicam). Tentei ser objetivo, e espero que tenham gostado.

Minha experiência com os jornalistas nesses três dias foi a seguinte: tem gente séria, moderada e trabalhadora; tem um corporativismo até natural, pois andam em patota; isso gera trocas que acabam influenciando no tom das reportagens, daí o claro viés "progressista" geral; alguns querem só picuinha e lacre mesmo.

Houve um momento sintomático que ilustra bem isso: após a palestra, todos se juntaram na mesma mesa para almoçar e escrever suas reportagens. Conversavam entre si, claro. Eu preferi ficar isolado em outra mesa, sozinho. Meu julgamento fica mais isento assim, creio. Elas nem notam mais o viés do "bando".

Vou dar um exemplo, entre tantos: quantos jornalistas usam em suas chamadas ou mesmo reportagens a expressão "extrema esquerda" ou então "socialista" para se referir a... socialistas? Eis um caso de hoje:

Social-democrata? Só rindo. Ok, já é melhor do que "liberal", que outro dia um veículo desses usou. Mas qual a dificuldade em aceitar que o velho é socialista, comunista? Ele mesmo se define como socialista!

Trump, que sempre foi democrata, acaba rotulado de: ultraconservador, radical, autoritário, extrema direita, neofascista, supremacista branco; Sanders, que sempre foi comuna, vira: liberal, social-democrata, independente. E questionam por que a mídia anda sem credibilidade...

É contra esse escancarado viés que luto, pois entendo que ele é responsável pelos excessos do outro lado, acaba produzindo como efeito essa reação bolsonarista. A turma cansa! Será que não é do interesse do povo falar mais em detalhes sobre as parcerias entre Brasil e Estados Unidos do que sobre a fala leviana do presidente? O que tem mais relevância de longo prazo? O que impacta mais a vida do povo?

Mas nossos jornalistas, em geral, são mais corajosos e firmes quando entrevistam direitistas. Ciro Gomes, por exemplo, vai ao Roda Viva em breve. Será que algum jornalista escalado pela Vera Magalhães terá coragem de perguntar se é com retroescavadeira em cima de grevista que se constrói uma democracia sólida? Ou no combate ao "fascismo imaginário" vale tudo?

Vocês acham mesmo, meus caros colegas, que o público não percebe o duplo padrão? Então precisam sair da bolha...

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