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Devemos temer Temer? Ou: Alguém acha mesmo que dá para ser pior do que Dilma?
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O uso do trocadilho é irresistível, mas pergunto com seriedade: devemos temer Temer? Com a popularidade de Dilma caindo a um dígito apenas, e as manifestações de domingo ganhando cada vez mais peso nas redes sociais e também fora delas, o impeachment passa a ser cada vez mais uma possibilidade concreta. Já tem até partido o defendendo abertamente.

Com isso, surge automaticamente uma questão: e se Michel Temer for o presidente do Brasil? Petistas e simpatizantes, abertos ou disfarçados, espalham a ideia de que seria terrível para o país entregar o poder diretamente para o PMDB. O discurso vai mais ou menos na seguinte linha: você acha que as coisas estão ruins hoje? Então espere para ver como serão se Temer for o presidente!

Em sua coluna de hoje no GLOBO, Luiz Garcia foi por essa linha de raciocínio, defendendo que a estratégia dos tucanos, expressa pelo senador Aloysio Nunes, de deixar a presidente “sangrando” até 2018, faz todo o sentido. Disse ainda que o país viveria o risco de Temer no comando do governo:

Impeachment não traria qualquer vantagem para o PMDB e faria de Dilma uma vítima. É bem mais interessante para a oposição uma presidente enfraquecida, que teria grande dificuldade para fazer o seu sucessor.

Faz sentido. E mesmo que essa seja uma atitude que seja útil apenas para o PSDB, quem mais quer Temer tomando conta do país?

Esse tipo de demonização do PMDB tem um único problema: ignora que o PT é muito, muito pior! Ninguém precisa virar advogado do PMDB aqui, até porque seria tarefa inglória. O partido é fisiológico, tem muitos corruptos ali dentro, representa em parte o coronelismo nordestino. Todos sabem disso. Mas só interessa aos petistas essa tentativa de pintar o PMDB, parte da base aliada do governo, como o diabo.

O filósofo Marcos Nobre, que tem atacado o conceito de “peemedebismo” como a verdadeira força hegemônica na política brasileira, capturou bem esse clima contra o PMDB que esteve presente nas manifestações de junho de 2013. Mas a quem interessa destruir o PMDB hoje, senão ao próprio PT, que teria o poder todo para si?

Era essa a ideia por trás do mensalão: comprar o Congresso para não precisar negociar com ele. O PT tem um projeto autoritário de poder, e engolir o PMDB é algo que faz a contragosto. O partido tem muito poder, sem dúvida, e prova isso agora em sua rebeldia, dificultando a vida da presidente Dilma. Mas isso serve para o bem e para o mal. Se o PMDB pode dificultar reformas positivas para o país, pode também impedir mudanças terríveis.

É o que tem feito em relação a vários projetos petistas. O controle da imprensa, por exemplo. É inegável que o PMDB, com todos os seus defeitos, tem um histórico de firme defesa da liberdade de imprensa, um dos alvos preferidos do PT. Nada que atente contra a imprensa será aprovado enquanto o PMDB tiver poder. Ficasse o PT livre desse obstáculo, o Brasil já seria como a Argentina ou a Venezuela.

O tema de um editorial do GLOBO de hoje é justamente o avanço bolivariano sobre a liberdade de imprensa, usando como gancho o relatório da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) sobre a Venezuela. “Ao revelar detalhes do cerceamento à liberdade de imprensa nestes países, o relatório da SIP confirma, mais uma vez, que a guerra contra os meios de comunicação profissionais é uma das facetas do regime bolivariano, idealizado por Hugo Chávez, e aliados”, conclui.

Quando pensamos nisso, e lembramos que o PT é o representante do chavismo no Brasil, não o PMDB, como podemos achar ruim a troca de Dilma por Temer? Em outro editorial, o GLOBO reforça a necessidade de preservarmos nossas instituições democráticas, e conclui: “E quanto aos lulopetistas, precisam se convencer da inviabilidade do projeto de se eternizar no poder por vias que não sejam as da democracia representativa. Não há espaço mais no Brasil para surtos de autoritarismo, não importa de que lado venham”.

Alguém acha que o PMDB representa um risco maior a isso do que o PT? Alguém acha que Temer seria pior mesmo do que Dilma? Aliás: alguém consegue imaginar um líder pior do que Dilma? Parece difícil. Mentiras escancaradas, arrogância, pedantismo, ideologia equivocada, falta de articulação política, autoritarismo, incompetência: essas são as marcas da gestão de Dilma. Cientes disso, devemos temer Temer?

Pode-se ser contra o impeachment por vários motivos: receio do impacto disso nas instituições, clima de incerteza, volta do Lula, falta de provas concretas de responsabilidade da presidente, estratégia política para derrotar de vez o PT nas urnas, evitar a vitimização de Dilma ou desejar que o caos econômico e social por ela produzido recaia sobre seu próprio ombro. Mas ser contra o impeachment por achar que Temer – ou qualquer um! – seria um presidente pior do que Dilma, isso não faz o menor sentido.

Rodrigo Constantino

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