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Mark Perkins se considera um garoto-propaganda para a nova geração de remédios contra o câncer, que “armam” o sistema imunológico do paciente para atacar as células doentes. Dois anos depois de usar o Keytruda, droga do laboratório Merck – e quase quatro anos depois de receber um prognóstico de apenas seis meses de vida – ele está livre do câncer.

O caso do avô de 56 anos é mais do que uma história de sucesso de uma nova classe de tratamentos que tem menos efeitos colaterais do que a quimioterapia padrão. Também está na fronteira do que poderia, eventualmente, levar a uma nova abordagem para o tratamento de câncer: pacientes que têm mais mutações em seus tumores do que a média, assim como Perkins, têm mais chance de responder à imunoterapia.

Drogas como o Keytruda, conhecidas como inibidoras de pontos de controle do sistema imunológico, já produziram respostas dramáticas em alguns pacientes com cânceres em estágio avançado, mas os médicos ainda não entendem porque apenas 20% deles ganham mais tempo de sobrevida. Pesquisadores dizem que olhar para as cargas de mutação para buscar respostas faz sentido científico, porque essas drogas atuam tirando os freios das células T, responsáveis pela defesa do organismo, liberando-as para ir atrás das células cancerígenas. Na teoria, quanto mais mutações um câncer tiver, mais estranho vai parecer para as melhoradas células do sistema imunológico.

“É uma peça de um quebra-cabeças. Nós precisamos colocar todas as peças juntas para imaginar como os pacientes vão responder”, diz Padmanee Sharma, professor de oncologia e imunologia médica do aparelho geriturinário da Universidade do Texas e médico no Anderson Cancer Center, em Houston. Ter mais mutações “é como a loteria, se você comprar 300 bilhetes, tem mais chance de vencer do que se tiver apenas um”.

Resposta ao tratamento

O câncer é causado por alterações no DNA que fazem as células crescerem e se multiplicarem sem controle. Enquanto todos os cânceres são causados por mutações genéticas, médicos apenas recentemente começaram a estudar a parcela de pacientes que tem um alto número de mutações. Se mais estudos confirmarem que eles respondem bem à imunoterapia, os médicos poderiam definir novos padrões de tratamentos, diz Alexandra Snyder, oncologista do Memorial Sloan Kettering’s Cancer Center em Nova York.

“Então nós poderíamos dizer: ‘se você estiver na faixa de alto porcentual de mutação, você pode ter o tratamento X, se você estiver no meio, pode usar X ou Y’”, explica.

Até recentemente, os pesquisadores se concentravam nos pacientes que tinham altos níveis de uma proteína chamada PD-L1, que está relacionada ao indicador apontado pelos inibidores dos pontos de controle. Entretanto, os médicos estavam confusos por encontrar alguns pacientes com níveis baixos de PD-L1 que ainda respondiam às drogas. Elementos em níveis de mutação poderiam abrir oportunidades para pacientes que até então não foram considerados para o tratamento de imunoterapia com drogas com o Keytruda ou a combinação Yervoy-Opdivo da farmacêutica Bristol-Myers Squibb.

Isso incluiria pacientes como Perkins, que foi diagnosticado em agosto de 2012 com câncer no duodeno, parte do intestino delgado – um tipo de câncer para o qual o Keytruda não havia sido aprovado. Perkins passou por várias sessões de quimioterapia antes de um novo médico notar que exames genéticos anteriores mostraram que ele tinha instabilidade de microssatélites – conhecida como MSI (da sigla em inglês), um sinal de uma carga de mutação genética extremamente alta em tumores. Ele inscreveu Perkins em uma pesquisa de Luis Diaz, um professor-associado de oncologia no Johns Hopkins Medicine.

Diaz supôs que as mutações poderiam desempenhar um papel para que alguns pacientes respondessem melhor aos inibidores dos pontos de controle do sistema imunológico em 2010. Inicialmente, ele teve dificuldade em encontrar um laboratório farmacêutico para participar do estado, até que a Merck concordou em fornecer Keytruda para uma experiência e a Swim Across America, uma organização para angariação de fundos para o câncer, providenciou o financiamento.

Em dois anos de estudo, que começou em 2013, Diaz descobriu que 60% dos pacientes com MSI respondiam ao tratamento. Isso contrapõe aos 20% ou 30% de resposta em pacientes com câncer de pele ou pulmão – dois tipos da doença para os quais o Keytruda foi aprovado. Diaz estima que cerca de 4% dos pacientes com câncer metastático têm alta carga de mutação e poderiam ser beneficiados ao usar as drogas que inibem os pontos de controle do sistema imunológico, o que equivale a quase 24 mil pessoas nos Estados Unidos.

Apesar de os testes para MSI serem simples de fazer, quando os médicos coletam amostras de tecidos para estudar outros indicadores, isso não é feito regularmente – algo que Diaz espera que se torne rotina, eventualmente.

Perkins começou a usar o Keytruda em julho de 2014 e após três meses do início do uso da droga, não há qualquer evidência do câncer em vários exames do seu aparelho gastrointestinal. E não há sinal até o momento. “Nenhum de nós sabe se teremos um amanhã, mas é evidente que estou em uma boa condição física agora e se eu não tiver outro problema de saúde ou um câncer recorrente, há uma grande probabilidade de eu viver os próximos 20, 30 anos, ou até mais, possivelmente”, diz Perkins.

Fatores ambientais

Alguns estudos sugerem que fatores ambientais podem causar mais mutações que a média em pacientes: pessoas com melanoma que tiveram muita exposição ao sol, por exemplo, ou aqueles que têm câncer de pulmão e são fumantes. É muito cedo para generalizar que aqueles pacientes cujo câncer foi impulsionado por fatores relacionados ao estilo de vida, no entanto, vão se sair melhor no tratamento com as drogas inibidoras. Mas pacientes como Nancy Pinkston, uma aposentada de 67 anos que vive em Dallas, podem ajudar a encontrar uma resposta.

Em janeiro, Nancy descobriu um nódulo embaixo do braço enquanto tomava banho. Ela foi diagnosticada com melanoma, que logo se espalhou para seus gânglios linfáticos. “Tenho certeza de que isso veio do sol”, ela disse. “Quando eu era criança, não sabia nada sobre protetor solar”.

Seu oncologista sugeriu que ela se inscrevesse para participar do teste do Opdivo, droga do laboratório Bristol que só havia sido aprovada para uma forma mais avançada de melanoma, o que não era o caso da sua doença. Depois que os tratamentos foram feitos em maio, Nancy foi para uma cirurgia que já estava agendada. “Não havia câncer, apenas células mortas”, lembra Nancy, sobre o que a cirurgiã lhe contou. “Eu chorei um pouco, ela chorou um pouco e nos abraçamos”.

O teste, que ainda está sendo realizado, vai analisar retrospectivamente os pacientes que têm carga mutacional e outros indicadores biológicos, para ver se há alguma correlação com as respostas.

Enquanto isso, os laboratórios farmacêuticos estão avançando para capitalizar com as descobertas. A Pfizer planeja combinar um inibidor de pontos de controle com duas drogas em desenvolvimento, que estimulam o sistema imunológico. A meta é avaliar se o coquetel com as três drogas funciona em uma variedade de tipos de tumor para pacientes com alta carga de mutação.

A hipótese da Pfizer é que adicionando drogas que estimulam o sistema imunológico, a combinação vai ajudar na sobrevivência das células imunes, que tipicamente “se esgotam após um tempo”, diz Chris Boshoff, líder do programa de imuno-oncologia da companhia.

Os responsáveis pela regulação também estão prestando atenção. Richard Pazdur, diretor do Centro de Excelência em Oncologia do FDA (órgão americano responsável pela regulação de medicamentos e alimentos”, diz que as descobertas sobre carga mutacional são significativas. “Eu olho com o ponto de vista do paciente”, ele diz, lembrando de dados de pacientes com câncer do ducto biliar refratário. “Era um pequeno número de pacientes no total, mas um número muito alto daqueles que tiveram uma resposta, e eu estava pensando que todos que têm essa doença gostariam de ser testados para saber qual o seu nível de mutação MSI”.

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