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A postura brasileira de abster-se de votar a moção de censura movida contra o Irã na Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) é coerente com o posicionamento histórico do Itamaraty e não haveria motivo para mudar de posição agora. A opinião é do historiador Amado Luiz Cervo, professor de relações internacionais da Universidade de Brasília (UnB).

"Desde os anos 1960 o Brasil teve uma postura coerente sobre o assunto: a de que os países em desenvolvimento têm o direito de buscar a energia nuclear com fins pacíficos com o objetivo de galgar um estágio tecnológico mais avançado", explicou o cientista político em entrevista à Agência Estado.

"Trata-se de uma posição histórica e não há motivo para o Brasil abandoná-la agora", prosseguiu. "Essa postura foi inclusive reforçada pelo Lula na visita do Ahmadinejad ao Brasil", disse ele.

No início desta semana, ao receber o chefe de governo iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, defendeu o direito de Teerã de "desenvolver energia nuclear para fins pacíficos e com pleno respeito aos acordos internacionais".

Nesta sexta, em Viena, Brasil, Afeganistão, Egito, Paquistão, África do Sul e Turquia se abstiveram de votar uma resolução por meio da qual o Irã foi censurado por seu programa nuclear. Do grupo de 35 países da atual Junta de Governadores da AIEA, 25 concordaram com a resolução censurando o Irã por seu programa nuclear, segundo diplomatas. Três países votaram contra o texto: Venezuela, Malásia e Cuba.

Por sua vez, o professor José Goldemberg, ex-secretário brasileiro de Ciência e Tecnologia, avaliou que "o Brasil brinca com fogo" ao se abster de votar a censura ao Irã pela Junta de Governadores da AIEA.

"Essa associação com o Irã, ao meu ver, não beneficia o Brasil. A posição brasileira pode ser vista pelos iranianos como um encorajamento" ao desenvolvimento de um programa nuclear bélico, argumentou Goldemberg.

Em entrevista concedida à Agência Estado, Goldemberg qualificou como "no mínimo, tortuoso" o comportamento do Irã com relação a seu programa nuclear. Além disso, as explicações dadas por Teerã à comunidade internacional são consideradas por ele pouco convincentes. "Quando todo mundo achava que o programa baseava-se em Natanz, revelou-se mais tarde o uso de uma instalação subterrânea em Qom. E, enquanto a discussão se prolonga, o Irã pode desenvolver mais centrífugas", o que aumentaria a capacidade de seu programa nuclear, avançou o professor. "Há alguns anos eram 500, 600. Hoje já se fala em pelo menos 3.000 centrífugas de enriquecimento de urânio", observou.

Goldemberg lembrou que o diretor-geral da AIEA, Mohamed ElBaradei, "é considerado uma pomba, é pacífico", e que a aprovação da censura pela entidade pode levar a novas sanções contra o Irã no âmbito do Conselho de Segurança (CS) da Organização das Nações Unidas (ONU).

"A negativa iraniana em aceitar o enriquecimento de seu urânio na Rússia parece ter irritado tanto a AIEA que acabou precipitando essa moção", analisa. "Para que essa moção tenha ido adiante, ele (ElBaradei) deve ter ficado muito irritado com o comportamento do Irã", opinou o professor, que foi secretário de Ciência e Tecnologia no governo Fernando Collor de Mello.

Na quinta-feira, em Viena, ElBaradei declarou-se "desapontado" com o comportamento do Irã, especialmente pela recusa em aceitar o acordo por meio do qual seu urânio seria enriquecido na Rússia.

O enriquecimento de urânio é um processo essencial para a geração de combustível usado no funcionamento das usinas nucleares. Em grande escala, o urânio enriquecido pode ser usado para carregar ogivas atômicas.

Esperava-se que, com o enriquecimento no exterior, os temores referentes ao programa nuclear iraniano fossem aplacados.

Os Estados Unidos e alguns de seus aliados suspeitam que o Irã desenvolva em segredo um programa nuclear bélico. O Irã sustenta que seu programa nuclear é civil e tem finalidades pacíficas, estando de acordo com as normas do Tratado de Não-Proliferação Nuclear, do qual é signatário.

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