Em resposta a uma reclamação do Conselho Federal de Psicologia (CFP), a ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), anulou decisão que permitia psicólogos a atender casos de pacientes que quisessem algum tipo de ajuda para reorientação sexual e a estudar esses casos.
A decisão cassada, proferida em dezembro de 2017 pelo juiz Waldemar Cláudio de Carvalho, da 14ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, suspendia, em parte, os efeitos da Resolução 001/1999 do CFP, que trata das normas para a atuação dos psicólogos em relação à orientação sexual. O juiz determinou que o CFP não interpretasse a resolução “de modo a impedir os psicólogos de promoverem estudos ou atendimento profissional, de forma reservada, pertinente à (re)orientação sexual”. Sem discutir o mérito da decisão de Carvalho, a ministra concluiu que o juiz federal usurpou competência do STF, uma vez que, no seu entendimento, sem um caso concreto, o questionamento à resolução só caberia em Ação Direta de Inconstitucionalidade.
Histórico
Em 1999, o CFP editou resolução que, entre outras determinações, estabelece que “os psicólogos não exercerão qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas, nem adotarão ação coercitiva tendente a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados” e que “os psicólogos não se pronunciarão, nem participarão de pronunciamentos públicos, nos meios de comunicação de massa, de modo a reforçar os preconceitos sociais existentes em relação aos homossexuais como portadores de qualquer desordem psíquica”.
Em 2017, um grupo de psicólogos do Distrito Federal ajuizou ação popular para anular os efeitos da Resolução, sustentando que “não bastasse o CFP violar o direito fundamental da proteção ao desenvolvimento da ciência, que beneficia toda a sociedade, também violou o seu direito de regular a profissão, colocando uma classe de profissionais de joelhos ao desiderato de um Conselho que rompe com postulados do Estado, com nítido prejuízo para a sociedade”.
Os psicólogos ressaltaram que “o cidadão não poderia requerer ao psicólogo orientação ou tratamento sobre o comportamento de sua sexualidade, uma vez que aquele profissional estaria impedido de prestar serviços a tal cidadão, à sociedade, diante da vedação aplicada pela Resolução do CFP” .
Os autores da ação argumentaram que a resolução permitia interpretação de que qualquer atendimento relativo à orientação sexual estava vedado pelo CFP, o que fez com que muitos profissionais se sentissem inseguros para atender pacientes que os procurassem com questionamentos sobre sua sexualidade.
Ao julgar parcialmente procedente a ação, o juiz de Brasília confirmou a validade da Resolução, mas determinou ao CFP que se abstivesse de interpretá-la "de modo a impedir os psicólogos, sempre e somente se forem a tanto solicitados, no exercício da profissão, de promoverem os debates acadêmicos, estudos (pesquisas) e atendimentos psicoterapêuticos que se fizerem necessários à plena investigação científica dos transtornos psicológicos e comportamentais associados à orientação sexual”.
O magistrado deixou claro ainda que a sua intenção não era a de promover a chamada "cura gay", que ele definiu como a "adoção de ações coercitivas tendentes a orientar homossexuais para tratamentos por eles não solicitados", mas somente "coibir a censura prévia" com uma interpretação errônea da Resolução 001/1999.
"Portanto, embora integrantes de uma mesma minoria oprimida, não se pode confundir situações tão díspares: uma coisa é um homossexual realizado com sua orientação sexual (...); outra bem diferente é aquele egodistônico, em conflito ou indisposto com a própria sexualidade, a também merecer o apoio e toda ajuda que o profissional da Psicologia possa lhe oferecer (...). Registre-se que, apesar da homossexualidade não ser uma doença (...), a egodistonia é, sim, um transtorno psíquico devidamente catalogado na Classificação Internacional de Doenças (CID-10), a merecer a devida atenção da Psicologia e demais ciências do comportamento humano, conforme se pode ver na classificação F66 (...)".
O CFP, sem entrar no mérito apontado pelo juiz de Brasília, recorreu ao STF alegando que o mérito da ação era de competência do Supremo uma vez que, na prática, ao pedir a suspensão dos efeitos da resolução, o grupo de profissionais estaria questionando a constitucionalidade da mesma, o que só é cabível em Ação Direta de Inconstitucionalidade perante o STF (e não em uma ação popular, como foi feito). Em abril Cármen Lúcia proferiu liminar suspendendo os efeitos da decisão do DF. Em decisão final, de dezembro, tornada pública nesta quinta-feira (23), ratificou a decisão ao determinar o arquivamento da ação popular.
“Configurada está a usurpação da competência deste Supremo Tribunal. Cuida a ação popular de verdadeira ação direta de inconstitucionalidade ajuizada de forma dissimulada em juízo incompetente. Sequer é caso de se avocar a ação popular para julgamento neste Supremo Tribunal, pois ausente legitimidade dos autores populares para a propositura de ação direta de inconstitucionalidade”, despachou a ministra, determinando a extinção da ação. “Pelo exposto, na esteira da jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal e nos termos da legislação vigente, julgo procedente a reclamação para cassar a decisão reclamada e determinar a baixa e o arquivamento da ação popular, prejudicado o agravo regimental interposto contra a decisão liminar”, concluiu.
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