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Na política, muitas vezes o não dito é mais importante do que aquilo que é declarado publicamente. No atual momento do país, em que se discute o impeachment da presidente Dilma Rousseff, isso tem sido ainda mais verdadeiro. Os bastidores escondem o que realmente está ocorrendo. E aquilo que vem a público costuma ser uma versão cuidadosamente elaborada para tentar produzir algum efeito na população.

O episódio da divulgação da carta do vice-presidente Michel Temer a Dilma é um exemplo disso. Desde a semana passada, ela vem afirmando publicamente que confia em Temer. Esse é o dito. O não dito: ela não confia no vice e, ao dizer o contrário, constrange o vice a não endossar o impeachment – que o levaria à Presidência da República.

O vice, então, envia uma carta a Dilma para reclamar que quem não confia nele é ela; e para assegurar-lhe, a despeito disso, que sempre lhe foi fiel. Destaca ainda que é uma mensagem de caráter “pessoal”. Trata-se, portanto, de algo que não deveria ser divulgado.

Esse foi o dito. Mas, quando o conteúdo é vazado à imprensa, há um não dito mais importante: o vice está rompendo com a presidente e sente-se liberado para negociar o impeachment.

Na política, muitas vezes o não dito é mais importante do que aquilo que é declarado publicamente

Dilma também vem declarando que é preciso agilizar o processo do impeachment, suspendendo o recesso parlamentar, para não prejudicar a economia. É uma verdade: o Congresso não vai discutir nada, incluindo as medidas necessárias para sair da crise econômica, enquanto a discussão da cassação da presidente não estiver concluída.

Mas o dito esconde o interesse real não dito por Dilma: ela avalia que, quanto mais esperar, mais crescem as chances de ser tirada da Presidência – especialmente se houver mobilizações de rua e se surgirem fatos novos da investigação da Operação Lava Jato. Além disso, vale lembrar que o governo, há muito tempo, bem antes da abertura do processo contra Dilma, não consegue mobilizar a própria base para votar o ajuste fiscal. Ou seja, em tese, o impeachment não muda nada.

O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), é outro mestre em dizer uma coisa para passar outro recado. Disse que abriu o processo do impeachment por razões estritamente legais e técnicas. O não dito: ele estava retaliando a presidente porque o PT decidiu votar pela continuidade do processo a que Cunha responde no Conselho de Ética por ter mentido sobre suas contas secretas na Suíça.

Outro não dito por Cunha: pouco após anunciar a abertura do impeachment, ele manda iluminar a cúpula da Câmara de verde e amarelo. Para o país, quer passar a imagem de que está defendendo a nação ao abrir a ação contra Dilma. Mas se trata, na verdade, de uma picuinha, uma alfinetada na ocupante do palácio do outro lado da Praça dos Três Poderes.

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