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Junho de 2013 pegou o país de surpresa, quando milhões saíram às ruas em passeatas históricas. O gigante adormecido, que parecia entorpecido diante dos desmandos na política, acordou feroz. As Jornadas de Junho acabaram quase tão rapidamente quanto surgiram. Mas, três anos depois, o espírito daquele mês surpreendente ainda vive. E, de certa forma, sintetiza o Brasil de hoje. Entender o que tirou as pessoas de casa e o que as fez voltar para o sofá naqueles dias é, de certa forma, um jeito de antever ameaças e oportunidades no horizonte futuro do país.

Para o bem e para o mal, todos os principais elementos que fizeram o junho de 2013 seguem ativos ou latentes: a luta contra a corrupção, a cobrança por serviços públicos melhores, a rejeição à forma tradicional como se faz política, a reação defensiva da classe dirigente, a radicalização e a violência.

A Lava Jato, por exemplo, só foi deflagrada no ano seguinte, 2014. Mas encontrou terreno fértil para dar frutos: o sentimento de que é preciso combater a corrupção. Os investigadores da força-tarefa não se cansam de dizer que as ruas “protegem” a operação. Os políticos entenderam o recado e hoje até elogiam a Lava Jato: dizem que ela é um patrimônio do povo brasileiro e que ninguém vai conseguir controlá-la.

O risco hoje é que o extremismo político capture a agenda nacional

Mas, ainda assim, muitos deles continuam tentando “estancar a sangria” – na já notória expressão do senador Romero Jucá (PMDB-RR). Volta e meia aparecem projetos que, dadas as atuais circunstâncias, cheiram a tentativa de enfraquecer esse tipo de investigação. É a reação defensiva dos políticos. Uma busca desesperada de manter o status quo que está sendo demolido pelos novos tempos.

Em 2013 aconteceu algo muito parecido. As ruas até fizeram com que o Congresso agisse em sintonia com a população. Um exemplo foi a rejeição do projeto que proibia o Ministério Público de fazer investigações criminais – uma proposta que seria aprovada se entrasse em votação em maio daquele ano.

Porém, logo depois, passado o calor dos acontecimentos, os parlamentares aprovaram uma minirreforma eleitoral cujo principal efeito é beneficiar quem já tem mandato. Sob o pretexto de baratear as eleições, reduziram o tempo de campanha e de propaganda eleitoral no rádio e na televisão. A consequência lógica desse encurtamento de prazos, que pode parecer simpático à primeira vista, é que candidatos pouco conhecidos terão mais dificuldade em se apresentar para o eleitorado. Quem está no poder – e que naturalmente apareceu mais durante quatro anos – larga com grande vantagem. No fundo, é uma antirreforma, que mudou a lei para que nada mude de fato.

A insistência dos políticos em caminhar na direção contrária aos ventos da mudança acaba por distanciá-los ainda mais dos eleitores. E isso produz outros efeitos que estavam fortemente presentes nas ruas em junho de 2013: a rejeição à forma tradicional de fazer política e o crescimento do radicalismo como resposta a essa insatisfação.

O discurso dos radicais de ambos os lados do espectro ideológico, à direita e à esquerda, tem sido cada vez mais comum. Há três anos, isso se materializou nas ações dos black blocks. E foi esse radicalismo associado à violência que assustou os demais manifestantes das ruas e que arrefeceu os protestos. À época, os políticos ganharam fôlego extra. Puderam voltar à “normalidade” e fingir que nada estava acontecendo para tentar deixar tudo como sempre foi.

O risco hoje é que o extremismo político, ainda que minoritário, capture a agenda nacional e afaste expressivas parcelas da população das discussões políticas, seja por desinteresse ou por constrangimentos. É o que tem ocorrido em vários cantos do planeta. Isso obviamente só iria contribuir para que a nação não siga na direção desejada pela maioria. Outra ameaça ainda pior é que se materialize outro elemento das Jornadas de Junho: a violência como forma de praticar a política.

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