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A crise financeira mundial praticamente baniu do debate público os defensores do livre mercado. Os gigantes do setor privado, que correram aos governos dos países desenvolvidos para serem salvos da falência, inauguraram um novo paradigma: o neointervencionismo estatal na economia. Os "mercados" passaram a ser vistos como a encarnação do mal.

É no mínimo curioso que o governador Roberto Requião, ferrenho defensor do papel do Estado como agente econômico, tenha lançado mão ontem justamente de uma solução de mercado para resolver um dos problemas da administração pública. Revoltado com o corte de linhas telefônicas da TIM utilizadas pela cúpula estadual, supostamente devido ao não-pagamento da conta, Requião anunciou que vai banir a empresa da prestação de serviços contratados pelo poder público. E prometeu uma licitação para a escolha de outra operadora.

O que o governador fez é o que fazem todos os clientes das companhias telefônicas – ou de qualquer outro tipo de empresa – que não prestam um serviço adequado: procurar os concorrentes. Ainda bem que eles existem, como preconiza a velha teoria do livre mercado.

Há 15 anos, se Requião tivesse tido o mesmo problema, não teria a quem recorrer. Apenas uma empresa operava a telefonia celular no estado: a estatal Telepar Celular – ironicamente comprada, do governo do estado, justamente pela TIM. De certa maneira, é a tão criticada liberalização do mercado que permitirá a Requião ver-se livre da operadora que lhe causou insatisfação.

Já o mesmo não se pode dizer dos serviços públicos de maneira geral. Se eles são ruins, não há concorrentes a recorrer. O cidadão fica na mão. O máximo que pode fazer é tentar mudar o administrador da máquina governamental na eleição seguinte. Mas a prática mostra que geralmente isso não resolve o problema, pois os novos governantes não conseguem fazer o serviço público melhorar de maneira significativa.

Coincidentemente, ontem foi lançada uma iniciativa que pode ser uma luz no fim do túnel para resolver os gargalos do serviço público. O prefeito de Curitiba, Beto Richa, estabeleceu, em contrato, metas para que os secretários municipais cumpram durante o mandato – dentre elas a melhoria de vários serviços. Caso não cumpram, podem ser demitidos. Pode ser que funcione. Pode ser que não. Mas não deixa de chamar a atenção que a aposta da prefeitura para melhorar sua eficiência seja a adoção de um modelo de gestão empresarial.

É a vingança do mercado. Ele, enfim, não é o demônio que pintam – embora também não seja o deus com que vinha sendo apresentado até a crise financeira explodir. Em um momento em que as empresas buscam os governos para sobreviver, os governos adotam soluções de mercado para seus dilemas. Talvez este seja o caminho: um pouco mais de Estado no setor privado; e um pouco mais de setor privado no Estado.

Fernando Martins é jornalista.

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