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Muitos dizem que o Brasil é vítima da maldição de ser o eterno país de um futuro glorioso que teima em não chegar. Talvez seja um reflexo da forma desleixada como tratamos nossa história. Uma nação que esquece o passado inevitavelmente negligencia o conhecimento que dele pode ser extraído. E, por conse­­quência, não pode esperar muito de seu futuro.

O incêndio que atingiu a centenária coleção de cobras e aranhas do Instituto Butantan, em São Paulo, é apenas um exemplo dessa falta de cuidado com a memória e com o conhecimento. O acervo – o maior do gênero no mundo – estava em um prédio sem sistemas modernos de combate ao fogo. O que se perdeu não foi apenas uma expressiva parcela do passado científico brasileiro. Foram informações que nunca mais poderão ser usadas pela ciência.

Caso semelhante quase ocorreu no Museu Goeldi, de Belém do Pará. O renomado centro de pesquisas sobre espécies amazônicas foi atingido há dois meses por um princípio de incêndio devido às suas precárias instalações elétricas. Coleções de insetos foram salvas por pouco.

Reportagem de ontem do jornal O Estado de S.Paulo mostrou que nenhum grande museu zoológico brasileiro conta com aparato adequado para combater incêndios – o que revela que o descaso é recorrente.

Dentre as instituições desprotegidas, a reportagem do Estadão cita o Museu Nacional do Rio de Janeiro, localizado na Quinta da Boa Vista, no antigo palácio que abrigou a residência da família imperial brasileira.

Recentemente estive no Museu Nacional. Não sou especialista em sistemas antifogo, mas pude perceber que o palácio precisa de manutenção. Suas laterais, por exemplo, pedem urgentemente uma pintura. Além disso, há ornamentos arquitetônicos destruídos. É de se imaginar como estão suas instalações hidráulicas e elétricas se até mesmo a aparência externa não vem sendo bem cuidada.

Um incêndio ali talvez fosse ainda mais arrasador para nossa memória, pois o Museu Nacional conta com um acervo vastíssimo – que vai da história natural (com fósseis de dinossauros, por exemplo) à história da humanidade (lá está uma rica coleção egípcia, com três múmias; e objetos de Pompeia, enterrada pelo Vesúvio).

Os sistemas de segurança dos museus brasileiros também deixam muito a desejar. Em 2007, o Masp de São Paulo foi roubado. Perdeu obras de Picasso e Portinari – recuperadas posteriormente pela polícia. Um ano antes, o Museu Chácara do Céu, no Rio, já havia sido invadido. Os ladrões levaram telas de Monet, Matisse, Dalí e Picasso.

Tudo isso mostra que o conhecimento e a memória nacional não estão em primeiro plano em nossas preocupações. É um grande risco. Ao não aprendermos com o passado, estamos ameaçados de repetir erros ou de sermos eternamente condenados a ter de recomeçar tudo do zero. É como se nós, brasileiros, estivéssemos tornando real o mito de Sísifo, lendário personagem grego punido pelos deuses a carregar uma pesada pedra ao cume de uma montanha, que sempre rolava abaixo quando ele estava chegando ao topo.

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