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 | Ilustração: Felipe Lima
| Foto: Ilustração: Felipe Lima

"Já escolheu uma profissão?" – perguntam ao menino ao meu lado. O olhar se torna vago e ele gagueja algo. Seja lá o que for que sonha ser, aposto que ele acredita que será um sucesso, que será especial.

Os jovens têm todas as possibilidades do mundo. Um garoto de 15 anos pode sonhar em ser médico, escritor, chefe de cozinha, jogador de futebol, músico, advogado, ambientalista, presidente da República, terrorista – qualquer coisa. O que torna a juventude tão valorizada é isso: as possibilidades, o tempo disponível para viver, a distância da morte.

Fui rápido demais ao ponto final. Na essência tudo se resume ao nosso medo da morte. Quanto mais longe acreditamos que estamos dela, mais fortes nos achamos. Mas voltemos ao raciocínio que eu deixei para trás.

O jovem é dono de todas as possibilidades porque tem tempo e está livre das amarras que as experiências vão grudando em nós. A experiência em si é uma amarra. Faz refletir e evitar certas situações. Os bens que acumulamos são amarras. As contas a pagar são amarras. Os filhos são amarras. Os sucessos são amarras. As derrotas são amarras. A responsabilidade é amarra. A profissão na qual você consumiu anos da vida se torna uma amarra. Largá-la para começar outra nova e deixar todo o tempo investido para trás? É preciso uma coragem que poucos têm.

O jovem investiu pouco. Daí a possibilidade de sonhar. Crescer é limitar-se, é amarrar-se. Até o ponto em que as perdas acumuladas mostrem que dá para ser livre de novo. Pessoas maduras dizem isso. Depois de certa idade, quando as expectativas diminuem, se sentem mais livres.

Na adolescência e na juventude cabem todas as expectativas imagináveis. Na maturidade cabem as expectativas essenciais. É assim mesmo? Faz sentido para mim.

Longe dos extremos, a vida é uma confusão. Na chamada "fase produtiva" da vida as pessoas estão sempre ocupadas. Têm de correr para conseguir um lugar ao sol, para criar os filhos, para mostrar a que vieram, para provar seus talentos, para conquistar amores, para se recuperar da perda de amores, para juntar dinheiro para a aposentadoria. É uma lista infindável de tarefas que mantém os produtivos ocupados. Quando nos damos conta, vemos que o tempo está passando e que não dá mais para se iludir pensando que podemos tudo. A velha arrogância/inocência não faz mais sentido.

Diariamente uma pessoa aparece no nosso espelho para reafirmar isso. Um dia ela surge mais bem disposta, no outro parece esgotada como um centenário. Todo dia ela grita: "Reinventa-me ou te devoro. Dispa-se das ilusões, mas deixe os sonhos".

Deixe os sonhos, deixe a fome, a sede, a vontade de respirar. A morte pode parecer mais real e mais próxima, mas o coração ainda bate.

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