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Resmungando a respeito das peripécias da história no ano de 2016 enquanto beberico uma xícara de chá de jasmim com um velho amigo chinês, escuto dele, naquele sotaque bacanérrimo dos nativos do Império do Meio, que a culpa é do macaco astrológico. “Ano do Macaco é assim mesmo. Muita agitação!”, decreta ao se levantar para buscar a chaleira para mais uma rodada. “Macaco vermelho é fogo!”, complementa do outro lado da sala.

Macaco vermelho porque, como descubro mais tarde diante da Wikipedia, o ano também guarda relação com o fogo, um dos cinco elementos básicos da configuração chinesa de mundo (metal, água, madeira e terra). Macaco vermelho, em síntese, é fogo – elemento visto com fascinação por causar enormes estragos, mesmo sendo desprovido de qualquer materialidade interna, ao menos para os padrões pré-científicos.

“Macaco vermelho é fogo!”, complementou meu amigo, do outro lado da sala

Dias mais tarde, volto ao amigo chinês para mais algumas xícaras de chá, agora acompanhadas por pãezinhos baozi cozidos no vapor, e indago o porquê de o Ano do Macaco de fogo ser considerado ruim. “Não é ruim, de jeito nenhum!”, escuto. “É apenas agitado, muito agitado!”, balança as mãos. Entendo: o que considerei “ruim” – todas as coisas complicadas que testemunhamos ao longo do ano, do Brexit ao desemprego, da eleição de Trump à ciranda crônica dos canalhas em Brasília –, na perspectiva chinesa é apenas parte de uma dinâmica tremendamente criativa, com coisas ruins e coisas interessantes também. Tudo junto e tudo justo, enfim. O próprio macaco-prego, jovem e impetuoso, entrando nas casas da aldeia para explorar, encontrar comida e, vez por outra, sair com o rabo chamuscado. “Faz sentido”, pensei, considerando os 5 mil anos ininterruptos de civilização chinesa e os muitos macacos de fogo e demais bichos astrológicos (12, ao todo) com que eles lidaram durante todo este tempo.

Depois de ter devorar uma dúzia de pãezinhos baozi e ser avisado de que em breve viria mais uma rodada, resolvi perguntar sobre o ano de 2017. “Ano do Galo. De fogo!”, tive como resposta. “Ano agitado, muito agitado!”, ouvi em seguida, já com uma leve desconfiança a respeito dos conhecimentos astrológicos de meu interlocutor, que vinha da cozinha com uma baciada de bolinhos e uma cumbuca de molho apimentado. “Pois todo ano não é assim?”, cobriu minha aposta. E, olhando para a cumbuca, matou a questão: “agora, vamos comer!” E eu, é claro, me dei por satisfeito.

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