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Confira a entrevista com a ministra Damares Alves
A ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves.| Foto: Reprodução / Gazeta do Povo

O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), chefiado por Damares Alves, tem como um de seus objetivos até 2022 reverter uma tendência de anos de políticas para direitos humanos com viés ideológico esquerdista no governo federal. A missão, no entanto, tem forte oposição dentro da própria pasta. Por herança de gestões anteriores, o MMFDH abriga dentro de sua estrutura conselhos e comissões com forte carga ideológica contrária ao governo.

Em dezembro, por exemplo, membros do MMFDH entraram em conflito com o Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente) por causa de uma polêmica resolução que autorizou visitas íntimas a menores infratores em unidades socioeducativas e permitiu que casais formados entre adolescentes nessas unidades possam permanecer “no mesmo alojamento, sendo levado em conta o direito ao exercício da sexualidade, da afetividade e da convivência”.

Em outra briga com o Conanda, que envolve até o ministro do STF, Roberto Barroso, o MMFDH diz que os membros da sociedade civil desse conselho inviabilizaram o funcionamento do órgão ao terem emitido, no fim do ano passado, uma resolução que contraria alguns pontos do polêmico decreto do governo federal de 2019 sobre o Conanda. Segundo o MMFDH, essa resolução impossibilitou a publicação do edital de convocação de organizações da sociedade civil para a composição do conselho, que já deveria ter sido feita. Por conta disso, o advogado-geral da União, José Levi Mello, entrou há poucos dias com um embargo de declaração contra o Conanda, em ação no STF na qual Barroso é relator.

O Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) também tem entrado em choque direto com Damares. Em 2019, a ministra foi denunciada por alguns de seus membros na Organização das Nações Unidas (ONU), acusada de tentar intervir na autonomia do órgão.

Em outubro de 2020, os representantes da sociedade civil do CNDH criticaram Damares por nomear unilateralmente a nova coordenadora geral do órgão, Silvia Mekler, alegando que essa prerrogativa era deles. Membros do MMFDH explicam que, embora a chefe da Secretaria Executiva faça parte do CNDH, ela tem um cargo de Direção e Assessoramento Superior (DAS), e a nomeação de funcionários para esse tipo de cargo costuma ser feita por ministros.

Também há conflito com as visões do atual governo em outros conselhos, como o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), o Conselho Nacional de Combate à Discriminação (CNDC) e o Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial (CNPIR). Todos esses órgãos têm forte presença de membros ou simpatizantes de grupos de extrema esquerda como o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), a CUT (Central Única dos Trabalhadores) e o MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto).

Regras para escolher novos membros transformam eleições dos conselhos em ‘marmeladas’

O MMFDH abriga, hoje, 17 órgãos colegiados. Dentro do ministério, há a impressão de que, além de serem uma pedra no sapato do governo, emitindo resoluções que batem de frente com as políticas que a pasta desejaria implementar, alguns desses órgãos também são questionáveis do ponto de vista do interesse público. O principal objetivo da existência desses órgãos seria perpetuar uma visão de mundo dentro da pasta de direitos humanos, ainda que, eventualmente, eles emitam algumas resoluções úteis para a sociedade.

“No governo do PT, os conselhos serviam para legitimar decisões que seriam questionáveis por parte do governo. Em um governo contra o PT, esses conselhos servem para atrapalhar o governo”, diz um membro da pasta de Damares, que preferiu não ser identificado na reportagem.

A forma como as regras para as eleições de novos membros de alguns desses órgãos colegiados foram elaboradas facilita que os movimentos com viés ideológico esquerdista acabem se perpetuando na hegemonia desses órgãos. Pela própria forma como foram constituídos, é quase impossível equilibrar a balança ideológica desses órgãos colegiados.

As eleições de alguns dos conselhos são um jogo de cartas marcadas, em que há pouco espaço para a pluralidade nas visões de mundo. Na última eleição do CNDH, por exemplo, algumas instituições pró-vida se inscreveram por meio do edital e tentaram obter uma vaga dentro do conselho, mas nenhuma delas foi admitida. As instituições de direitos humanos habilitadas para votar têm, em sua grande maioria, viés ideológico esquerdista, o que dificulta que se estabeleça um equilíbrio.

Em uma entrevista dada em dezembro de 2020 ao site da CUT, Mônica Alkmim, membro titular do CNDH, onde representa o Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), deixou claro como funciona o jogo de cartas marcadas. “Nós tivemos um número recorde de inscrições, com um grupo pequeno, por assim dizer, muito ligado às forças conservadoras que são representadas pela atual gestão nacional do país. Mas a união das instituições, das organizações da sociedade civil que realmente defendem direito humanos, uma sociedade com princípios de direitos humanos, a união desses organismos numa luta contra o avanço desse conservadorismo, fez com que fôssemos vitoriosos”, disse ela.

CNDH têm fortes vínculos com CUT, PT e MST

A balança pende mais para a esquerda em vários conselhos abrigados pelo MMFDH. Mas, em um deles, o CNDH, o desequilíbrio é especialmente claro. Não só Mônica Alkmim como praticamente todos os membros que representam a sociedade civil no CNDH têm vínculos com partidos e movimentos de esquerda.

Uma representante da Central de Cooperativas e Empreendimentos Solidários do Brasil - UNISOL, por exemplo, já foi candidata do PT a vereadora de São Paulo. Na capa de seu Facebook, há uma foto de uma manifestação pró-aborto na Argentina em 2020. Já uma representante da Central Única dos Trabalhadores (CUT) define-se nas redes sociais como “feminista e petista”. Eneida Canêdo, representante da União Brasileira de Mulheres, é dirigente estadual do PCdoB (Partido Comunista do Brasil) no Pará.

A promotora de Justiça Márcia Regina Ribeiro Teixeira, que representa o Conselho Nacional dos Procuradores Gerais dos Estados e da União, já fez críticas fortes a algumas ideias do governo, estabelecendo uma relação direta entre a defesa dessas ideias e o aumento da violência contra mulheres. Em um texto publicado no Jornal Correio, ela diz que o aumento da violência contra mulheres no Brasil ocorreu em razão de “discursos oficiais estatais cultuadores das figuras do ‘homem de bem’ e da ‘família tradicional’, contrários frontalmente ao que se estigmatizou como ‘ideologia de gênero’, antagonistas às cotas, favoráveis ao direito amplo à posse e ao porte de armas”. Segundo o texto, “tudo isso contribui diretamente para o crescimento exponencial da violência de gênero, inclusive sexual”.

Leandro Scalabrin, que representa a Associação Nacional dos Atingidos por Barragens (ANAB), tem como imagem de cabeçalho em sua conta de Twitter uma obra artística com referências comunistas – o quadro “O Levante”, do pintor mexicano Diego Rivera –, e costuma curtir postagens do ativista João Pedro Stédile, fundador do MST. Scalabrin foi um dos membros do CNDH que, em 2019, fez uma visita ao presidente Lula em nome do órgão.

A visita a Lula, aliás, deixa evidente um dos papéis que os órgãos colegiados tentam exercer no atual governo: ajudar a reforçar, de dentro do próprio governo, a narrativa de que os direitos humanos estão sendo gravemente violados pelo Executivo. “Eles acabam usando a máquina do governo, recebendo diárias do governo e servindo para desmoralizar o governo e alimentar uma campanha contra ele”, diz um membro do MMFDH.

Correção

Este artigo afirmava erroneamente que as instituições que votam na eleição para o CNDH são somente aquelas que já o compõem. No entanto, instituições habilitadas pelo CNDH também têm direito a voto. O texto já foi corrigido.

Corrigido em 09/02/2021 às 11:10
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