• Carregando...

"Jair 17", "Alessandra 21". As plaquinhas na quina dos canteiros não deixam dúvidas – essas hortas têm dono. Se o mato cobrir o nome do agricultor, é hora de rever o acordo e repassar os canteiros – de em média 150 metros quadrados. É justo, afinal tem fila de espera. Foi assim – pela resistência de alguém em se render aos rigores da enxada – que o casal Orlando, 48 anos, e Antônia Barreto, 50 anos, conseguiu em 2008 um canteiro para chamar de seu na horta comunitária do Condomínios Rio Bonito, Campo de Santana, instalada numa área de 6 mil metros quadrados embaixo das torres da Eletrosul.

Como Barreto trabalha de segurança, no final da manhã pode matar a saudade de Ortigueira, a cidade natal, dando uns passos rua acima. Exato. O que o levou a aderir à agricultura urbana foi a falta danada que sente do lugar onde cresceu. "Quero plantar milho e feijão", avisa, diante da área em que o nome de Antônia está escrito com letras graúdas. Homenagem ou repasse da lida?

Quem responde, alguns metros adiante, é outro casal, Vílson e Aparecida, vindos de Ivaiporã em 1995. A horta é quase parte do acordo nupcial. "Se não tiver coragem não se dá conta disso não. Sem um pouco de paixão, a gente desiste", avisa o homem que colheu 130 quilos de feijão ano passado e quer repetir a proeza. Com Aparecida na retaguarda.

Paixão e saudade são palavras comuns aos caubóis do asfalto. Embora não haja uma estatística segura, estima-se que a maioria dos que adere às hortas tem ou teve alguma ligação muito forte com o campo. A falta que sentem não é só da terra, mas das relações humanas, dos sistemas de troca e da vida regida pelos ciclos da natureza. Quando descobrem que podem reabilitar essas práticas, fazem o que Barreto e Vílson fizeram: pedem o uso de uma área e criam coragem para a trabalheira que dá.

Em muitos casos, os voluntários têm de improvisar. Numa descida do Jardim Dom Bosco, Tatuquara, o pedreiro Wilson Brito, 52 anos, mais duas Marias e uma Marli, dividiram em quatro uma área em que havia um terreno baldio. A pequena horta é cuidada pelo petit comitê, de comum acordo, com a ajuda dos técnicos do município. Tem poço e geração de renda: média de R$ 5 por dia na parte de Brito. Ficou tão bom que ele abriu o portãozinho para a roça e avisa que não quer outra vida.

Perto dali, no Vitória Régia – onde moram cinco mil pessoas – o veterano João Maria Tibério, 79 anos, exibe a lavoura de milho. O morador deixou a região de Pitanga, Região Central do Paraná, em 1979, para ser operário. "Com medo de não me acostumar, fiz horta até na beira da rua", conta o aposentado, que dedica cinco horas por dia à horta comunitária. "Vou passar dos 90 nessa vida." (JCF)

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]