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Ivanor Dacheri: “Se eu disser que não tem corte ilegal vou estar mentindo”. |
Ivanor Dacheri: “Se eu disser que não tem corte ilegal vou estar mentindo”.| Foto:

Paraná vai financiar reflorestamento

O governo estadual pretende destinar R$ 50 milhões ao ano para empréstimos a pequenos produtores que queiram plantar florestas. A intenção é incentivar que novas áreas sejam destinadas para o reflorestamento – para atender a demanda do setor madeireiro e reduzir a pressão sobre a mata nativa. O secretário especial para Projetos de Reflorestamento, Nivaldo Krüger, conta que a prioridade do investimento é voltada para cidades com baixo índice de desenvolvimento humano. O governo irá financiar até 10 hectares por propriedade, produzindo 25 mil hectares por ano de florestas. O financiamento poderá ser pago em até oito anos e com o próprio produto.

Será incentivado o plantio de quatro espécies: pínus, eucalipto, bracatinga e araucária. Krüger afirma que o dinheiro aplicado retornará em breve para os cofres públicos, não só com o pagamento do empréstimo, mas também com o recolhimento de impostos. Além disso, o estímulo ao reflorestamento geraria 62 mil empregos. "Com o primeiro raleio do pínus já será possível quitar o financiamento", assegura o secretário. Para ele, a proposta visa, em última instância, a mudança de uma cultura arraigada. "De extrativismo para cultivo", define.

  • Proprietário de uma madeireira, o prefeito de General Carneiro, Ivanor Dacheri, já foi multado pelo Ibama em R$ 560 mil.

Os órgãos ambientais alegam que as ações de desmatamento na região Centro-Sul encontram suporte numa rede política, que apoia ou está envolvida em irregularidades. Durante a reunião semanal do secretariado, na terça-feira, o secretário estadual de Meio Ambiente, Rasca Rodrigues, disse que os prefeitos de General Carneiro e Bituruna e o vice de Coronel Domingos Soares dão cobertura à devastação da mata nativa. Juntos, os três já foram autuados em quase R$ 1 milhão por danos ambientais. O superintendente estadual do Instituto Nacional de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), José Álvaro Carneiro, afirma que tem sido bastante difícil furar o bloqueio formado por quem tem interesse político e econômico na exploração das florestas remanescentes de araucária.

Carneiro conta que, cada vez que autua alguém influente, recebe uma dezena de telefonemas. Alguns políticos apenas pedem informações e outros perguntam, de forma velada, se não é possível "aliviar o lado" do infrator. O superintendente explica ainda que as reclamações têm poder de intimidação. "Interferências políticas inibem funcionários públicos, que se questionam se vale a pena enfrentar pessoas com poder", relata. O medo de ser transferido para outro lugar, por exemplo, seria um dos mais presentes no imaginário dos fiscais. Além disso, pessoas mal-intencionadas, mas bem relacionadas, teriam canais para disseminar a imagem de que as ações fiscalizatórias levam o "pobre a perder o emprego". "Mas é gente que ganha dinheiro com isso e faz crer que os moradores da região também podem tirar proveito se não derem atenção para as ‘bobagens’ de preservação ambiental", explica.

O delegado-chefe de repressão aos crimes ambientais da Polícia Federal, Rubens Lopes da Silva, confirma que há uma teia de poder envolvida em situações de desmatamento. Os casos estão sendo investigados e o delegado espera reunir provas das relações do tipo "eu te ajudo aqui e você me beneficia ali". Coordenador de mobilização da SOS Fundação Mata Atlântica, Mario Mantovani, acredita que já passou da hora de pessoas reincidentes no crime de desflorestamento serem fiscalizados com mais intensidade. "Até que enfim a mão da lei vai chegar a eles", comemora.

Operações conjuntas do Ibama e da Polícia Federal localizaram 65 pontos de desmatamento, que resultaram em R$ 6 milhões em multas e 1,3 mil metros cúbicos de madeira apreendida no Centro-Sul do Paraná. Nos últimos seis meses, sobrevoos de helicóptero e incursões por terra apontam que o desmate equivale a 30 caminhões carregados de árvores nativas por dia. As investigações estão sendo ampliadas, para incluir, além dos danos ambientais, crimes como sonegação fiscal, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.

Outro lado

O argumento dos três políticos citados pelo secretário de Meio Ambiente é de que as cidades dependem economicamente do setor madeireiro. "Se eu disser que não tem corte ilegal vou estar mentindo", diz o prefeito de General Carneiro, Ivanor Dacheri (PSB), que recentemente foi à Brasília reclamar, de gabinete em gabinete, que o município está sendo excessivamente fiscalizado. O vice-prefeito de Coronel Domingos Soares, Volnei Barbieri (PSDB), também reconhece que o desmate é rotineiro. "A gente não esconde, e não adianta esconder, que o povo vive da extração", afirma.

Já o prefeito de Bituruna, Remi Ranssolin (PTB), recusa-se a aceitar que as ações são predatórias. "Temos muito mais verde do que há 10 anos e hoje está tudo reflorestado, temos pínus para todo o lado", declara, desconsiderando a diferença entre a mata nativa e a plantada. As três cidades estão na lista das dez que mais derrubaram a floresta atlântica no Brasil nos últimos anos.

Madeireiro, Dacheri já foi autuado pelo Ibama, com multas que chegariam a R$ 560 mil. Ele alega que tinha a autorização do corte, mas que não houve entendimento quanto à quantidade de madeira. No feriado do carnaval, uma fiscalização via helicóptero encontrou uma área de desmate e conseguiu local de pouso para averiguar o que estava acontecendo. Encontraram um caminhão, com o documento em nome do prefeito. Dacheri nega que estivesse cortando madeira nativa. Declara que apenas foi contratado pelo proprietário da área para serrar as toras que estavam sendo retiradas. O caso está sendo investigado pela Polícia Federal.

Ranssolin tem uma indústria de portas e afirma que não tem multas por desmatamento ou uso de madeiras ilegais. "Os fiscais ficaram 15 dias dentro da minha fábrica, em dezembro, e não acharam nenhum problema", diz. Mas foi autuado por irregularidades com o lixo industrial, no valor de R$ 100 mil.

O vice-prefeito de Coronel Domingos Soares confessa que foi atuado várias vezes – a última em dezembro – e que os valores somam R$ 280 mil. Barbieri, que tem uma serraria, "nunca foi fiscalizado tanto como nos últimos tempos". Ele alega que o Instituto Ambiental do Paraná (IAP) não tem estrutura para fazer as vistorias para autorização de corte. Falou que o carro do órgão não tinha combustível, recentemente, e que um engenheiro florestal foi buscar o fiscal. O presidente do IAP, Victor Hugo Burko, foi procurado pela reportagem, mas não foi localizado para comentar sobre problemas na estrutura do órgão.

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