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Iluminação com LED instalada em janeiro de 2016 no Jardim Monte Azul, bairro no extremo sul da cidade de São Paulo. | Leon Rodrigues/Secom São Paulo/Fotos Públicas
Iluminação com LED instalada em janeiro de 2016 no Jardim Monte Azul, bairro no extremo sul da cidade de São Paulo.| Foto: Leon Rodrigues/Secom São Paulo/Fotos Públicas

A Associação Médica Norte-Americana (AMA) divulgou um alerta no último mês de junho sobre a relação entre o uso do LED  (sigla em inglês para “diodo emissor de luz”) de alta intensidade (com mais de 3.000 kelvin) na iluminação pública e a saúde da população urbana. Nos Estados Unidos, esses equipamentos já estão presentes em várias cidades e correspondem, segundo dados do ano passado do Departamento de Energia, a 13% de toda a iluminação pública do país. No Brasil, capitais como Curitiba, São Paulo e Rio de Janeiro, já substituíram boa parte de suas antigas lâmpadas amarelas, de vapor de sódio, por LEDs. Segundo a AMA, os riscos da presença do LED na iluminação pública das cidades têm a ver com o brilho azul que esse tipo de equipamento emite e que pode colaborar para o aumento de distúrbios do sono e outros problemas de saúde, incluindo câncer e doenças cardiovasculares. A AMA também chamou a atenção para o fato de que esses LEDs podem atrapalhar a visão dos motoristas durante a noite.

Preocupações similares já tinham sido levantadas nos últimos anos, mas o relatório da AMA reforça tais preocupações e tende a incentivar as cidades a reavaliar a intensidade dos LEDs que estão instalando. Em média, os LEDs são 50% mais eficientes em termos energéticos que as lâmpadas de vapor de sódio. Além disso, eles duram de 15 a 20 anos, ao invés de 2 a 5 anos como as velhas lâmpadas, e acabam iluminando os ambientes de forma mais homogênea.

Algumas cidades dizem que os argumentos relacionados à saúde da população não são convincentes o bastante para superar os benefícios que a primeira geração de LEDs, instalada nas cidades norte-americanas nos últimos três a oito anos, trouxe. Nova York é uma dessas cidades, mas já se viu obrigada a responder reclamações de moradores substituindo os LEDs de alta intensidade por outros de brilho mais brando.

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Outros exemplos

Scott Thomsen, porta-voz da Seattle City Lights, empresa responsável por gerenciar a iluminação da maior e mais populosa cidade do estado de Washington, minimizou as preocupações da AMA, ao dizer que os LEDs utilizados nas ruas não emitem mais brilho azul do que a maioria dos computadores e televisões que as pessoas têm em casa.

Ele atribui as reclamações que a cidade recebeu após ter trocado 41 mil luminárias desde 2010 à estranheza dos moradores diante do brilho do LED em comparação às antigas lâmpadas de vapor de sódio. “A luz dos novos equipamentos é comparável à luz da lua e oferece uma acuidade visual excelente para motoristas”, defendeu Thomsen.

Pete Strasser, diretor técnico da International Dark-Sky Association, entidade que tenta chamar a atenção das pessoas sobre a poluição luminosa, rebate: segundo ele, a luz da lua contém bem menos brilho azul do que os LEDs de alta intensidade.

Lake Worth, na Flórida, após um ano e meio de discussões e amostragens, decidiu substituir suas lâmpadas de vapor de sódio por LEDs de luminosidade 4.150 K e de brilho âmbar (que não emite o brilho azul). “Nós descobrimos que essa cor faz sentido para a saúde da nossa cidade, e nós estamos orgulhosos da escolha que fizemos”, diz Michael Bornstein, membro da administração do município.

Caminho parecido trilhou Gloucester, em Massachusetts. Um pouco mais de um ano atrás, a cidade estava planejando a troca de sua iluminação de rua por novos LEDs de 4.000 K. Mas, no mesmo período, o responsável pelo planejamento urbano da cidade, Matt Coogan, começou a ler mais a respeito dos riscos à saúde e ao meio ambiente relacionados a esse tipo de iluminação. Ele também testou amostras de 4.000 K e 3.000 K com a população. Resultado: no próximo mês a cidade deve terminar de revitalizar toda as suas luminárias públicas com LEDs de 3.000 K. Coogan sabe que as discussões sobre o tema ainda estão longe de terminar, mas ele não queria ficar do lado errado da história. “Eu não gostaria de descobrir 10 ou 15 anos depois que nós fomos responsáveis por expor a população a um risco de saúde.”

Mark Hartman, chefe do escritório de sustentabilidade de Phoenix, no Arizona, diz que a cidade deve acabar colocando LEDs de diferentes intensidades: mais fortes nas principais vias e parques, e menos nas áreas residenciais. Ele disse que a cidade vai considerar, sim, os alertas quanto à saúde, ainda que, assim como o porta-voz de Seattle, ele tenha citado o brilho emitido por computadores e televisões. “Ninguém diz ‘não veja televisão ou não use o computador depois das nove da noite’ em razão das ondas azuis desses aparelhos”, argumentou.

Efeitos

Os críticos lembram que assim que os equipamentos de LED para iluminação de rua apareceram no mercado, já nos anos 2000, o governo dos EUA encorajou estados e municipalidades a usá-los. “O Departamento de Energia e a Agência de Proteção Ambiental colocaram muitas fichas neles. Eu chamo isso de precipitação ”, conta o diretor do Centro de Tecnologias em Iluminação da Universidade da Califórnia, Michael Siminovitch. Ele afirma que a primeira geração de LEDs realmente afetava negativamente o bem-estar das pessoas.

A intensidade de uma lâmpada é medida pela temperatura da cor que emite, expressa em kelvin (K). “Os primeiros LEDs de iluminação de rua tinham temperatura de pelo menos 4.000 K, que produz um brilho branco e muito intenso, com um alto conteúdo, ainda que pouco percebido, de brilho azul”, descreve Siminovitch.

Atualmente, no entanto, os LEDs disponíveis possuem níveis menores de temperatura e quase a mesma eficiência energética daqueles da primeira geração. Eles não emitem brilho azul potencialmente perigoso, além de produzir um tom mais agradável, âmbar.

Quando os LEDs de 4.000 K e 5.000 K foram instalados eles provocaram diferentes reações nos EUA. Agentes de trânsito, policiais e muitos motoristas gostaram deles porque esses LEDs produzem um brilho uniforme, que ilumina tudo que está abaixo. Por outro lado, em muitos lugares, como Nova York e Seattle, moradores reclamaram que o brilho intenso desses LEDs era perturbador. As pessoas os descreveram como “invasivos”, “frios” e “inconvenientes”.

Entenda

A influência da luz do dia no nosso organismo é algo que caminha com descobertas bastante recentes, confirmadas em pesquisas nos anos 1990. Foi quando se identificou um receptor ligado à retina, chamado melanopsina, que tem como função identificar a luz do dia e informar/acionar o corpo sobre suas funcionalidades, a produção de hormônios ( entre eles a melatonina) e seu relógio biológico.

Todo esse mecanismo levou o nome de ciclo circadiano e é alvo de boa parte das pesquisas neurológicas e ligadas aos distúrbios do sono e outras doenças realizadas atualmente.

Ainda antes do relatório da AMA, pesquisadores já vinham alertando sobre os efeitos do LED. Alguns verificaram que a exposição ao brilho azul do LED pode diminuir a produção de melatonina. Produzida à noite, a melatonina ajuda a equilibrar a fabricação de outros hormônios, reprodutivos, da tireoide e também aqueles das glândulas supra renais, e ajuda a regular o ciclo circadiano do corpo. “Como uma espécie, nós não fomos feitos para ver luz depois do anoitecer”, resume Siminovitch.

Em seu alerta, a AMA cita a questão da melatonina, mas também ressalta a ligação entre o brilho excessivo dos LEDs e efeitos como a redução no tempo do sono, a baixa qualidade do sono e até mesmo prejuízos nas funcionalidades diurnas do corpo. Em seu relatório, a AMA também ressalta evidências que ligam a exposição a luzes de alta intensidade em geral ao aparecimento de câncer, diabetes, doenças cardiovasculares e obesidade. Além disso, sugere que os LEDs também podem estar associados à cegueira noturna, caracterizada pela dificuldade de enxergar em ambientes com pouca luminosidade. Por fim, a AMA avisa sobre os possíveis efeitos do LED na fauna, em nos animais notívagos, aves e insetos. “Essas luzes não são ruins só para nós, elas são ruins para o meio ambiente”, disse Mario Motta, um dos autores do relatório da entidade.

Em Curitiba

Em março do ano passado, a capital paranaense lançou um plano de iluminação pública que incluía, entre outras ações, a substituição de cerca de 37 mil lâmpadas de vapor de sódio e a implantação de mais 5.870 pontos de iluminação. Desses mais de 42 mil pontos, apenas 8.870 (o equivalente a 20% do total) são de tecnologia LED. As outras 37 mil novas lâmpadas são de vapor metálico HID (sigla em inglês para alta intensidade de descarga) . Foram usadas na renovação da iluminação da Avenida Visconde de Guarapuava e das vias estruturais do bairro Pinheirinho. Segundo a prefeitura de Curitiba, as luminárias com lâmpadas HID são cerca de quatro a cinco vezes mais baratas que as luminárias de LED e apresentam viabilidade técnica e econômica para sua utilização em iluminação pública.

O orçamento previsto para o plano era de R$ 91,6 milhões, sendo R$ 15 milhões destinados à troca de lâmpadas. A previsão é de que tudo seja feito até o fim de 2016.

Cautela, não proibição

Não é que a entidade condene totalmente os LEDs, mas a AMA pede que as cidades minimizem o uso daqueles de alta intensidade, com mais de 3.000 K.

Tony Dorsey, porta-voz da Associação Americana dos Agentes Rodoviários e de Transporte, disse que o comitê ambiental da entidade está estudando o relatório da AMA, mas que, por ora, os membros não se mostraram preocupados em usar LEDs de 4.000 K nas estradas.

O Departamento de Energia dos EUA, por sua vez, disse que os LEDs devem ser usados com “prudência”, mas sem deixar de ressaltar sua boa performance de maneira geral e classificando o alerta da AMA como “mais uma voz influente” sobre a questão.

Outras entidades, incluindo o Centro de Pesquisa sobre Iluminação do Instituto Politécnico Rensselaer, em Troy, no estado de Nova York, afirmaram que os LEDs representam menos riscos do que a AMA sugere. O centro afirmou que o relatório da AMA leva em conta pesquisas baseadas em longas exposições a LEDs de alta intensidade e que os potenciais prejuízos causados pelo brilho azul desses equipamentos “não é, provavelmente, uma preocupação da maioria da população na maioria dos casos quando o assunto é iluminação pública.”

Motta, um dos autores do relatório da AMA, rebateu as entidades ressaltando que não há nenhuma má intenção da parte da associação em fazer os alertas em relação ao LED, muito menos do ponto de vista econômico. O que a AMA recomenda, apenas, é que as cidades procurem adotar, em sua maioria e na maioria dos lugares, os LEDs de menor intensidade.

Tradução e colaboração de Fabiane Ziolla Menezes
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