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Os aplicativos não são os (únicos) culpados pelo engarrafamento. E não roubam, necessariamente, os clientes dos taxistas, já que atingem um público de menor renda. | Henry Milleo/Gazeta
Os aplicativos não são os (únicos) culpados pelo engarrafamento. E não roubam, necessariamente, os clientes dos taxistas, já que atingem um público de menor renda.| Foto: Henry Milleo/Gazeta

Dois aplicativos de táxi lançaram seus próprios “ubers” nas últimas duas semanas. Por enquanto só vale São Paulo, que regulou o serviço em maio. Menos do que uma traição, a migração é mais como um sinal dos tempos. Ainda que em muitas cidades as brigas entre taxistas e aplicativos dominem o debate público, quem olha só para este aspecto pode deixar muita coisa escapar. Analistas indicam que os novos modelos de transporte individual podem tanto acabar com os congestionamentos quanto eliminar o transporte público. Ajudar a unir ou segregar as cidades.

Nova York, nos EUA, contratou uma consultoria independente para analisar todo o sistema de transporte individual da cidade. As conclusões colocaram em xeque as próprias convicções do prefeito Bill de Blasio. Há um ano atrás, ele apontava para o Uber e similares como grandes vilões do trânsito. O cálculo era de que, em um ano, 25 mil novos motoristas entrariam no mercado, sobrecarregando, principalmente, as áreas mais congestionadas de Manhattan.

Ocorre que, nos últimos cinco anos, houve um aumento no número de obras (6% a 7%) e de pedestres (18 a 24%) justo na região comercial de Manhattan, que concentra boa parte dos negócios e pessoas da ilha. Ao mesmo tempo, a revista Forbes levantou que o UberX (versão econômica do aplicativo, lançado em 2014) alavancou em 1.200% as corridas com destino a bairros mais distantes, como Harlem e Washington Heights.

Táxi foi regulado para resolver problemas que não existem mais

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Em outras palavras, os aplicativos não são os (únicos) culpados pelo engarrafamento. E não roubam, necessariamente, os clientes dos taxistas, já que atingem um público de menor renda. É aí que mora o perigo para a mobilidade.

O estudo de Nova York calcula queda no engarrafamento se 13% dos usuários de táxi e Uber passem a fazer corridas compartilhadas (quando o motorista pode pegar até quatro passageiros). Mas basta que 1% dos usuários de transporte público migrem para o serviço de caronas para o trânsito voltar à estaca zero.

Além do impacto na mobilidade, a popularização dos motoristas particulares pode interferir no sentido do crescimento das cidades. O economista Luiz Alberto Esteves, que era responsável pelo Cade quando o conselho vinculado ao Ministério da Justiça elaborou estudos sobre a concorrência entre táxi e Uber, explica que cidades mais desregulamentadas, que deixam tudo na mão do mercado, são mais espraiadas. “E a noção que os governos usam hoje, de smart cities, são cidades mais compactadas. Porque barateia tudo, um bem público, um hospital. Aí vem um Uber e barateia [transporte] e o efeito é espraiar ainda mais”.

Não há uma fórmula pronta para controlar este impacto. Cada cidade tem seus próprios mecanismos de orientação do desenho urbano, como os planos diretores e leis de zoneamento. O sistema de transporte também muda.

Curitiba e São Paulo, por exemplo, têm terminais e estações que concentram um fluxo alto de pessoas em trânsito. Já em Brasília, onde muitas vezes falta demanda para o transporte coletivo, a lógica é outra.

Para Esteves, a regulação de Uber e afins deve se afastar da polarização app x táxis e responder a uma pergunta central: qual papel estes serviços de motoristas particulares vão cumprir na mobilidade urbana?

“Anatomia da crise”

O economista Luiz Alberto Esteves descreve a “anatomia da crise” do Uber: “primeiro [vem] a recusa, os governos tentam expelir, colocam um monte de recurso público para proibir. Depois [a cidade] vê que é uma causa perdida e começa a discutir uma regulação meia-boca, que não vai para frente. Só depois disso a regulação anda. E no meio disso sempre tem gente pedindo para liberar geral.”

São Paulo: “tarifa dinâmica” para controlar mercado e trânsito

Em decreto publicado em maio, a cidade de São Paulo regululamentou o transporte individual de passageiros por meio de aplicativos. Além de estabelecer regras de controle de qualidade, como um cadastro obrigatório dos motoristas, o município instituiu a venda de créditos. Os apps precisam comprar os créditos da prefeitura para funcionar. São R$ 0,10 por quilômetro rodado, em médio.

Resolveu um problema tributário. As empresas não queriam pagar pelo serviço de transporte, porque dizem ofertar apenas a tecnologia que integra motorista e passageiro. Mas os créditos também podem funcionar como instrumento de controle, em um mecanismo similar à “tarifa dinâmica”, utilizada pelo Uber.

Quando muita gente quer usar o aplicativo, ele aumenta o preço, como formar de incentivar mais motoristas a trabalhar naquele determinado momento. A prefeitura pode fazer o contrário: aumentar o preço para diminuir o número de motoristas nas ruas. É uma alternativa que pode ser usada para controlar o mercado ou diminuir os congestionamentos, por exemplo.

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