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Quadro no Museu Paranaense mostra a reprodução da chegada do primeiro governador do estado | Marcelo Andrade/Gazeta do Povo
Quadro no Museu Paranaense mostra a reprodução da chegada do primeiro governador do estado| Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo

Dia 29 de agosto ou 19 de dezembro? Emancipado de São Paulo desde 1853, o Paraná ainda não definiu quando deve ser comemorada a Emancipação do estado. Há quem defenda que a data já instituída, em dezembro, deve ser mantida. Mas também há um grupo que argumenta que se trata de um erro histórico que precisa ser reparado. A data da discórdia tem explicações na própria história do estado, com dois episódios importantes na libertação e criação do Paraná.

Quando ainda era uma comarca de São Paulo, o território paranaense usou de muita persistência e jogo de cintura político para se tornar uma província independente. Lideranças, como o tropeiro Francisco de Paula e Silva Gomes e o político Manuel Francisco Correia Júnior, que tinham um bom relacionamento na Corte Imperial, articularam diversas campanhas emancipacionistas. Todas sem êxito.

A situação só mudou a partir de 1835, quando começou a Revolução Farroupilha no Rio Grande do Sul, contra o regime imperial. A situação política do Rio de Janeiro e de Minas Gerais era parecida. O Partido Liberal nesses dois locais se articulou contra o governo da época. Se os liberais mineiros e fluminenses se unissem aos revoltosos gaúchos, a estabilidade do Império estaria em xeque. Eles formariam uma frente única revolucionária.

Quando nasce seu filho você não vai comemorar o aniversário dele no dia que faz o registro, mas sim no dia que nasceu. É parecido. Não faz sentido comemorar a emancipação no dia que o governador tomou posse

Nereu Moura deputado autor do projeto de lei que quer mudar a data da emancipação

Como escreve o historiador Ruy Wachowicz, no livro História do Paraná, o governador de São Paulo, Barão de Monte Alegre, estava preocupado com a situação e propôs que, caso as forças militares de Paranaguá e Curitiba se aliassem às forças do Império, ele iria lutar pela emancipação do Paraná.

A proposta foi aceita e a promessa, cumprida. Em 1842, Monte Alegre solicitou ao governo imperial a separação da região paranaense. O deputado paulista Carneiro de Campos apresentou o projeto de emancipação da nova província. As discussões acerca do tema demoraram quase 10 anos. Somente em dia 29 de agosto de 1853 o projeto que criava a província do Paraná foi sancionado pelo imperador dom Pedro II.

Intenso jogo político marcou processo de independência

A demora em apreciar o projeto que emancipava a comarca do Paraná, na década de 1840, tem como ‘culpados’ os deputados paulistas, que tentaram atrasar a discussão temendo que a perda fosse economicamente desastrosa para São Paulo. No livro História do Paraná: séculos XIX e XX, escrito pelo historiador Angelo Priori, consta que em 1850 o Império se viu quase obrigado a retomar os debates.

“Nessa época, surgiu a preocupação com possíveis invasões dos países vizinhos. Dessa forma, regiões de fronteira passaram a ser mais bem estruturadas, com vistas a evitar qualquer invasão estrangeira. Essa nova política possibilitou a criação da província do Amazonas”, diz o livro. A situação acabou trazendo à tona, novamente, a questão da emancipação do Paraná.

Priori relata que Minas Gerais e Bahia passaram a apoiar a causa paranaense, interessadas na possível diminuição da importância política de São Paulo. No dia 2 de agosto de 1853, o projeto de emancipação da comarca do Paraná foi aprovado e, em 29 do mesmo mês, sob Lei nº 704 sancionada por D. Pedro II.

Posse

No entanto, a província foi instalada, de fato, no dia 19 de dezembro daquele ano quando o primeiro governador, o baiano Zacarias de Góes e Vasconcelos, tomou posse. Por isso, o dia 19 ficou conhecido como o da emancipação paranaense. Contudo, na letra da lei a criação da Província do Paraná foi em 29 de agosto com a promulgação da lei imperial. É por isso que o historiador Jair Elias dos Santos Júnior, membro do Instituto Histórico Geográfico do Paraná, defende que a data seja alterada no calendário oficial do Paraná. “O dia 29 de agosto comemora a sanção imperial criando a Província do Paraná. O próprio Bento Munhoz da Rocha Neto, o governador do centenário do estado, assinalou que o ‘dia 29 de agosto nos deve ser ainda mais grato que o 19 de dezembro’”, afirma o historiador.

O diretor do Museu Paranaense e historiador Renato Carneiro concorda que a data de criação é em agosto. “A instalação é que acontece em dezembro”, diz. Contudo, ele não vê muito valor nessa discussão. “Esse debate em torno da data de emancipação me parece ser uma particularidade nossa. Parece uma espécie de trauma por ter sido uma comarca abandonada de São Paulo por tanto tempo. Não vejo muito sentido em debater qual é a data correta”, afirma.

Projeto de lei pode mudar o dia da Emancipação

Um projeto de lei que está em trâmite na Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia Legislativa do Paraná pode instituir oficialmente o dia 29 de agosto como a data magna para celebrar a Emancipação do Paraná. A proposta é do deputado estadual Nereu Moura (PMDB). “Quando nasce seu filho você não vai comemorar o aniversário dele no dia que faz o registro, mas sim no dia que nasceu. É parecido. Não faz sentido comemorar a emancipação no dia que o governador tomou posse”, defende Moura.

Segundo o parlamentar, o projeto visa corrigir um erro. “A história do estado é pouco conhecida pelos paranaenses. Quero trazer à tona essa discussão. Não quero aprovar meu projeto de qualquer jeito. O ideal é ter uma audiência pública e proporcionar um debate sobre a nossa história”, diz.

Há um outro argumento que em nada tem relação com o ato da Emancipação. Para o historiador Jair Elias dos Santos, em dezembro, por exemplo, fica inviável a promoção de atividades cívicas nas escolas. Ao contrário de agosto, o que facilita de certa maneira. O paranaense desconhece sua história, por vezes, parece que tem vergonha de si próprio”, afirma.

Egon Bockmann Moreira, doutor em Direito e professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR), acredita que um projeto desses não faz sentido. “A história não é manuseável. A história tem suas tradições e se já há uma data instituída, não faz sentido um projeto para mudar esse dia”, relata. Segundo ele, é uma proposta desnecessária do ponto de vista político. “Para que mudar isso? Essa é uma discussão que deve ficar restrita aos historiadores. Não precisa fazer uma lei para isso”, ressalta Moreira.

O projeto de Moura não prevê que a data seja feriado obrigatório, mas ponto facultativo. No ano passado, o debate em torno do feriado no dia 19 de dezembro, para celebrar a Emancipação Política do estado, provocou polêmica. Isso porque a lei estadual 4.658 de 1962 instituía a data como feriado e o Ministério Público do Trabalho do Paraná (MPT-PR) exigiu que fosse cumprido, com dia não trabalhado. No entanto, em dezembro de 2014, a lei 18.384 revogou a legislação anterior, mas manteve o dia 19 de dezembro como a data da independência do estado. “Consagra o dia 19 de dezembro como a data da emancipação política do Estado do Paraná, não se constituindo em feriado civil”, diz a lei.

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