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Orla do Guaíba, em Porto Alegre
Orla do Guaíba, em Porto Alegre| Foto: Divulgação / Prefeitura de Porto Alegre

A ofensiva em prol da ideologia de gênero chegou a um novo front: os parques públicos brasileiros. Atuando em parceria com um órgão da Organização das Nações Unidas (ONU), a prefeitura de Porto Alegre decidiu incluir exigências que contemplem a “identidade de gênero” no projeto de concessão da Orla do Guaíba, um projeto que inclui atrações infantis. A ideia é que, já no processo de licitação, a prefeitura exija que a empresa vencedora da concorrência cumpra, dentre outras obrigações, a promoção de ações constantes contra a “LGBTfobia”.

A licitação do Trecho 2 da Orla do Guaíba prevê concessão à iniciativa privada, por 35 anos, de uma área de 134 mil metros quadrados em uma das regiões mais frequentadas da capital gaúcha. A vencedora terá de investir cerca de R$ 70,5 milhões na estrutura do parque e construir, dentre outros, uma roda gigante e um parque infantil. Como contrapartida, a empresa poderá explorar a área comercialmente. Para auxiliar no processo de licitação, a prefeitura firmou em 2018 um acordo de cooperação técnica com o Unops, Escritório das Nações Unidas de Serviços para Projetos, Compras e Gestão de Projetos. A parceria foi anunciada como eminentemente técnica. Mas, além de avaliações urbanísticas e financeiras, a Unops preparou recomendações que dizem respeito a temas de gênero. Como forma de incentivar a adoção de medidas semelhantes país afora, as ideias também foram compiladas na publicação “Parques para Todos e Todas”, lançada no mês passado.

Em meio a itens inócuos e até desejáveis, como a criação de espaços adequados à troca de fraldas, o documento do Unops propõe medidas com carga ideológica e teor subjetivo, incluindo diversas menções à “identidade de gênero” – conjunto de ideias, não confirmadas pela ciência, que afirma que ninguém nasce homem ou mulher, mas que cada indivíduo constrói sua própria identidade.

A publicação descreve a identidade de gênero como “a experiência interna e individual  do gênero de cada pessoa, que pode ou não corresponder ao sexo atribuído no nascimento, incluindo tanto o senso pessoal do corpo - que pode envolver, por livre escolha, modificação da aparência ou função corporal por meios médicos, cirúrgicos ou outros - quanto outras expressões de gênero, inclusive vestimentas e modo de falar (ver também orientação sexual).” Tendo como base essa definição, o guia sugere ações como “Reservar espaços para a afixação de campanhas contra a discriminação (...)LGBTI+” e incentivar a candidatura de “pessoas LGBTI+” a “possíveis vagas de trabalho e concursos públicos.”

A adoção dos termos propostos pelo Unops significaria a inclusão da ideia de “identidade de gênero” em um contrato de longa duração, o que deixaria futuros gestores de mãos atadas para rever essa política. E, de fato, a prefeitura de Porto Alegre incorporou propostas do tipo no edital. Por exemplo: entre os critérios de avaliação de desempenho da concessionária, estariam a existência de “ações de fomento à geração de renda (...) voltadas para grupos  LGBTQI” e a existência de “campanhas permanentes”  contra a  “LGBTfobia.” O edital, lançado em janeiro, acabou suspenso por causa da pandemia de coronavírus, o que forçou a prefeitura a rever algumas exigências econômicas do projeto. Uma nova versão do texto deve ser lançada até o fim do ano. A prefeitura não parece disposta a rever os itens que tratam da ideologia de gênero. “O edital deverá conter políticas de diversidade e de inclusão em diversos setores que englobam as atividades da concessionária e no que diz respeito ao uso do parque”, informou à Gazeta do Povo a assessoria de comunicação da Secretaria Municipal de Parcerias Estratégicas.

O prefeito Nelson Marchezan (PSDB) chegou a comemorar a divulgação do documento do Unops: “Muito importante esse reconhecimento em relação ao trabalho que estamos desenvolvendo na cidade de Porto Alegre (...). Nosso objetivo é criar condições melhores para todos, com a qualificação de serviços e dos espaços, primando pelas políticas inclusivas em todos nossos projetos”, disse ele, em declaração divulgada pelos órgãos oficiais.

Licitações de outros parques

O Unops, por sua vez, reconhece que a ideia é que o documento sirva como um guia para licitações semelhantes país afora. Não por acaso, o guia “Parques para Todos e Todas” foi elaborado em parceria com o Instituto Semeia, entidade sem fins lucrativos que atua no processo de concessão de parques públicos à iniciativa privada. Recentemente, o Semeia firmou parcerias para atuar na concessão do Ibirapuera, em São Paulo, no Parque da Cidade, em Brasília, e no Complexo da Pampulha, em Belo Horizonte.

Procurada pela Gazeta do Povo, o Unops afirmou que a publicação “Parques para Todas e Todos é uma ferramenta para inspirar a construção de espaços mais diversos a partir da inserção da perspectiva de gênero em parques urbanos, seja em sua implantação ou gestão”. O Unops alega que “são reconhecidas as barreiras sociais geradas pelo racismo e os impedimentos à livre expressão dos direitos sexuais, que impõem a indivíduos e grupos de pessoas negras e com identidades de gênero diferentes da norma inúmeras barreiras à sua livre circulação social.”

A Secretaria Municipal de Parcerias Estratégicas, responsável pelo projeto da Orla do Guaíba, disse à Gazeta do Povo que a parceria com o Unops teve um custo total de US 400 mil (cerca de R$ 2,2 milhões, em valores de hoje), cobertos por um empréstimo da prefeitura junto ao Banco de Desenvolvimento da América Latina. Ainda segundo a secretaria, a parceria com o Unops já foi finalizada, e contemplou “diagnóstico técnico, modelagem de negócio, capacitação dos quadros municipais para o desenvolvimento de projetos de parcerias para infraestrutura urbana voltados para os três trechos da Orla do Guaíba”.

Correção

Inicialmente, a reportagem informava que a vencedora da licitação teria de investir R$ 750 milhões no parque. Mas o valor correto é R$ 70,5 milhões.

Corrigido em 15/07/2020 às 15:58
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