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| Foto: Anna Parini/NYT

Quando tive meus filhos, senti que havia uma tendência entre os especialistas, incluindo aqueles da minha própria profissão de pediatra, em defender certos princípios que tiravam toda a graça da vida. Pude ver isso, em particular, depois que dei à luz ao meu primeiro filho e me falaram, como parte do “apoio” à amamentação, que eu deveria evitar todos os alimentos temperados porque eles incomodariam meu bebê. Como qualquer boa mãe de Cambridge, Massachusetts, transformei isso em uma discussão acerca do multiculturalismo – “e as mães em Sichuan?” –, mas o que eu achava mesmo era que isso tinha a ver com uma antiga visão segundo a qual as especiarias aqueceriam o sangue, tornando a vida interessante demais para uma mãe que amamenta.

Por que dizem às mulheres para evitar sabores fortes quando amamentam?

Vinte e cinco anos atrás, pesquisadores pediram a um grupo de mães amamentando para comer mais alho. No estudo “Dieta materna altera as características sensoriais do leite humano e o comportamento do lactente”, publicado em 1991 no periódico “Pediatrics”, mães que amamentam e comem alho produzem um leite com cheiro forte, conforme avaliação dos pesquisadores que não sabiam quais eram as amostras. O mais interessante era como o leite era percebido pelos bebês, poeticamente chamados de “lactentes”. Quando o efeito do alho estava presente, os bebês ficavam mais tempo no seio e mamavam com maior vigor.

Julie Mennella, biopsicóloga do Centro Monell de Sensações Químicas, na Filadélfia, era a pesquisadora chefe do estudo de 1991; ela continua estudando o efeito de exposições precoces no desenvolvimento do gosto. “O líquido amniótico e o leite materno têm muita informação sensorial. O bebê recebe a informação quando mama.”

Outro estudo, publicado em 2001, demonstrou que os bebês expostos a um sabor no útero ou durante a amamentação apresentavam maior probabilidade de gostar dele quando fossem desmamados.

O que entra no estômago entra na corrente sanguínea, quebrado em moléculas de proteína, carboidratos, gordura. Os sabores também passam, incluindo as potentes moléculas voláteis, que transportam o cheiro, as quais, por sua vez, influenciam tremendamente o gosto, como sabe quem já tentou comer algo delicioso com o nariz muito congestionado.

A variedade de sabores consumida durante a gravidez entra no sangue e, depois, no líquido amniótico, que o bebê vive bebendo no útero, e os sabores experimentados enquanto se amamenta atravessam os vasos sanguíneos que suprem as glândulas mamárias chegando ao leite materno. Assim, em vez de restringir a dieta materna, existem agora boas evidências de que ao comermos uma ampla variedade de alimentos saudáveis e saborosos durante esse período, faremos um grande favor aos nossos filhos.

“Bebês que mamam no peito costumam ser mais fáceis de alimentar depois, porque já experimentaram uma variedade de sabores diferentes em seus primeiros estágios de vida, enquanto aquele que toma leite em pó tem uma experiência uniforme. O essencial é a exposição repetida a uma variedade de sabores diferentes assim que for possível; essa é uma ótima coisa para a aceitação da comida”, disse Lucy Cooke, psicóloga especializada em nutrição infantil e pesquisadora associada da University College de Londres.

Sua pesquisa incluiu o trabalho com crianças que estão sendo desmamadas para aumentar a aceitação de verduras e legumes, oferecendo exposições repetidas a eles.

“Os bebês são tremendamente adaptáveis e aceitam muito bem todos os tipos de sabores estranhos”, disse Lucy.

E a ideia de que alguns alimentos na dieta materna podem deixar a criança irrequieta, com gases ou cólica? Por definição, os alimentos que provocam gases na mãe o fazem porque não são absorvidos e ficam em seu intestino, causando o problema. Por outro lado, vários estudos sugerem que bebês com cólica se sentem melhor se as mães mantiverem distância do leite de vaca, assim os médicos podem aconselhá-las a cortá-lo por um período de teste de dez a 14 dias, mas sem se esquecer de ingerir cálcio suficiente.

Às vezes, a cafeína é culpada, disse a Dra. Pamela High, professora de pediatria da Universidade Brown e diretora médica do Programa de Sono, Choro e Comportamento Infantil do Hospital Women & Infants, em Rhode Island. Entretanto, mães de bebês com cólica muitas vezes restringem mais e mais sua dieta, e muitas terminam desistindo de amamentar, escreveu Pamela por e-mail, embora nem sempre isso ajude.

Então, sim, os sabores que ingerimos quando estamos grávidas ou amamentando chegam ao bebê, com aromas e tudo. Contudo, isto deve ser visto como uma mensagem positiva e não uma lista de proibições, já que estamos oferecendo algo além de proteína e calorias; estamos deixando nossos bebês, nascidos ou não, desfrutar algumas das delícias da nossa condição onívora humana.

“Uma dieta de alimentos saudáveis que a mãe gosta é a melhor maneira de dar exemplo. O bebê só aprende se a mãe os comer”, disse Julie.

Quando eu amamentava e comia os alimentos apimentados que tanto adoro, estava dando um exemplo. Afinal, meus filhos iriam crescer em uma família na qual comida picante faria parte praticamente de quase todo evento familiar.

E se os sabores dos alimentos que se ama podem tornar a experiência da gravidez e de criar os filhos um pouco mais saborosa – ou apimentada – para as mães, isso também é muito bom, e tem tudo a ver com o que esperamos que eles bebam no leite materno.

“A comida dá prazer. Existe muita biologia fundamentando o prazer de comer”, afirmou Julie.

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