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Mendes: juízes têm culpa nos problemas carcerários, mas advogados também são responsáveis. | Fabio Pozzebom
Mendes: juízes têm culpa nos problemas carcerários, mas advogados também são responsáveis.| Foto: Fabio Pozzebom

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Há mais de um tipo de prisão possível antes da condenação em última instância. Na maior parte dos casos, a decisão do STF não muda nada:

Prisão definitiva

No início de fevereiro o STF garantiu que um homem permanecesse em liberdade até que não coubessem mais recursos. A medida vale para decisões de 1º e 2º grau. Anteriormente, os réus aguardavam a decisões das instâncias superiores, como as do próprio STF, já cumprindo a pena, com base no Código de Processo Penal. O Supremo decidiu – baseado no artigo 5º da Constituição Federal, que presume que ninguém é culpado até que se prove o contrário – que o réu deve ficar em liberdade. A medida não interfere em nada na questão das prisões preventivas, temporárias ou em flagrante.

Prisão preventiva

Decretada quando o juiz encontra motivos para pedir a prisão do réu, como possibilidade de fuga ou prejuízo das investigações. O Código de Processo Penal estabelece no artigo 312 que a prisão preventiva "poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal". É importante salientar que mesmo com a decisão do STF sobre a prisão definitiva, o juiz pode decretar a prisão preventiva do réu se tiver motivos suficientes.

Prisão temporária

Como o nome já diz, tem um período de tempo pré-definido. Pode durar cinco dias, prorrogáveis por mais cinco. Ocorre em casos imprescindíveis para as investigações do inquérito policial, quando o indiciado não tem residência fixa ou quando há participação em crimes como sequestro, homicídio doloso e estupro.

Prisão em flagrante

Ocorre nas situações em que a pessoa esteja cometendo ou tenha acabado de cometer uma infração penal. O Código de Processo Penal estabelece que se considerae em flagrante delito também quem é perseguido pela autoridade policial ou é encontrado, logo depois, com armas, objeto ou algo leve a presunção de autoria. Cabe ao juiz avaliar se o indiciado oferece perigo e deve continuar preso, caso contrário a pessoa é solta.

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em garantir que um réu condenado permaneça em liberdade até que não caibam mais recursos não deve resolver o crescente déficit de vagas nas prisões brasileiras. A medida não vai soltar todos os presos provisórios, tampouco afetará as prisões preventivas, temporárias e em flagrante. "A medida só vale para presos que já foram condenados e vão recorrer", esclarece o advogado Joe Velo, presidente do Conselho Penitenciário do estado. "Antes, já passavam a cumprir a pena, agora podem aguardar o fim dos recursos em liberdade".

Segundo dados levantados pelo CNJ, em 2000 o déficit era de 97 mil e no ano passado dobrou, chegando a quase 200 mil. Nos últimos 13 anos, a população carcerária brasileira cresceu 200%, pulando de 148 mil para 446 mil.

Mais de um terço dos presos brasileiros está encarcerado indevidamente, de acordo com o presidente do STF e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Gilmar Mendes. A afirmação foi feita no 2º Encontro Nacional do Judiciário, promovido na segunda-feira. O país tem hoje quase 450 mil detentos e 43%, ou 192 mil, são presos provisórios. Mendes afirmou que a defensoria pública e os advogados também têm responsabilidade sobre esses dados. "Todos dizem: ‘Isso não é um problema nosso’. Quer dizer, o réu pobre não é problema de ninguém", disse.

Para Mendes, os juízes têm culpa nos problemas carcerários porque são eles que decretam as prisões provisórias antes que os casos tenham transitado em julgado, mas que a responsabilidade também é de quem defende os presos.

O Brasil ocupa uma posição preocupante quando comparado a outros países. Há 229 detentos para cada 100 mil habitantes, enquanto na França são 91 e na Dinamarca 66. "Nós sabemos que os habeas corpus que chegam de réus pobres e ricos são julgados, mas é preciso que eles cheguem aos tribunais". O estado com maior número de presos provisórios é Alagoas, com 77% dos detentos nesta condição. O Paraná tem 41% e o Rio Grande do Sul, 22%, o menor porcentual.

Na opinião do jurista René Dotti, ex-presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, há duas situações principais em que ocorrem as detenções ilegais. A primeira é quando o preso já cumpriu a sua pena e por problemas burocráticos não conseguiu o alvará de soltura. A segunda situação mais comum é quando o detento tem a possibilidade de pedir a remissão da pena e conseguir benefícios como regime aberto ou semi-aberto e por falta de quem o defenda não consegue.

Dotti critica a falta de agilidade nas Varas de Execuções Penais. Por problemas burocráticos e horário de funcionamento, muitos alvarás deixam de ser cumpridos. "Mendes tem muita razão quando diz isso. Ele fez muito bem em botar o dedo nessa ferida, que é uma das principais do Judiciário". Uma pesquisa divulgada pela Associação dos Magistrados do Brasil (AMB) na semana passada mostrou que 85% das varas judiciais têm mais de 1.000 processos em andamento.

O advogado José Carlos Portella Junior professor de Direito Criminal da Unicuritiba aponta como possíveis soluções para as prisões indevidas a estruturação da defensoria pública e a criação de novas varas. Ele também critica a pouca agilidade das mesmas, destacando que em Curitiba existem somente duas para atender a capital e todas a região metropolitana. "A maioria dos detentos é de pessoas carentes, que não têm acesso a advogados e muitas vezes nem sabem dos benefícios a que tem direito".

Portella cita um caso que foi atendido no Núcleo de Prática Jurídica da universidade. Um homem estava preso há um ano de forma ilegal, já que possuía um alvará de soltura e não havia sido denunciado pelo Ministério Público por falta de provas. Somente quando a família procurou o auxílio gratuito conseguiu resolver a questão, que poderia ser solucionada em dois dias pela Defensoria Pública.

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