
Com o movimento de retorno às atividades presenciais nas universidades públicas do Paraná, oito das dez instituições do estado, tanto estaduais quanto federais, já confirmaram a exigência do comprovante de vacinação contra a Covid-19 para o retorno às atividades presenciais. Apenas a Universidade Estadual de Londrina (UEL) e a Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), que retornam nos dias 24 de janeiro e 3 de março, respectivamente, ainda não determinaram a obrigatoriedade da medida.
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Diante das penalidades previstas à parcela da comunidade acadêmica que optar por não se vacinar – além dos estudantes, que reprovarão pela acumulação de faltas ou com empecilhos nas matrículas, servidores também poderão ser exonerados por ausências acumuladas –, alunos e funcionários da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e da Universidade Estadual de Maringá (UEM) relataram à reportagem seus posicionamentos quanto à exigência do passaporte vacinal e as medidas que querem tomar em sua defesa.
Para Tiago José Gabre, que é servidor da UFPR há doze anos, o receio de perder o emprego após a decisão do Conselho Universitário (Coun) de implementar o passaporte vacinal motivou a criação de um grupo no WhatsApp com colegas e estudantes da instituição que discordam da medida. Representantes do grupo, atualmente com 60 membros entre servidores e alunos, têm se articulado junto a parlamentares para frear a exigência do comprovante de vacinação na universidade. Segundo Gabre, no grupo também há pessoas vacinadas contra a Covid-19 que discordam da exigência do passaporte.
“Todos aqui são a favor das vacinas. Nós temos racionalidade, somos pró-Ciência. Mas queremos ter o direito de escolha quanto a esta vacina em específico. O mais grave [da instituição do passaporte sanitário] é gerar segregação, e o precedente de imposição que abre é muito complicado, muito perigoso”, diz o servidor. “Entendemos que é uma medida ditatorial que acaba estimulando o ódio entre as pessoas. Temos relatos de alunos sendo hostilizados em redes sociais e presencialmente ao tentar fazer a matrícula”.
Na UFPR, com a exigência do certificado vacinal, servidores não imunizados só poderão acessar os locais de trabalho mediante a apresentação periódica de teste com resultado negativo para Covid-19 realizado nas últimas 72 horas, a suas expensas. Com o impedimento do acesso, os profissionais passarão a levar faltas recorrentes, o que resultará em um processo administrativo e, consequentemente, na exoneração do servidor.
De acordo com Henrique Meyrer da Silveira, também servidor da UFPR, a forma como a medida foi discutida é questionável. Segundo seu relato, a convocação da reunião do Conselho Universitário em que o passaporte vacinal foi aprovado foi publicada com apenas dois dias de antecedência e em período de férias. “Uma resolução como esta, que tem implicações gravíssimas sobre toda a comunidade universitária, deveria ser longa e ponderadamente discutida antes de ser colocada em votação”, afirma Silveira. “Ninguém deve ser forçado a se vacinar, ainda que de forma indireta, mediante ameaças de demissão e perda de vaga na universidade. Isso é simplesmente desumano”.
Segundo ele, há vários servidores na mesma situação, mas que têm relutado em se manifestar abertamente contra a exigência devido à atmosfera geral de intimidação que foi criada sobre o tema. “Para outros, o motivo é simplesmente que a posição contrária ao passaporte está associada ao bolsonarismo, e como eles não são bolsonaristas, acabam ficando com esse receio”, declara Silveira, citando que o grupo de oposição ao passaporte não tem viés político.
Para uma estudante do 4º período de Direito da UEM, que prefere não ter seu nome revelado, a imposição do passaporte sanitários na universidade não cumpre a função de evitar a transmissão do vírus. Segundo ela, o fato de a nova cepa [Ômicron, que possui velocidade de transmissão superior às variantes anteriores] estar contaminando um grande número de pessoas vacinadas mostra que o estabelecimento do passaporte não impedirá o contágio no ambiente acadêmico.
Ela também questiona a forma impositiva que a medida foi implementada. “Uma universidade onde o aluno adquiriu o direito de estudar por meio do vestibular e já apresentou um comprovante de vacinas obrigatórias que estão no Plano Nacional de Imunização no momento da matrícula não pode criar, quando bem entender, um fator impeditivo de o aluno estudar”, declara.
Outra estudante, que também optou por falar à reportagem sob sigilo, atualmente cursando o 3º ano de História na UEM, o impedimento do acesso de não vacinados à universidade é abusivo. Ela possui uma doença ocular rara, hereditária e degenerativa que causa deficiência visual grave. A doença não é impeditiva para a imunização contra a Covid, mas a estudante, que tem perdido a visão aos poucos, tem receio de eventuais efeitos colaterais que possam piorar seu caso.
“Estou no terceiro ano, frequento a universidade, não tenho faltas, tenho boas notas. E de repente minha vaga, que foi conquistada, simplesmente está sendo retirada. Ou eu paro a faculdade ou eu tranco a matrícula. Se eu trancar, depois para voltar é complicado. É uma situação bem delicada”, diz a estudante, que passou em segundo lugar em seu curso.
De acordo com a aluna, que avalia que a exigência é ilegal pelo fato de a lei brasileira não determinar a obrigatoriedade da vacina contra a Covid-19, há mais alunos e até professores da UEM que estão na mesma situação, porém têm receio de se manifestar.
“A situação está inibindo as pessoas. Hoje o fato de você falar que não tomou a vacina parece que você se torna um leproso no meio da sociedade. É desconcertante, desconfortável. O discurso é que os não vacinados são os responsáveis pelas novas variantes”, prossegue.
Com resistência do MEC e da AGU, passaporte vacinal nas universidades é autorizado pelo STF
Em dezembro, o Ministério da Educação (MEC) publicou um despacho que proibia as instituições federais de ensino de exigirem comprovante de vacinação contra a Covid-19 como condição para o retorno das aulas presenciais. Dois meses antes, a Advocacia-Geral da União (AGU) também havia emitido um parecer declarando que a imunização obrigatória não pode ser condicionante ao retorno presencial.
Mesmo assim, dias após a publicação da portaria do MEC, o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu a medida ao acolher argumentos apresentados em uma ação movida pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB). Para o ministro, a portaria do MEC estaria ferindo a autonomia universitária. Juristas apontam, por outro lado, que a decisão de Lewandowski de suspender o despacho do MEC entra em confronto com decisões da própria Corte no passado, por confundir autonomia com soberania.
A UFPR, que adiou o retorno presencial do dia 31 de janeiro para 14 de fevereiro, determinou que o não cumprimento da resolução sobre o passaporte vacinal por parte da comunidade acadêmica implicará em sanções e consequências previstas em lei ou normas da UFPR. Nos casos de contraindicação clínica, o comprovante vacinal pode ser substituído por declaração médica.
Já a UEM, que publicou um ofício no dia 13 de janeiro determinando a obrigatoriedade do passaporte vacinal, estipulou que servidores e alunos que apresentem “expressa impossibilidade clínica” de serem imunizados devem apresentar atestado médico. Alunos nesta situação farão somente atividades domiciliares enquanto não forem imunizados. “Estudantes e servidores públicos que não se vacinaram e não seguirem os protocolos de biossegurança estarão sujeitos a faltas e sanções disciplinares”, cita comunicado da instituição.
Com as aulas presenciais suspensas desde o início da pandemia, a UEM marcou a volta presencial para 17 de janeiro. Dois dias depois, no entanto, a Reitoria citou a nova crescente de casos de Covid-19 no estado para suspender, indefinidamente, o retorno presencial.
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