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“O Fórum Cível é um horror. Não sei como o pessoal consegue colocar em prática o serviço. Até, para nossa surpresa, a produtividade lá é muito boa, pelo que temos de estrutura", Desembargador Celso Rotoli de Macedo, presidente do TJ | Hedeson Alves / Gazeta do Povo
“O Fórum Cível é um horror. Não sei como o pessoal consegue colocar em prática o serviço. Até, para nossa surpresa, a produtividade lá é muito boa, pelo que temos de estrutura", Desembargador Celso Rotoli de Macedo, presidente do TJ| Foto: Hedeson Alves / Gazeta do Povo

Ao assumir a presidência do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ), há cerca de três semanas, o desembargador Celso Rotoli de Macedo convocou sua nova equipe e deu o recado: "Todo mundo tem que estar com a vassoura na mão, para começar o trabalho, porque, se perder tempo procurando a vassoura, terminou o meu mandato". De fato, o tempo é curto e a faxina é longa. Quinze dias antes de Macedo assumir, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) havia divulgado um pesado relatório sobre a inspeção que fizera no Judiciário paranaense, em novembro do ano passado, apontando 113 pontos falhos na Justiça estadual do Paraná. E o novo presidente do TJ tem agora cerca de 180 dias para resolvê-los – seu mandato apenas completará o do desembargador Carlos Hoffmann, que se aposentou, encerrando-se em fevereiro do ano que vem, quando o próprio Macedo se aposenta. Contados apenas os dias úteis, é quase um grande problema por dia para resolver. Macedo, contudo, diz que hoje não há tantas pendências. "Quando foi apresentado o relatório, praticamente a metade daquelas 113 questões levantadas pelo CNJ já estavam solucionadas. Para outras, bastam apenas algumas explicações", afirma. E completa: "Os seis meses que tenho na presidência não são poucos nem muitos. É o período que eu tenho e é dentro disso que eu tento fazer alguma coisa". Confira os principais trechos da entrevista concedida com exclusividade à Gazeta do Povo.

O sr. está assumindo o TJ em um período delicado e tem apenas seis meses de trabalho. O que o sr. já fez e pretende fazer nesse curto espaço de tempo?

Por exemplo, atendendo à meta 5 do CNJ, estamos implantando gerenciamento de rotinas. Neste semestre, vamos reunir todos os escrivães e juízes de cartórios criminais para buscarmos as melhores formas de trabalho e padronizá-las. Também fizemos uma reestruturação no departamento de informática e temos a pretensão de digitalizar as varas, inclusive com o uso de processos virtuais. Aliás, em 60 dias, queremos implantar em Curitiba uma vara cível virtual piloto. Isso significa acabar com a papelada. Porque o Fórum Cível é um horror. Não sei como o pessoal consegue colocar em prática o serviço. Até, para nossa surpresa, a produtividade lá é muito boa, pelo que temos de estrutura. Com a digitalização, vamos en­­curtar o tempo de andamento dos processos em 46%. En­­fren­tamos também a questão financeira. Fiz um grande esforço junto à Assembleia Legislativa para que o repasse do Executivo ao Judiciário fosse aumentado. E conseguimos isso na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2011 (aumento de R$ 150 milhões em relação aos cerca de R$ 800 milhões deste ano). Ouvi hoje que o governador (Orlando Pessuti) pode vetar isso. Se o veto ocorrer, vou lutar com todas as forças que eu tiver para derrubá-lo, porque eu tenho que defender o nosso lado, que é muito cobrado.

Os juízes reclamam muito da falta de assessores...

É, falta assessoria. Esse é um pleito antigo. Hoje, (além dos desembargadores) apenas os juízes titulares das comarcas de entrância final (maiores comarcas) têm assessores. Como assumi nesse período curto e tenho de respeitar a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Lei Eleitoral, não pude encaminhar para a Assembleia um projeto de lei que atenda a essa solicitação. Mas já estamos preparando a proposta e vamos encaminhá-la. Contudo, para acudir essa situação, através das condições legais, já instituí para cada juiz do Paraná, inclusive aos substitutos, um estagiário de pós-graduação, bacharéis em Direito que estejam em pós-graduação, com um ordenado que estamos estabelecendo entre R$ 1,5 mil e R$ 1,8 mil. Esse tipo de assessoria, para atender uma situação emergencial, pode ser custeada pelo Fundo de Re­­equi­­pamento do Poder Judiciário (Funrejus). Isso já está implementado.

Esses estagiários estão sendo selecionados como?

Eles serão livremente indicados pelos juízes. Agora, eu quero fazer um alerta, porque a maioria da população tem ojeriza a cargo indicado, cargo em comissão. Nós temos aqui vários funcionários que são concursados e têm estabilidade. Nesse cargo de estagiário, o que mais nos interessa é que a pessoa que o ocupe produza, tenha conhecimento técnico e tenha boa vontade para desenvolver um bom trabalho. Se o cidadão é concursado e eu determino que ele vá trabalhar com determinado juiz, e se ele chega lá e não dá conta do recado, com as garantias constitucionais, ele vai ficar lá, bem ou mal. Agora, se tem um cargo de confiança, que o juiz precisa, para produzir bem e agilizar seu serviço, e o cidadão que ele indica não dá conta do recado, ele pode tirar essa pessoa e indicar outra. E muitas vezes a população não entende e acha que esses cargos são cabide de emprego. Agora, veja bem, se o juiz indicar um estagiário que não corresponde, o problema é dele. Se o serviço dele não tiver um desenvolvimento bom, quem vai ser cobrado é o juiz, porque ele indicou um auxiliar e a responsabilidade é dele. Mas isso (a contratação de estagiários) é um paliativo. Na verdade, por determinação do CNJ nós vamos ter que abrir concurso.

Por falar em CNJ, com o sr. recebeu o relatório da inspeção no TJ?

Quando foi apresentado o relatório, praticamente a metade daquelas 113 questões levantadas pelo CNJ já estavam solucionadas. Para outras, bastam apenas algumas explicações. Não que eu queira contestar o CNJ, mas o Conselho, na minha ótica tem equiparado o país inteiro, todos os tribunais, de uma forma muito genérica. Inclusive, devo ir à Brasília para conversar com os conselheiros do CNJ sobre as questões que foram levantadas e mostrar o perfil do tribunal do Paraná, mostrar que estamos tomando providências.

Um dos principais problemas relatados pelo CNJ na Justiça do Paraná foi o fato de, aqui, 72% das pessoas em cargos comissionados não serem concursadas, quando o Conselho determina que esse número deve ser de, no máximo, 50%. Como o sr. vai resolver isso?

Pois é, mas eles levaram oito meses para fazer o relatório e querem providências em 30 dias. E estou aqui há 20 dias. Então eu pedi um prazo a eles e nós estamos tentando contornar essa situação, eliminando essa distorção. Já estamos elaborando estudos para formalizar um projeto de lei que será encaminhado à Assembleia propondo a criação de cargos concursados, para equilibrar essa situação. Que­remos encaminhar essa proposta até o final deste mês à Assembleia. Mas, mesmo que seja aprovado, nós não vamos poder botar em prática, só o próximo presidente. Seria uma atitude drástica e radical demitir um grande número de funcionário para equilibrar (os 22% excedentes, segundo o CNJ), mas isso viria em prejuízo da própria justiça. Porque nós precisamos desses funcionários.

Esse equilíbrio se dará com o concurso e o ingresso de novos funcionários em novas vagas ou os atuais serão mandados embora?

Aqueles 22% (que excedem o limite de 50% fixado pelo CNJ) de cargos em comissão serão transformados: deixarão de ser cargos em comissão e passarão a ser postos destinados a concursados. Quem ocupa hoje esse excedente deverá se submeter a concurso. Se não passar, está fora.

Outro grande problema levantado pelo CNJ diz respeito à remuneração dos funcionários da Justiça paranaense, principalmente em relação à gratificação de tempo integral de dedicação exclusiva (Tide), que, segundo o Conselho, é concedida indiscriminadamente...

Eu não estou aqui para tapar o sol com a peneira. Realmente, temos várias situações no Tribunal. Nesses poucos dias (à frente do TJ), uma das primeiras medidas tomadas foi corrigir essa distorção de cargos comissionados recebendo a Tide. A Tide é uma gratificação por dedicação exclusiva, mas o cargo comissionado também é de dedicação exclusiva. E não se pode receber as duas. Eliminamos a Tide que era concedida a esse tipo de funcionário que já tinha uma gratificação. Hoje, isso não existe mais. Isso já está corrigido e comunicado ao CNJ.

Mas a Tide foi também estendida a outros funcionários...

Temos outra realidade que inclusive já comuniquei ao CNJ. Foram feitos dois concursos para admitir funcionários na carreira do Poder Judiciário estadual, em 2008 e em 2009. Nesses dois concursos foram admitidos 940 funcionários. Agora, veja o grande problema. O pagamento desses concursados é de cerca de R$ 1,2 mil. É uma quantia baixa, pela responsabilidade, pela quantidade de trabalho. Então, o que aconteceu: dos 940 aprovados, 160 decidiram não assumir, não quiseram. Isso porque prestaram concursos na Justiça Federal ou na Justiça do Trabalho, que pagam o dobro. Isso em nível técnico. Outros 280 trabalharam entre dois e seis meses, pediram exoneração e saíram. Então, o que está acontecendo: o TJ não concorre no mercado de trabalho em questão remuneratória. Nós temos uma remuneração muito baixa. Aí determinei que fosse dado a Tide para essa categoria de funcionário efetivo, não para todo mundo. E aqueles do nível médio para cima, que têm um ordenado condizente, também não receberam. Então, para aquela categoria que recebe um ordenado muito baixo, eu concedi a Tide para equilibrar e tentar manter, porque senão daqui a pouco nós vamos ficar com defasagem de funcionários no tribunal. Já comuniquei ao CNJ. Se o Conselho não me deixar continuar com isso, vou ter que cortar, mas nós vamos correr esse risco de continuar perdendo funcionários.

Isso não é outro paliativo?

Sim. E como corrigir isso? Nós não podemos ficar fazendo paliativos, dando Tide para segurar gente. Então já está sendo elaborada proposta de lei para reestruturar o quadro desses funcionários, que vai ser encaminhado à Assembleia, no mais tardar em setembro, para dar um aumento nesses vencimentos. Não vai chegar a dobrar os R$ 1,2 mil, mas vamos chegar a aproximadamente R$ 1,9 mil. Temos essas distorções e queremos corrigi-las.

O sr. disse que o Fórum Cível de Curitiba é um horror. Enquanto isso, o Centro Judiciário segue parado. Como resolver o problema?

O problema do Fórum de Curi­tiba é crônico. Você veja que nós tínhamos, há uns anos atrás, um esqueleto de prédio que hoje é o Palácio das Araucárias, servindo como sede do Governo. Esse prédio, que era nosso, entrou numa permuta com o Complexo Peni­tenciário do Ahú. Essa é uma situação difícil de explicar. O Executivo já está ocupando ali (o Palácio das Arau­cárias) e nós não conseguimos colocar um tijolo onde está o presídio. E por quê? Porque encravado no terreno do Presídio há terrenos do INSS. O projeto novo (do Centro Ju­­diciário), que já foi aprovado e pago pelo Executivo, está inserido 70% no terreno do INSS. Então esse é o grande problema. O governo está entrando em entendimento com o INSS para pagar sua parte parceladamente. O Tribunal já tem sua parte, com dinheiro do Funrejus. Consi­­derando que o projeto do prédio novo já está pronto, minha intenção era ao menos iniciar a licitação da obra, mas do jeito que está se arrastando, não sei se vamos conseguir. Se for o caso, se a coisa começar a se arrastar muito e ser retardada, para acudir a primeira instância da capital, entendo que o Tribunal deve pelo menos iniciar um projeto para construir um prédio para colocar essas varas cíveis, porque ali onde está não tem mais condição.

Então, em último caso, a ideia é fazer um projeto menor no Ahú?

Isso, fazer algo menor e mais funcional, aliás, obedecendo a uma resolução do CNJ que determinou a padronização dos prédios do Judiciário. Um prédio sem luxo, mais funcional e rápido de se construir. Então, se a coisa complicar com o plano que já existe, nossa intenção é fazer um projeto para iniciarmos uma obra de imediato para, em no máximo dois anos, termos um Fórum Cível novo. A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) do Paraná entrou em contato conosco a esse respeito e o presidente José Lucio Glomb é nosso aliado nisso.

O Juizado Especial Criminal continua funcionando precariamente no saguão do Tribunal. Quando isso muda?

Estamos firmando um contrato naquele mesmo local onde funcionava anteriormente, na Rua Fernando Amaro. Os proprietários fizeram uma reforma, pois o prédio estava em situação muito precária, nós estamos fazendo as adequações, instalações de informática, e acredito que em um mês estaremos voltando para lá com o Juizado Especial Criminal.

O que o sr. pensa da atuação do CNJ?

Pessoalmente, acho que eles têm uma área de atuação com muita eficácia, sobretudo na área administrativa. Mas acho que eles extrapolam um pouco aquilo para que foram propostos. Inclusive, chegam a interferir em questões judiciais. E isso o que eles extrapolam vem denegrindo os tribunais estaduais, não apenas o do Paraná. Aí eu vejo reclamações do tipo: a Justiça do Paraná é muito morosa.

Ora, não é a Justiça do Paraná que é morosa. É a Justiça brasileira. E a justiça é morosa por quê? Justamente por nós não termos condições financeiras suficientes para arcar com as necessidade para atender bem ao jurisdicionado.

Nos países da Europa ou nos Estados Unidos, um juiz judica para 3 mil ou 4 mil pessoas. Um juiz brasileiro judica para 35 mil pessoas. Na comarca de Campina Grande do Sul, do lado de Curitiba, há apenas uma vara, com uma juíza, que judica para todos os 53 mil habitantes da comarca. Então como é que vamos exigir que um juiz produza uma quantidade de decisões querendo comparar com os países de primeiro mundo? E além da questão da falta de juízes, da falta de recursos financeiros, há algo pior do que isso, que depende do Congresso Nacional, que é o número de recursos. Temos cerca de dez recursos possíveis e esses recursos atravancam o andamento da Justiça, esses recursos fazem a Justiça morosa e o juiz paga o pato por isso.

O sr. está implementando também uma central de precatórios, correto? Como isso vai funcionar?

Estamos implementando uma central para distribuição e conciliação de precatórios. Esse plano já vem sendo aplicado em Minas Gerais e no Rio Grande do Sul, que tem uma central de conciliação de precatórios. Porque , de acordo com a Emenda Constitucional 62/2009, que trata dos precatórios, a responsabilidade é do presidente do Tribunal de Justiça, que responde até com seu patrimônio e criminalmente se não desenvolver bem esse trabalho do pagamento dos precatórios. Então esse plano de fazer uma gestão de precatórios, inclusive para conciliação, vai dar uma agilização no pagamento dos precatórios.

O resultado do Rio Grande do Sul foi uma economia aproximada R$ 2 bilhões no orçamento anual. Isso vamos implantar logo. Em no máximo 60 dias queremos fazer conciliação de precatórios aqui dentro. Em vez de a parte começar a fazer cessão de créditos, vendendo para firmas, o Estado vai negociar com ela. Em vez de a parte vender o crédito por 20%, 25% e depois o comprador cobrar os 100% do Estado, o Estado negocia em 50% do valor, por exemplo, e os dois ganham mais, a parte e o Estado, que economiza os outros 50%. Expede-se o alvará na hora. Daí decorre a economia para o Estado. Que fique claro, sempre respeitando a ordem cronológica e as preferências legais.

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