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Funeral do governador Parigot de Souza, em 1973, passa na frente do palácio | Fotos: Acervo Jair Elias dos Santos Júnior
Funeral do governador Parigot de Souza, em 1973, passa na frente do palácio| Foto: Fotos: Acervo Jair Elias dos Santos Júnior

O delírio que virou revolução urbana

O Palácio Iguaçu é o principal edifício do Centro Cívico, o bairro administrativo de Curitiba, cujo conceito começou a surgir entre os anos de 1940 e 1943, na prancheta do urbanista francês Alfred Aga­che. Ele foi convidado pelo então prefeito Rosaldo Leitão para criar um novo plano urbano para a capital paranaense acompanhando as transformações urbanas que ocorriam em outras cidades brasileiras.

Agache concebeu o novo bairro como "uma praça que reunisse os edifícios destinados aos altos ór­­gãos da administração estadual que, além de centro de comando, pudesse ser a ‘sala de visita da cidade’", dizia a justificativa do projeto.

Inspirada nos "civic centers" americanos, a idéia saiu do papel a partir do inicio dos anos 50, quando o engenheiro civil Bento Munhoz da Rocha Netto assumiu o governo do Paraná. Bento criou uma comissão de obras com o atributo de tornar real o que a oposição ao governo classificava de um "delírio do Bento". A inauguração do complexo de prédios seria o ponto alto da comemoração dos 100 anos de emancipação política do Paraná, em 19 de dezembro de 1953.

Ainda em 1951, no final da Ave­­­­nida Cândido de Abreu, o governador iniciou a construção do primeiro Centro Cívico do Brasil. O plano previa a construção do Palácio Iguaçu, da residência do governador, da Assembléia Legis­lativa, do edifício das secretarias de Estado, do Palácio da Justiça e do Tribunal do Júri. O cronograma das obras, porém, atrasou. Em dezembro de 1953, pouco do previsto estava concluído. As inaugurações ficaram para o ano seguinte. (SM)

  • O presidente Café Filho e o governador Bento Munhoz da Rocha na inauguração do Palácio Iguaçu
  • Bento e JK: Centro Cívico antecipou conceitos usados em Brasília
  • Bento e Getúlio Vargas veem maquete do Centro Cívico
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  • Projeto de David Azambuja em obras: marco modernista

Após passar por sua primeira grande reforma desde a construção, o Palácio Iguaçu, sede oficial do governo do Paraná, será reinaugurado hoje à noite pelo governador Orlando Pessuti. Inaugurado em 19 de dezembro de 1954, o edifício foi idealizado pelo então governador Bento Munhoz da Rocha Netto e é considerado um símbolo da integração e da modernização cultural do Paraná.O palácio foi construído na mesma época em que o Centro Cívico foi criado. Um projeto que reuniu em uma mesma área edificações de todos os poderes – Legislativo, Executivo e Judiciário – e que teria encantado e inspirado o futuro presidente da República Juscelino Kubitschek a construir Brasília.Para o professor de História do Brasil da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Carlos Antunes Filho, a construção do palácio e a idealização do Centro Cívico representam um momento de "euforia modernizante" que o estado experimentou em meados do século passado. "Houve uma ascensão de uma nova classe política, de uma nova geração de historiadores que superou uma visão mais restrita de nossa história, aliada à ascensão econômica e industrial no pós-guerra", analisa o professor.

Além da significação política, o projeto do arquiteto carioca David Azambuja é considerado um dos grandes marcos da escola modernista em todo o Brasil. O arquiteto e historiador Irã Dudeque, da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), afirma que essas construções foram erguidas para celebrar o centenário da emancipação política do estado e também procuravam mostrar ao Brasil que o estado estava se reinventando. "A arquitetura modernista delas é reveladora nesse sentido", avalia.

Já o historiador Jair Elias dos Santos Júnior, autor de livro que conta a história das cinco décadas do edifício, conta que a intenção de Bento Munhoz era demonstrar que o Paraná era um estado uno, que tinha uma única capital. "O prédio simboliza a integração do estado e procura sedimentar Curitiba como a capital e unir a população em seu entorno". Tal centralização em Curitiba, explica Santos, procurava reduzir a influência de grandes centros como São Paulo e Rio Grande do Sul sobre as regiões culturais do Norte e do Oeste do Paraná, respectivamente.

Anseio de grandeza

Santos conta que em suas pesquisas descobriu que o impulso que moveu o então governador à construção do Palácio Iguaçu nasceu da vontade de superar definitivamente um proverbial complexo de inferioridade paranaense. "A antiga sede do governo [o Palácio São Francisco, atual Museu Para­naense] era muito acanhada e o governador, que conhecia a maioria dos palácios de governo dos estados mais desenvolvidos, quis construir uma sede que fosse compatível com o nível de desenvolvimento que ele projetava para o estado", conta o historiador.

Dudeque também destaca que a construção foi resultado de uma competição amistosa entre o governador paranaense e o então governador de Minas Gerais, Kubitschek. Segundo o historiador, Bento e JK eram sempre cogitados como alternativas "modernas" à Presidência da República, depois de mais de 20 anos sob a influência política de Getúlio Vargas.Bento saiu na frente no empreendedorismo arquitetônico, mas foi o mineiro quem conquistou a cadeira no Palácio do Catete, antiga sede do governo federal no Rio de Janeiro. "É inegável que a construção do Centro Cívico influenciou a construção de Brasília al­­guns anos depois", afirma Dude­que. A inauguração do Palácio Iguaçu foi marcada pela visita do então presidente João Café Filho.

Origem do nome

Não existe nos arquivos do Palácio Iguaçu nenhum ato administrativo que tenha definido o nome "Iguaçu" para o novo palácio do governo. O nome simplesmente "pegou", de acordo com Santos. Ele acredita que o governador quis homenagear o rio-símbolo do Paraná, que "possui suas nascentes junto à capital e sua foz tem as mais famosas cataratas do mundo".

Vidros verdes geram polêmica sobre restauro

Para um leigo em arquitetura, a diferença entre colocar um vidro verde ou um transparente nas janelas de um imóvel pode ser irrelevante. Mas essa decisão conflagrou uma pequena guerra entre arquitetos e entidades da área do patrimônio cultural contra a atual reforma do Palácio Iguaçu.

A nova fachada respeitaria o projeto original de David Azam­buja, segundo o secretário estadual de Obras, Júlio Araújo. Ele diz que o arquiteto previa vidros verdes, não comprados na época por serem muito caros. O prédio recebeu então vidros transparentes. Agora, a opção foi por vidros translúcidos esverdeados.

A arquiteta especialista em restauro de obras modernistas, Giceli Portela de Oliveira, discorda. "A restauração tem que respeitar o prédio, não o projeto do prédio", afirma. Giceli lamenta que não tenham feito concurso público para a restauração. "Alterações em construções históricas precisam ser bem fundamentadas", diz.

A polêmica em torno da reforma recria, por outros motivos, o ambiente hostil que o governo de 1953 enfrentou. A construção do palácio recebeu duras críticas da imprensa, principalmente da ligada ao grupo político do ex-governador Moysés Lupion. "Parte da população considerava o gasto promovido pelo governo um absurdo diante da grande crise econômica enfrentada pelos paranaenses", afirma o historiador Jair Elias dos Santos Júnior.

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