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Alencar de Oliveira, detento da Penitenciária Estadual de Maringá: “O livro abre nossa mente. As atitudes e as decisões são mais pensadas” | Walter Fernandes
Alencar de Oliveira, detento da Penitenciária Estadual de Maringá: “O livro abre nossa mente. As atitudes e as decisões são mais pensadas”| Foto: Walter Fernandes

Ocupação

Projeto já alcançou 207 presos federais de Catanduvas

Neo Gonçalves, especial para a Gazeta do Povo

O projeto Remição pela Leitura, que virou lei e se espalhou por penitenciárias do Paraná, nasceu na Penitenciária Federal de Catanduvas, em 2009. O objetivo era oferecer aos presos mais perigosos do Brasil ocupação e oportunidade de recuperação.

Desde junho de 2009, já participaram do projeto 207 presos, o que representa 34,5% dos que passaram na unidade.

A média, até o momento, é de 5,4 livros lidos por participante, no entanto, segundo o diretor da penitenciária, Fabiano Bordignon, há detento que já leu oito livros. "Está sendo criado o hábito da leitura, que não existe com a maioria dos internos. Trata-se de uma leitura com qualidade, foi feita uma seleção de obras clássicas que foram disponibilizadas, não autorizamos qualquer livro", comenta.

O diretor destaca que o custo do projeto é quase nulo – apenas a compra dos livros. A unidade tem disponíveis 20 títulos, com 20 exemplares de cada um, que foram adquiridos pela Justiça Federal. Fabiano Bordignon já observou algumas mudanças nos presidiários participantes. "Eles preenchem o tempo ocioso, então cometem menos faltas disciplinares. O objetivo maior do projeto é a ressocialização e esperamos que isso ocorra, no entanto, depende da sociedade dar oportunidade ao ex-detento e de ele querer ser recuperar. Estamos oferecendo uma leitura de qualidade para que o preso tenha uma referência quando sair e quem sabe uma nova visão da sociedade", diz.

Interatividade

A leitura pode ajudar a recuperar os detentos?

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As cartas selecionadas serão publicadas na Coluna do Leitor.

"Novamente me desarranjara na cadeia: vinham-me repuxões na carne doída, arrastava-me a cambalear, e os dias longos no Pavilhão dos Militares, a ausência de comida e a friagem do chão tinham-me arrasado." Ao ler a obra Memórias do Cárcere, de Graciliano Ramos, o detento Alencar de Oliveira, 42 anos, relaciona a história com algumas situações que vive no presídio diariamente. "É tumultuado, tem superlotação e é muito parecido com o sistema prisional em que vivo." Ele é um dos 300 presos do Paraná que participam do projeto Remição pela Leitura, da Secretaria Estadual de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos (Seju). No Brasil, há outros 307 presidiários, das quatro penitenciárias nacionais, em Catanduvas (PR), Campo Grande (MS), Mossoró (RN) e Porto Velho (RO), que também participam de programa semelhante.

O novo modelo de diminuição de pena nas penitenciárias federais foi criado em junho por portaria do Ministério da Justiça. No âmbito das penitenciárias estaduais, o Paraná se tornou pioneiro na adoção da prática. Desde maio deste ano, obras de literatura clássica, científica e filosófica fazem parte da rotina de nove unidades penais no estado, como a Penitenciária Estadual de Maringá (PEM), onde está Oliveira. Cada detento tem o direito de ler um livro por mês e produzir um relato (ensino fundamental) ou uma resenha (ensino médio). O documento passa por revisão de professores e, se atingir nota superior a 6, são reduzidos quatro dias da pena.

Os detentos têm duas formas para redução penal: trabalho e estudo. A leitura se encaixa como uma remição adicional do segundo item. "Na escola existem tarefas extracurriculares. O raciocínio da remição por leitura é o mesmo", afirma Maria Tereza Uille Gomes, secretária estadual de Justiça. "O acervo bibliográfico é previamente selecionado por uma comissão de pedagogos. Fazemos rodízios periódicos em parceria com a Biblioteca Pública do Paraná", explica Maria Tereza.

Mudanças

O diretor da PEM, Vaine Gomes, diz que o preso entra no grupo da leitura focado apenas na redução penal. Mas, com o hábito diário e a interação com os colegas, as obras passam a fazer parte da rotina. "Sensivelmente conseguimos observar a mudança dos presos. Percebemos que se tornam mais cultos para conversar", exemplifica.

A mudança no diálogo é um dos muitos benefícios apontados pelo detento Adilson Ribeiro, 42 anos. "Usava muita gíria. A leitura me fez perder isso e agora falo de maneira mais social", conta. Nascido no Mato Grosso, Ribeiro está na PEM há 8 anos por ter praticado um homicídio. O acesso à cultura fora da cadeia, segundo ele, o teria direcionado para outro rumo. "O livro abre nossa mente. As atitudes e as decisões são mais pensadas. Somente agora estou tendo esse desprendimento, mas, mesmo assim, antes tarde do que nunca."

Estudo diminuiu reincidência

Mesmo na ausência de pesquisas científicas sobre o assunto, especialistas defendem que o estudo no sistema prisional diminui a reincidência. "A grosso modo, a reincidência cai de 70% para 20%", afirma a coordenadora de Educação, Qualificação e Profissionalização de Apenados da Seju, Glacélia Quadros.

Agora ávido leitor de Sidney Schell, um detento diz que quando sair da prisão levará a vida de maneira mais correta. "O aprendizado nos ensina a dar passos mais firmes. Se não estiver adaptado à sociedade, precisarei roubar, mas isso não quero. Preciso sair daqui preparado e a leitura está me preparando." A meta estadual é de 100% de acesso ao trabalho e educação até o fim de 2014. Em 2011, 30% dos apenados estavam estudando (contra 24% em 2010) e 25% trabalhavam (eram 22,5% em 2010).

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Opções

Conheça quais são as possibilidades para a remição de pena dos presidiários:

TRABALHO

O preso ganha um dia de redução para cada três de trabalho.

Paraná

4.409 presos trabalham no Paraná, o equivalente a 31% dos presidiários das unidades do estado.

Brasil

89.125 presos trabalham nas penitenciárias estaduais de todo Brasil.

Penitenciárias federais

35 presos trabalham nas quatro penitenciárias federais do país.

ESTUDO

O detento ganha um dia de redução da pena para cada 12 horas de estudo.

Paraná

5.380 presos estudam nas unidades estaduais do Paraná, o equivalente a 38% dos presidiários das unidades do estado.

Brasil

48.050 presos estudam nas penitenciárias estaduais do Brasil.

Penitenciárias federais

131 presos estudam nas quatro penitenciárias federais do país.

LEITURA

O preso ganha quatro dias de redução da pena para cada resenha ou relatório entregue com nota superior a seis. O limite é de um livro por mês.

Paraná

300 presos estão inscritos na remição por leitura nas unidades do estado do Paraná.

Penitenciárias federais

307 presos estão inscritos na remição por leitura nas quatro penitenciárias federais do país.

* As atividades podem ser complementares e, mensalmente, a redução chega a até dez dias.

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