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Cracolândia em São Paulo é reflexo da dificuldade que grandes centros urbanos têm para combater o avanço do crack | Danilo Verpa/Folhapress
Cracolândia em São Paulo é reflexo da dificuldade que grandes centros urbanos têm para combater o avanço do crack| Foto: Danilo Verpa/Folhapress

Internação

Litoral tem carência de vagas

Bianca Marchini, especial para a Gazeta do Povo

Paranaguá, no litoral do estado, é um dos municípios que podem se beneficiar com o plano nacional de enfrentamento ao crack. A cidade está elaborando um projeto para instalar um Centro de Atenção Psicossocial exclusivo para usuários de drogas e álcool (Caps AD). Hoje, a cidade conta apenas com um Caps, que oferece atendimento gratuito também a pacientes com transtornos mentais. E é justamente esse o problema. Das 165 vagas oferecidas, apenas 30 são destinadas a dependentes de álcool e drogas, um número muito pequeno para a quantidade de usuários em Paranaguá.

Segundo o psicólogo e coordenador do Caps, Wilson Silva, os pacientes que procuram o tratamento nos centros não ficam internados no local. "O Caps é uma alternativa a um modelo hospitalocêntrico, que é o tratamento com a pessoa inserida dentro da sua comunidade", diz. Segundo ele, são internados apenas os pacientes em fase aguda de abstinência.

As clínicas de Curitiba e região metropolitana, que atendem pelo SUS, são as alternativas de internamento aos usuários do litoral. "Encaminhamos para o Centro de Psiquiatria Metropolitano, que realiza a distribuição de leitos, mas há suporte maior à região metropolitana. O litoral fica com as vagas que sobram", explica.

Atendimento

Saiba onde procurar ajuda para tratar alguém com dependência química:

1 Primeiro atendimento

O dependente deve ser encaminhado a uma Unidade Básica de Saúde. Nessa primeira observação, a pessoa deve ser avaliada e encaminhada para um dos dez Centros de Atenção Psicossocial (Caps), no Paraná.

2 Emergência

O ideal é conduzir o paciente a um dos oito Centros Municipais de Urgência Médica (CMUM) de Curitiba. Os endereços dos CMUM podem ser consultados no site sitesms.curitiba.pr.gov.br/saude/servicos/enderecos.htm.

No caso de dependentes vindos da região metropolitana, o destino deve ser o Centro Psiquiátrico Metropolitano (Travessa João Prosdócimo, 139, bairro Alto da XV, Curitiba). Hospitais gerais também devem prestar atendimento de emergência.

3 Tratamento

Os Caps oferecem tratamento ambulatorial e outros tipos de assistência, como oficinas terapêuticas.

A Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad) anunciou ontem o lançamento de um edital que abrirá 6,1 mil leitos para o tratamento de dependentes químicos, especialmente o crack. Para especialistas, a medida não traz nada de inovador e somente replica políticas existentes. Ainda assim, mesmo com as vagas criadas o país não atingiria o nível de qualidade exigido pelo próprio Ministério da Saúde, que recomenda a existência de 0,45 leito para cada mil habitantes. Hoje há 39,5 mil leitos (44 mil com o anunciado ontem), metade do ideal, 86 mil.Outro agravante é que as 6,1 mil vagas não são destinadas exclusivamente a leitos psiquiátricos e sim divididas entre comunidades terapêuticas, Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (Caps AD) e Casas de Acolhimento Transitório. Apenas 2,5 mil ficarão com os hospitais gerais. O Ministério da Saúde, por exemplo, não reconhece as comunidades terapêuticas como integrantes da rede de saúde mental.

No anúncio da Senad estão previstos 600 leitos em 50 Caps AD, que não fazem internamentos quando necessário. Se um usuário precisa de internamento, ele precisa recorrer às esparsas vagas restantes em hospitais psiquiátricos ou hospitais gerais. Mas, frequentemente, nem todos os profissionais da saúde em hospitais gerais estão aptos a lidar com o dependente químico, principalmente o usuário de crack. Outras 2,5 mil vagas serão destinadas a comunidades terapêuticas.

Para cada equipamento serão abertos editais em que os municípios poderão concorrer. Serão levados em conta critérios como a população e a infraestrutra da rede de atendimento. O investimento total será de R$ 133 milhões e o objetivo é de que ainda neste ano a verba seja paga às prefeituras.

Para a coordenadora de Saúde Mental da Secretaria de Saúde de Curitiba, Cristiane Venetikides, o anúncio do edital para as 6 mil vagas não traz nenhuma nova tecnologia para a questão da saúde mental e tratamento da drogadição. Ela afirma que hoje o maior problema é a adesão do usuário de crack aos tratamentos existentes. "Não há uma resposta padrão. Para alguns a hospitalização é positiva e para outros os Caps funcionam."

Hoje há no Paraná 3,2 mil leitos, sendo 445 em Curitiba. Outra questão apontada por Cristiane é que o financiamento de muitas políticas criadas pelo Ministério da Saúde fica a cargo dos municípios.

O secretário de estado da saúde do Paraná, Carlos Moreira Junior, afirma que o auxílio aos municípios é importante, mas reconhece que o número anunciado ainda é tímido. Para o próximo ano o estado irá investir R$ 15 milhões na criação de Núcleos de Apoio à Saúde da Família, consórcios intermunicipais para co-financiamento e parceria com comunidades terapêuticas.

Divergência

O médico psiquiatra e presidente da Sociedade Paranaense de Psiquiatria, Marco Antônio Bessa, diz que o Plano de En­­frentamento ao Crack do Minis­tério da Saúde é um "faz-de-conta" e que os pouco mais de 6 mil leitos propostos não atenderiam nem os usuários de São Paulo. Ele lembra que o número de usuários da droga é desconhecido no país e que é absurdo definir políticas de atendimento sem o conhecimento adequado sobre a situação desses usuários.

O médico psiquiatra Dagoberto Requião também afirma que o uso de leitos em hospitais gerais não é indicado. "O atendimento ao usuário de crack deve ser diferenciado. Fico preocupado como será a operacionalização disso. Se não houver pessoal treinado para orientar as equipes dos Caps, por exemplo, será mais uma passagem do que intervenção."

Para a psiquiatra integrante da As­­­so­­­ciação Brasileira de Psi­quiatria, Ana Cecília Marques, os leitos hospitais gerais deveriam estar em uma ala separada, o que não ocorre hoje. "A síndrome de abstinência precisa de ambiente calmo, com todos os recursos e profissionais treinados." Já a integrante do Conselho Federal de Psico­logia, Jureuda Guerra, é contrária ao investimento em comunidades terapêuticas. "Muitas não têm propostas e falta qualificação na área da saúde", considera.

Colaborou Fabiane Ziolla Menezes

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