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| Foto: Robson Vilalba/Gazeta do Povo

A pressão dos preços dos imóveis nas grandes cidades brasileiras espraiou seus moradores para regiões periféricas longe dos polos concentradores de renda e trabalho. A solução para contornar essa dinâmica, dizem especialistas, passa por um transporte coletivo eficiente. Mas os projetos para priorizá-lo que ficaram negligenciados durante as duas últimas décadas agora correm o risco de ficar apenas nas pranchetas de urbanistas por conta da falta de verbas.

Até 1990, a função de estabelecer a política nacional do Transporte Urbano era da Empresa Brasileira dos Transportes Urbanos (EBTU) e da Empresa Brasileira de Planejamento de Transportes (GEIPOT). A decisão do então presidente Fernando Collor de Melo de extinguir essas estatais acabou deixando um vácuo na formulação de políticas públicas para o setor até 2003, quando foi criado o Ministério das Cidades.

Foi somente a partir de 2009, entretanto, que os recursos para infraestrutura voltada ao transporte coletivo ficaram mais abundantes. Mas a partir daí os municípios esbarraram em um novo obstáculo: falta de capacidade técnica para apresentar os projetos.

“Essa descontinuidade explica um pouco sobrea baixa qualidade de parte dos projetos técnicos apresentados nos últimos anos”, explica Otávio Cunha, presidente da Associação Nacional das Empresas de Transporte Urbano (NTU). Mas o problema não é só esse. Faltam recursos também. A gestão do presidente Michel Temer sustenta que as gestões passadas assumiram compromissos além da capacidade orçamentária.

Dados compilados pela NTU mostram que de uma lista de 464 projetos de priorização para ônibus financiados pelos três Programas de Aceleração do Crescimento (PAC), 235 sequer saíram do papel. “Estamos enfrentando grandes desafios. Em todas as áreas de mobilidade, somando todos os contratos que foram firmados com prefeitos e governadores, o volume de contratos assinados prometidos à sociedade equivale a 71 anos orçamento da área”, afirmou o ministro durante o Seminário Nacional NTU 2016.

Perspectivas

Nem tudo, porém, pode ser jogado foram. Após quase 20 anos sem grandes investimentos, o PAC conseguiu colocar em operação 166 projetos de priorização ao transporte coletivo e outros 62 estão em obras. É sobre esses, inclusive, que o Ministério das Cidades agora deverá se debruçar.

“Estamos analisando toda a carteira de investimentos em mobilidade urbana. Serão priorizados empreendimentos em que estados e municípios já firmaram termo de compromisso com a União e desenvolveram os projetos das obras. A prioridade é terminar as obras já iniciadas”, disse a pasta em nota, onde também destacou que a “limitada capacidade institucional dos governos locais e a complexa legislação brasileira para contratação de obras por parte do poder público” também são entraves para a retomada desses projetos.

O que breca o Brasil

Veja as causas e os desdobramentos de ações de mobilidade que não foram concluídas no tempo previsto, estão sendo inauguradas incompletas ou sequer saíram do papel

MOBI (BRT) São José dos Campos – Disputa política

Era para ser um VLT de 15 quilômetros. Virou um BRT quatro vezes mais extenso. Pelo mesmo preço: R$ 800 milhões. O novo projeto foi anunciado em 2013. Os concorrentes pré-qualificados seriam conhecidos mês passado, mas o Tribunal de Contas suspendeu a licitação. Agora, o Ministério Público investiga supostas irregularidades no projeto após denuncias apresentadas pela oposição ao prefeito, a mesma que antes queria o VLT. A prefeitura afirma que, além de mais extenso, o projeto do BRT trará uma tarifa menor à população e que agora ela está reexaminando o edital para lançá-lo novamente. Não há novo prazo para conclusão da obra

VLT Cuiabá – Preço super (sub) estimado

Prometido para a Copa do Mundo, essa obra viveu caminho inverso ao de São José dos Campos. Originalmente, seria um BRT ao custo de cerca de R$ 500 milhões. Mas a escolha foi pelo Veículo Leve Sobre Trilhos, ao preço de R$ 1,447 bilhão – R$ 1,066 já foi pago ao consórcio responsável pela obra. Após denúncias de irregularidades, a obra foi paralisada. Envolvido em denúncias de fraude fiscal (não necessariamente sobre o VLT), o ex-governador Silval Barbosa (PMDB) está preso. A nova gestão contratou um estudo para ver quanto gastaria a mais no projeto e chegou a conclusão que precisa desembolsar R$ 602 milhões. Como o consórcio quer mais R$ 1,2 bilhão, o caso foi para na Justiça, onde está tramitando há mais de um ano. Os bondes e sete quilômetros de trilhos já estão em Cuiabá. Mas não há novo prazo para conclusão do projeto

BRT Palmas – Judicialização da licitação

Com mais de 227 milhões já garantidos, o Bus Rapid Transit de Palmas é considerado fundamental para o adensamento dos vazios urbanos da capital do Tocantins. A licitação já teve seu vencedor conhecido, mas uma liminar judicial obtida pelo Ministério Público Federal em outubro de 2015 paralisou o processo às vésperas do início da obra. A prefeitura informou que vai apresentar seu recurso de apelação ao Tribunal Regional Federal comprovando que a cidade merece os recursos para o projeto. O MPF sustenta que o município teria superestimado a demanda do projeto. Não há novo prazo para conclusão da obra.

BRT Porto Alegre – falhas técnicas

Também prometido para a Copa, o BRT de Porto Alegre já teve dois lotes de corredores pavimentados e tem um terceiro com 60% da pavimentação já concluída. Por eles, já trafegam algumas linhas. Mas não há prazo para que o BRT, de fato, comece a operar. Isso porque a prefeitura ainda não licitou os terminais e pontos de parada, o que a impede de estabelecer qualquer prognóstico. Além disso, a imprensa local publicou notícias de que o piso implantado (asfalto) está sofrendo com fissuras antes mesmo da chegada dos biarticulados mais pesados, o que estaria obrigando as construtoras a refazer as obras implantando concreto nessas vias.

Metrô Curitiba – Falta de dinheiro

Após mais de dez anos de estudo, o metrô de Curitiba chegou próximo de ser licitado. Mas em agosto de 2014, na antevéspera da abertura dos envelopes dos concorrentes, o Tribunal de Contas do Estado suspendeu a concorrência para que a prefeitura refizesse trechos do edital. Os ajustes foram realizados, mas seis meses depois, com a inflação nas alturas, o município passou a questionar quem iria arcar com os custos da correção. Orçado em pouco mais de R$ 4,6 bilhões à época, agora o projeto já supera os R$ 5,5 bilhões. A União havia reservado R$ 2,1 bilhões para a obra e diz que não tem condições de garantir novos aportes. Sem dinheiro, esse projeto agora corre o risco de ficar definitivamente para a história.

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