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Prefeito de Sorocaba denuncia compra de livros infantis com linguagem imprópria
Gestor questiona linguagem imprópria no livro “No meu corpo mando eu”, direcionado a crianças de 7 anos| Foto: Reprodução

Em vídeo publicado no dia 16 de janeiro, o prefeito de Sorocaba (SP), Rodrigo Manga (Republicanos), denunciou a compra de aproximadamente 1.500 exemplares do livro infantil chamado “No meu corpo mando eu”, direcionado a crianças entre 7 e 10 anos, por parte da gestão anterior, da ex-prefeita Jaqueline Coutinho (PSL).

De acordo com o prefeito, que assumiu o mandato neste ano, o livro a ser distribuído para as escolas da rede municipal possui linguagem sexualizada, considerada imprópria para a faixa etária ao qual é destinado. Os exemplares estavam armazenados na Arena Multiuso do município, com cerca de um milhão de exemplares de outros livros paradidáticos que foram adquiridos pela Secretaria de Educação a custo de R$ 29 milhões apenas 15 dias antes do encerramento do mandato da gestão anterior, segundo o atual chefe do Executivo municipal.

Uma publicação no site oficial da prefeitura de Sorocaba informa que, além da linguagem sexual, os exemplares exprimem também imagens com crianças do mesmo sexo em momentos afetivos. “São textos que incentivam a prática de relações sexuais, fazem apologia à homossexualidade e nós entendemos que isso não deve ser disseminado aos nossos estudantes. Eu não tenho nada contra a orientação sexual de ninguém, mas não vamos aceitar a distribuição desses livros com conteúdo impróprio para a faixa etária das nossas crianças”, declarou o prefeito.

Manga também disse que o exagerado gasto de recursos públicos com os livros poderia ser melhor aproveitado em outros investimentos na educação e criticou a falta de critério na aquisição das obras. “Com esse valor, de mais de R$ 29 milhões, gastos sem critério com os exemplares, nós poderíamos reformar, fazer manutenção e construir novas creches, sanando a fila de vagas das crianças por muitos anos”.

Linguagem sexualizada e imprópria ao público infantil

De acordo com a editora Cuore, responsável pela publicação do livro “No meu corpo mando eu”, a obra “aborda fases do desenvolvimento infantil, descreve o corpo humano em forma de versos e ensina à criança a importância do seu corpo e como deve ser cuidado e preservado dos adultos mal-intencionados”. No título existem, de fato, menções à prevenção ao abuso sexual infantil e, ao abordar atos sexuais, são apresentadas ressalvas, como “... quando meu corpo crescer”, “...quanto tiver mais idade” e “... quando meu corpo crescer”.

Há, entretanto, trechos que fazem alusão clara ao ato sexual, o que pode ser interpretado como inadequado para o público ao qual o livro é direcionado:

“Vou querer transar um dia porque é coisa bem gostosa. Vou querer amar um dia numa nuvem cor-de-rosa. Alguns dizem que o sabor é que nem de chocolate. Vou querer transar um dia pra provar deste calor (...). Não é só para ter filhos pois tem gente que não quer. É por causa do prazer, pra provar da intimidade”. Trechos com linguagem sexualizada – como “Um pênis tenho por fora, e de bolas tenho um par” também são encontrados no livro.

A obra, de 39 páginas, é de autoria do sociólogo e psicólogo educacional, Antonio Carlos Egypto. Ele é membro fundador do Grupo de Trabalho e Pesquisa em Orientação Sexual (GTPOS) e também é autor dos livros "Orientação Sexual na Escola: um Projeto Apaixonante" e "Sexualidade e Transgressão no Cinema de Pedro Almodóvar". Na descrição desse último, a editora cita que “A obra considera a importância e a representatividade do trabalho autoral do cineasta na contemporaneidade, enfatizando a compreensão e aceitação da diversidade sexual e humana, e o tratamento avesso a qualquer tipo de moralismo dado a seus personagens e tramas. O livro procura demonstrar a coerência da ideia de sexualidade como libertação”.

Livro, de 2013, contou com apenas uma edição

De acordo com Carlos Marques, proprietário da Editora Cuore, o título, lançado em 2013, contou com apenas uma edição e, com a venda para o município de Sorocaba, esgotaram-se os exemplares disponíveis na editora. Ele conta que a venda foi intermediada pela empresa vencedora de uma licitação do município.

“Esse livro tem um selo que informa que é direcionado para professores. O professor tem que ler, entender e ver se ele concorda com aquilo e se pode abordar na sala. Tem gente que acha que não deve tratar isso para criança. Cada um sabe de que forma tratar. Agora, o assunto do abuso sexual existe. Lógico que é inadequado para alunos de 7 anos, mas não é para alunos de 7 anos”, afirmou Marques em entrevista à Gazeta do Povo.

Na introdução da obra, entretanto, o autor destaca que “é dirigido a crianças alfabetizadas, na faixa de 7 a 10 anos de idade”. Ainda na introdução, o autor cita que o objetivo do livro é abordar a questão do abuso sexual e que, para isso, é preciso abordar o corpo e a sexualidade.

“Mas, para se prevenir dos riscos de abuso e da violência sexuais (sic), é preciso mais: é preciso falar de desejo, de prazer e dos seus limites. É preciso falar de sexo. (...) Sempre achamos que é cedo para falar de certas coisas, esquecendo que a ignorância não protege as pessoas, muito ao contrário, as torna vulneráveis. Sem falar claro e com informações corretas, não é possível qualquer tipo de prevenção eficaz”.

Ex-prefeita reconhece linguagem imprópria, mas afirma que livro tem caráter educador contra abuso infantil

Em entrevista a uma rádio local de Sorocaba na terça-feira (19), a ex-prefeita Jaqueline Coutinho (PSL) afirmou que a destinação de R$ 29 milhões para a compra de cerca de um milhão de livros didáticos fez parte de um projeto da Secretaria Municipal de Educação com o objetivo de ter uma biblioteca em cada sala de aula. Ela disse também que o investimento na aquisição dos livros teve a ver com imposição constitucional de orçamento.

“Nós temos a obrigação constitucional de gastar 25% na educação e, no ano passado, não foi um ano em que tivemos facilidade para gastar os 25%. Não só Sorocaba como todos os outros municípios do Brasil. Como não tivemos aulas, tivemos merenda interrompida, transporte de alunos e aulas interrompidas, de fato tínhamos que efetuar gastos para cumprir essa determinação constitucional e teria que ser pago no ano de 2020 dentro do orçamento de 2020. Então, tendo esse projeto já existente de uma biblioteca em sala de aula, a Secretaria de Educação deliberou utilizar esse montante obrigatório adquirindo livros paradidáticos”, disse a ex-chefe do Executivo municipal.

Especificamente quanto ao livro “No meu corpo mando eu”, ela afirmou que não teve acesso prévio ao conteúdo do título antes da compra, mas que a aquisição passou “pelo crivo da equipe técnica que escolheu dentro de um rol de livros autorizados pelo FDE [Fundação de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo]”. Quanto ao conteúdo, ela afirmou:

“Li essas duas páginas que foram mostradas nesse vídeo [do atual prefeito, Rodrigo Mangale] e, de fato, eu, como mãe e como cidadã, eu digo: essas duas páginas, embora lúdicas, elas descrevem de uma forma, digamos assim, romantizada, a questão de relação sexual, do corpo, dos órgãos sexuais. Porém, o livro em si existe dentro de um contexto. Ele seria, acredito eu, explicado em sala de aula. Das 39 páginas, duas tem esse conteúdo, todas as demais tratam de abuso sexual”.

Prefeitura de Sorocaba busca impedir a distribuição dos livros

Segundo a prefeitura de Sorocaba, a Corregedoria-Geral do Município (CGM) entendeu que, na aquisição dos livros paradidáticos, “houve claros indícios de desrespeito ao princípio de eficiência, além de desperdício de recursos públicos e a ausência de um devido planejamento pedagógico”. O corregedor-geral do município, Carlos Rocco Junior, declarou, em uma publicação no site da prefeitura, que “uma investigação deverá apurar as responsabilidades, podendo apontar para a prática de improbidade administrativa e de conduta funcional pelos agentes públicos que, na época, atuavam na gestão municipal”.

Na manhã desta quarta-feira (20), o vereador municipal Vinícius Aith (PRTB) protocolou uma denúncia no Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP) sobre o valor gasto nos livros paradidáticos.

Em vídeo publicado pelo prefeito Rodrigo Manga, ele declarou que o livro “No meu corpo mandou eu” não chegaria às salas de aula.

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