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Antonina Greciuk, de 94 anos, mora em um asilo desde os 67: “eles acham que eu não existo mais”, fala sobre os parentes que não a visitam | Gisele Barão/Gazeta do Povo
Antonina Greciuk, de 94 anos, mora em um asilo desde os 67: “eles acham que eu não existo mais”, fala sobre os parentes que não a visitam| Foto: Gisele Barão/Gazeta do Povo

Antonina Greciuk quer uma geladeira de presente de Natal. “Mas um sapato igual a este também seria bom”, conta, indicando a sandália de borracha cor-de-rosa nos pés. Ela é uma entre os 106 idosos que vivem no Asilo São Vicente de Paulo, em Ponta Grossa. Ela vive sozinha em um dos quartos. Tem 94 anos e chegou ao São Vicente com 67, após sair da casa da irmã. Antonina é uma entre as centenas de idosos que vivem em instituições de longa permanência e não recebem visitas na cidade.

Para ela, assim como tantos outros idosos, as festas de fim de ano não serão em família. “Eu não sinto falta. Tenho muitas amizades aqui. Chamo a assistente social de mãe, o motorista de irmão”, conta Antonina, a moradora mais antiga do São Vicente. A maior parte deles está há anos sem contato com parentes, por uma série de razões. Preocupada com isso, a direção dessas casas estimula visitas da comunidade, seja por organizações não-governamentais, grupos religiosos ou escolas.

O São Vicente tem uma agenda para visitas ao longo do ano. Projetos sociais de escolas, igrejas, empresas e ONGs têm colaborado para reduzir o impacto da falta de familiares no local. São 106 idosos sob seus cuidados – 63 mulheres e 43 homens, e apenas 20% recebe familiares com frequência. No fim de ano, o São Vicente promove a campanha Adote um Idoso, para garantir alguns presentes de Natal, e alguns grupos se reúnem para atender aos pedidos.

“Eles acham que eu não existo mais”

Eles chegaram à instituição de diferentes maneiras – levados pela família há muitos anos, por vontade própria ou, mais recentemente, encaminhados pelo departamento de assistência social da prefeitura. Há ainda um grupo de idosos que chegou nos primeiros anos de fundação da casa – no início, o São Vicente funcionava como uma instituição que recebia também crianças, moradores de rua e pessoas com deficiência. Alguns deles, nunca procurados pela família, estão lá até hoje.

Antonina é solteira, não teve filhos e seus irmãos já morreram, mas ela conta que tem parentes pela região. Ao ser questionada sobre a ausência deles, resume: “eles acham que eu não existo mais”. Ao contrário de vários de seus colegas, ela não se envolve com os grupos que promovem atividades no local, como dança, música, bingo e lanches. Sua rotina é cuidar do quarto, conversar e cuidar do jardim da instituição.

Nos finais do ano, a procura de voluntários pelo São Vicente aumenta, segundo a assistente social Fernanda de Almeida da Silva. Em 2016, o movimento triplicou. “Muita gente está se mobilizando não só para trazer presentes, mas coisas de que precisamos, como fralda e comida”, explica. Segundo ela, entre os idosos que chegaram mais recentemente, há situações de abandono, e outros que perderam o contato com familiares por questões de violência doméstica ou alcoolismo. A maioria é encaminhada pelos Centros de Referência de Assistência Social (CRAS), por situação de risco. “Mais da metade não tem família”, diz Fernanda.

ILPI

Ponta Grossa tem quatro Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPIs) filantrópicas, conhecidas como “asilos” – um termo pejorativo que os profissionais da assistência social ainda lutam para abolir. Além da São Vicente e da Colmeia, há na cidade a Casa do Idoso Paulo de Tarso, onde vivem 30 homens, e o Lar das Vovozinhas Balbina Branco, com 40 mulheres – onde as visitas também não chegam a metade dos moradores.

Equilíbrio nas visitas de ‘estranhos’

A Colmeia Espírita Cristã Abegail, no bairro Uvaranas, abriga 30 mulheres. Metade delas, segundo o presidente da casa, Luiz Carlos Pedroso, não recebe nenhuma visita. Em alguns casos, a direção sequer conseguiu localizar os parentes para tentar algum contato. “As mais antigas foram trazidas pela família, ou estavam na rua e nós trouxemos”, conta Pedroso.

A Colmeia sobrevive com repasses da gestão municipal – atrasados deste outubro – e doações. Mais afastada do centro da cidade, a casa também estimula visitas da comunidade e colaborações com produtos para manter o local. “Essas visitas compensam um pouco a falta da família. Alguns estão acostumados e têm afinidade com os visitantes”, explica.

A dona Cleri Nunes, de 63 anos, que vive na Colmeia e tem quatro filhos, diz que recebe visitas em quase todos os domingos. “Tenho muitas amigas aqui também, e gosto muito”, diz. Para Roberto Nogueira da Silva, de 72 anos, que vive no São Vicente, as amizades e as visitas do irmão também valem a pena. “Eles são bons companheiros”, conta.

Solidão e abandono

O assistente social , integrante do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa Idosa em Ponta Grossa e da Associação de Amigos da Pessoa Idosa, Adrianis Galdino da Silva Júnior, explica que o baixo índice de visitas tem duas causas principais. De um lado, o fato de a família dos idosos já ter falecido, por exemplo. De outro, está a falta de interesse em procurá-los, pelo rompimento de vínculos afetivos. “Alguns não recebem visitas porque os familiares são negligentes. Assim, a sociedade civil acaba visitando mais”, diz.

De acordo com ele, a solidão e a falta da presença familiar têm consequências para a saúde psicológica dos idosos. “Independente de ter sido ou não um bom pai, uma boa mãe, é horrível pensar que foi abandonado, o que causa melancolia, depressão, e principalmente o sentimento de rejeição. E há a expectativa. Muitos idosos dizem a todo tempo ‘Eles vão vir, neste fim de ano eles vão vir’. Eles criam uma expectativa como uma defesa emocional para lidar com a solidão e abandono”.

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