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Coveiros trabalham com roupas de proteção contra o coronavírus em Belo Horizonte (MG).| Foto: Adão de Souza/PBH

Uma portaria conjunta do Ministério da Saúde em parceria com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) criou regras para facilitar o registro de óbito em casos de Covid-19 e, assim, evitar dificuldades para o sepultamento. O documento suscitou algumas dúvidas sobre possíveis brechas que podem ser abertas para registros feitos de forma indevida.

Uma das dúvidas, por exemplo, é se o registro de morte por coronavírus, que foi facilitado para casos com simples suspeita da doença, não pode acabar se tornando mais frequente por conveniência para os serviços funerários e de saúde.

Outra questão é em relação aos seguros de vida. Alguns seguros não cobrem mortes causadas por catástrofe. Como esse é o caso das mortes por coronavírus, a facilidade de registrar a Covid-19 como causa de uma morte não acabaria favorecendo seguradoras que quisessem se aproveitar dessa brecha?

O que diz a portaria sobre sepultamentos

A portaria autoriza postos de saúde e hospitais a encaminhar corpos para sepultamento ou cremação caso familiares ou pessoas conhecidas da pessoa morta não se apresentem.

Orienta que os prontuários de atendimento em casos de internação hospitalar no período da pandemia sejam feitos “com especial cuidado” na identificação do paciente, justamente para evitar a possibilidade de sepultamentos sem identificação.

Caso não tenham documentação e não consigam identificar a pessoa, os serviços de saúde devem anotar na declaração de óbito “a estatura ou medida do corpo, cor da pele, sinais aparentes, idade presumida, vestuário e qualquer outra indicação que possa auxiliar de futuro o seu reconhecimento”, além de fotografar o rosto e tirar a impressão digital da pessoa.

Os registros civis de óbitos por coronavírus devem ser feitos em até sessenta dias após a data da morte, e os serviços de saúde devem enviar por meio eletrônico as declarações de óbito e outros para as Corregedorias-Gerais de Justiça.

Ainda segundo a portaria, em casos de mortes por doença respiratória em que a Covid-19 seja causa suspeita, mas não confirmada, as declarações de óbito devem descrever a causa mortis como “provável para Covid-19” ou “suspeito para Covid-19”.

Procedimento para Covid-19 tem algumas novidades, mas já estava previsto em lei

A advogada Mérces Nunes, doutora em Direito pela PUC-SP e especialista em Direito Médico, afirma que o procedimento a ser observado em caso de morte de pessoa desconhecida que não recebeu atendimento médico já estava previsto na lei de registros públicos n.º 6.015/73, que determina que o registro de óbito nesses casos tenha o maior número possível de informações para identificação futura.

Segundo ela, o princípio “não foi alterado, em sua essência”. “Apenas não será realizada autópsia para determinação exata da causa da morte, em razão da emergência de saúde pública”, diz a advogada.

Já no caso de pessoas que tiveram acompanhamento médico, esse profissional é o responsável por avaliar a causa da morte e, com base nessa avaliação, emitir a declaração de óbito.

O teste para o coronavírus não é necessário para que a morte seja registrada com suspeita da doença. “O médico, a rigor, não precisa de exame complementar para atestar Covid-19 porque tem autonomia para atestar a doença sem o exame”, explica Mérces.

Em todos os casos, o único profissional com autoridade para emitir atestados de óbito é o médico. Não há uma fiscalização posterior das emissões de atestado. A última palavra sobre a causa mortis é a do médico que realiza o registro, e a confiabilidade dos atestados depende totalmente desses profissionais.

Pandemia não tem sido aceita como pretexto para não pagar o seguro

Desde que a crise do coronavírus começou, algumas seguradoras passaram a seguir uma cláusula que trata a pandemia como catástrofe como pretexto para não pagar o seguro.

Os seguros são serviços que cobrem, por essência, riscos previsíveis. Pandemias e outras catástrofes podem ser excluídas das apólices por serem consideradas circunstâncias imprevisíveis.

A portaria conjunta do Ministério da Saúde e do CNJ suscitou, por isso, uma nova preocupação: a facilidade de registro do coronavírus como causa mortis não poderia prejudicar os beneficiários de mortos pela doença, tirando deles os benefícios em casos, por exemplo, de mera suspeita da Covid-19?

Essa é uma possibilidade que, segundo Mérces Nunes, não deverá se concretizar. A tentativa de usar a pandemia como pretexto para não pagar o seguro de mortos pela Covid-19 não tem tido êxito.

“O Judiciário tem mandado pagar o prêmio do seguro, ou porque não há cláusula específica, ou com base na falta de informação direta e específica do consumidor em caso de pandemia”, diz a advogada.

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