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STF reconheceu a repercussão geral de recurso sobre a presença de símbolos religiosos em órgãos públicos.
STF reconheceu a repercussão geral de recurso sobre a presença de símbolos religiosos em órgãos públicos.| Foto: Divulgação/STF

No fim de abril, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceram unanimemente, em plenário virtual, a repercussão geral de um recurso extraordinário sobre a presença de símbolos religiosos em prédios públicos.

Com isso, o tema pode ser julgado a qualquer momento pelo tribunal, assim que for pautado pelo presidente do STF, Dias Toffoli. A decisão tomada passará a valer para todos os órgãos públicos brasileiros.

Os ministros vão definir se a presença de símbolos religiosos em prédios públicos fere o princípio constitucional do Estado laico. No próprio plenário do STF, há um crucifixo com a imagem de Jesus Cristo na parede. Se os ministros se manifestarem favoráveis ao recurso extraordinário em questão, esse e outros símbolos religiosos precisarão ser removidos de prédios públicos brasileiros.

Ainda não há previsão de quando o julgamento definitivo do recurso entrará na pauta do STF. Para os especialistas entrevistados pela Gazeta do Povo, a tendência é que os ministros se manifestem contrários à retirada dos símbolos.

O que os ministros já decidiram?

A decisão tomada no final de abril foi apenas um reconhecimento de que julgar esse tema é constitucional. O que estava em julgamento era o Agravo em Recurso Extraordinário (ARE) 1249095, que, segundo o advogado Acácio Miranda, especialista em Direito Constitucional, é “um recurso dentro de um recurso”, interposto a um recurso extraordinário.

O recurso extraordinário em questão é de uma ação ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF) em julho de 2009, pedindo que sejam retirados todos os símbolos religiosos de locais de ampla visibilidade e de atendimento ao público nos prédios da União e no estado de São Paulo.

O MPF pedia a aplicação de multa diária simbólica no valor de R$ 1 e determinava um prazo para a retirada dos símbolos religiosos de até 120 dias depois da decisão. O órgão alegava que a presença dos símbolos “é prejudicial à noção de identidade e ao sentimento de pertencimento nacional aos cidadãos que não professam a religião a que pertencem os símbolos expostos”.

Essa ação foi julgada improcedente na primeira instância pela Justiça Federal em São Paulo. Em 2013, o MPF recorreu ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), em São Paulo, e também foi derrotado, por uma decisão de 2018. Em abril de 2019, o MPF recorreu ao STF e pediu que o recurso fosse admitido com repercussão geral, o que ocorreu um ano depois.

O que argumentam os autores do recurso contra os símbolos religiosos?

Na visão do MPF, o Brasil é um Estado laico e, por isso, os órgãos públicos não podem manifestar preferência por uma religião. O MPF usa o artigo 5º da Constituição Federal para dizer que os cidadãos são livres para professar ou não uma religião.

A presença de símbolos religiosos, segundo o órgão, ofenderia essa liberdade de crença. De acordo com a ação, apesar de o Brasil ser majoritariamente cristão, não pode haver vinculação entre o poder público e determinada religião.

A administração pública precisa atender aos princípios da impessoalidade, da moralidade e da imparcialidade e, segundo o MPF, o uso de símbolos religiosos feriria esses princípios ao demonstrar predisposição para determinada fé.

Acácio Miranda ressalta que a ideia do Estado laico está na base da argumentação de ambos os lados. Segundo ele, “a justificativa de quem interpôs é de que o Estado é laico e, em virtude da laicidade, não devem constar imagens religiosas em lugares públicos”, mas a justificativa do lado oposto é de que “quando nós falamos que o Estado é laico, nós não estamos impedindo as pessoas de professarem a sua fé. Estamos falando que cada qual pode professar sua fé em virtude da laicidade”.

Felipe Bayma, especialista em Direito na área de tribunais superiores, destaca que, já há algum tempo, os tribunais têm defendido que os crucifixos e outros símbolos religiosos presentes em órgãos públicos podem ser entendidos como adereços ou obras de arte e não explicitam um viés ou preferência do Estado por certa religião.

”Estado laico não significa Estado laicista”, diz especialista

Antonio Jorge Pereira, doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (USP), diz que a ideia de retirar símbolos religiosos em respeito ao Estado laico é um equívoco, porque “Estado laico não significa Estado laicista”.

“O Estado laico tem a separação entre Igreja e Estado, em razão do que o Estado não vai favorecer, especificamente, um credo em detrimento de outros. Mas isso não significa que o Estado não possa, até pela tolerância religiosa, dar uma série de incentivos eventuais para diversos credos que possam existir na comunidade. Ou seja, o Estado é laico, mas o povo não precisa ser”, explica.

De acordo com Pereira, a mera presença de símbolos da tradição cristã não pode ser considerada pelo Estado uma ofensa ou um constrangimento a pessoas que professam outras religiões ou que não têm religião. “Se o povo tem identidade cristã de modo histórico, vinculada à sua própria expressão cultural, não há nenhum tipo de constrangimento ao Estado laico em razão de se colocar, em alguns espaços públicos, um crucifixo, por exemplo”, diz Pereira.

Para ele, o tema costuma vir à tona por questão ideológica. “As pessoas, às vezes, querem atacar um símbolo religioso em nome da ‘liberdade de credo’, mas, na verdade, estão agindo com intolerância religiosa para tentar ferir dada expressão da religiosidade popular que não lhes agrada”, diz. “Parece mais um tipo de agressão por intolerância religiosa do que realmente um interesse concreto por um Estado mais republicano.”

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