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Por que as universidades federais estão demorando tanto para voltar às aulas presenciais
Decisão judicial obriga UFRJ a retomar ensino presencial até 22 de novembro. Argumento foi o de que as aulas remotas possuem “péssima qualidade”| Foto: UFRJ/Divulgação

O medo de contaminação por Covid-19 e a pressão de sindicatos de professores e servidores estão entre os principais motivos para o atraso na retomada das aulas presenciais nas maiores instituições federais de ensino superior do país. Levantamento feito pela Gazeta do Povo mostra que dentre as 27 maiores universidades federais brasileiras – que juntas englobam aproximadamente 850 mil estudantes de graduação – 15 ainda não reiniciaram as aulas presencias. Nas outras, as atividades estão sendo retomadas aos poucos, em regime misto ou híbrido, mas ainda com prevalência das atividades remotas.

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Um dos argumentos usados pela comunidade acadêmica para justificar o atraso do reinício de atividades presenciais era a falta de vacinação contra Covid-19. Mas, além dos avanços nas taxas de vacinação - que hoje alcançam quase 60% da população adulta com ciclo completo -, a Advocacia-Geral da União (AGU) recentemente afirmou que a vacinação obrigatória não pode ser condicionante para o retorno das aulas presenciais.

Foi justamente uma universidade federal, a de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, que acionou a AGU. A instituição questionava se poderia adotar o chamado “passaporte da vacina” ou "passaporte sanitário" e com isso permitir apenas o retorno às atividades presenciais de servidores ou estudantes já vacinados.

A resposta da AGU foi clara: “não é possível às IFES [Instituições Federais de Ensino Superior] estabelecer a exigência de vacinação contra a Covid-19 como condicionante ao retorno das atividades presenciais”. Para a AGU, cabe às universidades apenas adotar as medidas sanitárias cabíveis e outras orientações das autoridades de saúde locais para implementar o retorno seguro das atividades presenciais.

Pressão

A pressão pela exigência de vacinação vem muitas vezes dos sindicatos de professores e servidores. Na Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), na Paraíba, por exemplo, o Conselho Universitário aprovou a retomada de algumas atividades presenciais desde janeiro de 2021, mas a decisão gerou protestos e ameaças de greve.

Só em outubro é que a universidade começou o processo de reabertura, com o retorno dos funcionários terceirizados ao serviço presencial. Ainda não há previsão de quando as aulas deixarão de ser apenas remotas ou quando os servidores públicos voltarão ao trabalho.

Segundo o reitor da instituição, Antônio Fernandes Filho, ainda serão feitos estudos e um plano de trabalho para o retorno dos docentes e servidores “de forma escalonada e segura para atividades administrativas de ensino, pesquisa e extensão”.

“Dá para entender a preocupação com a doença [Covid-19], mas o que os sindicatos fazem é absurdo. Não tem negociação, nem conversa. Professores que querem voltar a dar aulas são equiparados a bandidos, assassinos”, relata um professor de uma instituição federal atualmente sem aulas presenciais. Ele preferiu não se identificar com medo de represálias.

Atraso

A maioria das universidades federais está sem atividades presenciais desde março de 2020. A interrupção das aulas e a demora para adequação ao ensino remoto ocasionaram atraso nos calendários acadêmicos. Muitas universidades só começaram o primeiro semestre de 2021 nos meses de setembro ou outubro. Não se sabe ao certo até que ponto esses atrasos e a falta das aulas e atividades presenciais irá afetar a formação desses alunos, mas estudos internacionais já dão mostras de possíveis impactos.

Um relatório do Instituto Internacional da Unesco para a Educação Superior na América Latina e no Caribe (IESALC), feito no início do ano passado, tentou avaliar as consequências a médio e longo prazo da epidemia no ensino superior. A conclusão inicial foi a de que os estudantes foram forçados a entrar em uma dinâmica não planejada de aulas a distância e que aqueles que não tiverem acompanhamento individualizado – nem sempre possível de ser feito apenas com o sistema remoto de ensino – têm maior risco de se desvincular do ritmo acadêmico e de acabar desistindo.

Ainda assim, o Brasil está em boa posição quando comparado a outros países da América Latina. De acordo com monitoramento feito pela IESALC, apenas as universidades do México e do Uruguai estão totalmente abertas, com sistema presencial. Nos demais países, incluindo o Brasil, as universidades estão "parcialmente abertas", com adoção do sistema híbrido, e abertura do ensino presencial em algumas regiões.

Retorno era previsto para março

Em dezembro de 2020, quando houve uma queda expressiva no número de contaminados e de mortos por Covid-19 no Brasil, cresceu a expectativa em relação à retomada das atividades presenciais em geral, suspensas desde março do mesmo ano. Na mesma época, o Ministério da Educação publicou uma portaria sobre o retorno das aulas nas universidades federais com validade a partir de janeiro de 2021. Posteriormente, a data de retorno das atividades presenciais foi alterado para março de 2021.

No documento, era previsto que as instituições retomassem o sistema presencial, com a adoção de “recursos educacionais digitais, tecnologias de informação e comunicação” de forma complementar. O texto ainda previa que o sistema integralmente remoto de ensino poderia ser adotado caso as autoridades locais suspendessem as atividades letivas presenciais. E muitos municípios e estados, de fato, decretaram a suspensão das aulas – e de outras atividades presenciais –, o que obrigou as instituições a manterem apenas o regime remoto.

Retorno às aulas vai parar na Justiça

No Rio de Janeiro, as universidades e outras instituições federais de ensino do estado travam uma batalha contra uma decisão judicial, em caráter liminar, que determinou o retorno das atividades presenciais até o dia 22 de novembro. A decisão foi do desembargador federal Marcelo Pereira da Silva, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), que atendeu a uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal do Rio de Janeiro. Na ação, o MPF argumentou que o ensino online seria de “baixíssima qualidade, não acessível a todos os alunos, e não atende aos requisitos fixados pelo Conselho Nacional de Educação”.

Outro argumento usado foi o da melhora da situação sanitária, com o avanço na vacinação e índices de contaminação mais baixos. Ainda na ação, o MPF lembrou que outras atividades e serviços - como funcionamento de restaurantes e bares e a presença de público em torneios esportivos - já foram liberados pelas autoridades, o que evidenciaria um ambiente propício ao retorno seguro das aulas presenciais. As universidades fluminenses criticaram a decisão com o argumento de que feriria a autonomia universitária.

Por meio de nota, a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) disse que não há “condições necessárias – tanto do ponto de vista epidemiológico, quanto do ponto de vista material – para um retorno completo às aulas presenciais”, dentro do prazo estipulado pela Justiça. Apenas em 3 de novembro é que os servidores da instituição começaram a retornar às atividades presenciais. Mas o retorno só é autorizado servidores que já completaram o esquema vacinal contra Covid-19 com duas doses ou dose única há pelo menos 15 dias, contrariando o parecer da AGU. A universidade disse ainda que avalia se adotará ou não a obrigatoriedade da vacina também para os alunos, ponto que também fere o que recomenda a AGU.

Veja a seguir a situação de algumas das maiores universidades federais:

Universidade Federal de São Carlos (UFScar): Aprovou um plano de retomada das atividades presenciais em julho, mas por enquanto não oferece ensino presencial.

Universidade Federal de São Paulo (Unifesp): Apenas ensino remoto. Não tem previsão de retomada do ensino presencial.

Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG): Reinício das aulas presenciais em setembro, com número reduzido de alunos. Atividades remotas continuam.

Universidade Federal de Uberlândia (UFU): A partir de 29 de novembro, retoma aulas presenciais. Mas a definição da oferta das aulas em formato remoto, híbrido ou presencial será dos Colegiados dos cursos.

Universidade Federal de Viçosa (UFV): Prevê aulas presenciais a partir de janeiro de 2022.

Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ): Decisão judicial determinou retomada do ensino presencial até 22 de novembro. Universidade prevê retomar antes, no dia 16.

Universidade Federal Fluminense (UFF): Aulas continuam no sistema remoto. Servidores começaram a retomar trabalho presencial de forma gradativa a partir de outubro.

Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRJ): Decisão judicial determinou retomada do ensino presencial até 22 de novembro.

Universidade de Brasília (UnB): Abriu uma consulta sobre a retomada das aulas presenciais com a comunidade acadêmica. Por enquanto, aulas remotas permanecem.

Universidade Federal de Goiás (UFG): Iniciou sistema de ensino híbrido a partir de novembro.

Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT): Prevê atividades presenciais a partir de abril de 2022.

Universidade Federal da Bahia (UFBA): Alguns cursos adotam aulas práticas presenciais, mas o sistema oficial é o online. Ainda não foi definido um prazo para retorno das aulas presenciais.

Universidade Federal da Paraíba (UFPB): Deve ter ensino presencial apenas em 2022.

Universidade Federal de Campina Grande (UFCG): Aprovou a adoção do modelo híbrido desde o início de 2021, mas aulas continuaram remotas. Sem previsão de retomada do ensino presencial.

Universidade Federal de Alagoas (UFAL): Adota o formato híbrido desde setembro de 2021, mas a maioria das aulas permanece no formato remoto.

Universidade Federal de Pernambuco (UFPE): Adota o sistema híbrido desde setembro de 2021.

Universidade Federal de Sergipe (UFS): Retomou as atividades presenciais a partir de outubro.

Universidade Federal do Ceará (UFC): Prevê atividades presenciais só em 2022.

Universidade Federal do Maranhão (UFM): Adota o sistema híbrido desde setembro.

Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN): Atividades presenciais devem voltar gradativamente a partir de 2022.

Universidade Federal do Amazonas (UFAM): Também só prevê atividades presenciais em 2022.

Universidade Federal do Pará (UFPA): Aprovou retorno das atividades presenciais a partir de setembro. Mantém o regime híbrido, mas prevê aumento gradativo do ensino presencial.

Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRS): Ensino remoto previsto até 30 de novembro, podendo ser prorrogado.

Universidade Federal de Pelotas (UFPel): Começou a retomar atividades práticas presenciais gradualmente em outubro.

Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC): Permite atividades presenciais “com impacto na Covid-19 ou essenciais”, desde que previamente aprovadas pela administração.

Universidade Federal do Paraná (UFPR): Iniciou ano letivo de 2021 em setembro, com atividades híbridas, remotas e presenciais. Cada colegiado tem autonomia para definir o sistema a ser adotado.

Universidade Federal Tecnológica do Paraná (UTFPR): Trabalha com formato híbrido desde setembro, mas a maioria das aulas ainda é remota.

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