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Confira reportagem em vídeo sobre o naufrágio do Bateau Mouche

Foi numa noite de Ano Novo que o barco Bateau Mouche naufragou, tirando a vida de 55 pessoas. Elas só queriam ver, do mar, os fogos em Copacabana, na Zona Sul do Rio. Vinte anos depois, a Justiça ainda examina processos movidos pelas famílias de vítimas. Enquanto advogados tentam explicar o porquê de tanta lentidão, o fato é que ninguém está preso até hoje.

"Até ela perdeu a identidade. Ela não é mais a atriz que ganhou três Molière, ela não é mais a atriz que fez, sei lá, 28 novelas. Não é atriz que fez 50 peças, não é uma das atrizes mais laureadas - não é mais. É a atriz que morreu no Bateau Mouche. Quem é Yara Amaral? É a atriz que morreu no Bateau Mouche," fala Bernardo Amaral Goulart, filho da atriz.

"Perdi o chão. Então nesse fato cresce dentro de você uma força que você não sabe explicar de onde vem pra poder lutar em prol do que você perdeu, tentar reconquistar o que você havia perdido. Nem que seja uma parte disso", desabafa.

Barco de passeio

O Bateau era um barco de turismo sem condições técnicas de navegar em alto-mar, e que ainda por cima estava superlotado. Afundou quando tentava se aproximar da Praia de Copacabana.

Foram processados na esfera criminal sete sócios e dois gerentes das empresas promotoras do passeio. No primeiro julgamento, em 1990, todos foram inocentados. Um dos argumentos da defesa: ninguém da empresa sabia dos riscos oferecidos pelo barco, já que o Bateau Mouche havia sido liberado pela capitania dos portos.

"Os dois são gerentes das empresas, eles não tinham conhecimento técnico", explicou George Tavares, advogado dos réus.

Começava então a luta de sobreviventes e parentes das vítimas.

"Vamos discutir estrategicamente o que deve ser feito, não só no campo jurídico; também no campo ético e moral, o que devemos fazer, porque a opinião pública, inclusive, está cobrando isso da gente. Eu acho que a gente tem uma missão", argumenta o advogado Boris Lerner, que perdeu dois parentes na tragédia.

Condenação e fuga

A defesa recorreu e, em novo julgamento, os dois gerentes receberam condenação de quatro anos de prisão, em regime semi-aberto. Tinham o dia livre e só precisavam dormir no presídio.

Os dois condenados, o português Álvaro Pereira da Costa e o espanhol Faustino Puertas Vidal, aproveitaram o regime semi-aberto para fugir do país. Foram para a Espanha, que não tinha acordo de extradição com o Brasil.

Indenização

Na esfera criminal, não havia mais nada a ser feito. Restava lutar por indenizações.

Os parentes entraram com diversas ações contra os promotores do passeio e também contra a União, porque o barco tinha sido liberado pela capitania dos portos, órgão da Marinha do Brasil.

"Olha aqui, eu tinha 32 anos quando teve o naufrágio do Bateau Mouche. Eu tinha pouca idade e muito cabelo, posso dizer assim", exemplifica João Tancredo, advogado das famílias das vítimas.

Em 1994, quando a Justiça Federal começou a decidir sobre os processos de indenização, o advogado já previa idas e vindas

"Esse processo, depois dos recursos que serão interpostos certamente pelas partes, o processo volta pro juiz de primeiro grau, pra quinta vara federal, pra ele arbitrar um determinado valor", explica.

Recursos

Ao longo de todos esses anos, houve dezenas de recursos. Por causa dessa ferramenta jurídica, partes dos processos têm de ser revistas. As famílias conseguiram pelo menos uma vitória: os imóveis dos envolvidos estão bloqueados. Valem cerca de R$ 40 milhões.

"Os bens estão bloqueados para garantia dos pagamentos futuros. Você só pode cobrar esses valores quando não mais tiverem recursos pendentes para serem julgados em relação a cada familiar. As ações são separadas, não é uma ação única, não. Cada familiar tem uma ação separada, cada vítima do naufrágio", explica João Tancredo.

Para o advogado, a própria Justiça Federal é a responsável pela demora no julgamento dos processos.

"Processos com cinco anos com um juiz pra dar uma sentença, processos com dez anos com juiz de segundo grau pra dar, pra proferir um acórdão, é lamentável isso. A responsabilidade total desse caso, dessa demora, é da Justiça Federal", argumenta.

Cinco anos atrás, Bernardo, o filho de Yara Amaral, desabafava:

"Será que eu vou chegar a ver a resolução desse processo?"

Hoje, ele continua questionando a Justiça. E torcendo pelo fim de sua luta.

"Existem recursos demais, existem poucos juízes, poucos profissionais na área. Ora, se sabe o problema... Há vinte anos eu escuto isso. Em vinte anos não conseguiram resolver?", pergunta.

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