• Carregando...
Cidade de Pernambuco destruída pela enchente de 2010: ministro usou esse desastre para justificar prioridade dada ao estado. Mas caso não é único no governo | Jonathan Campos/ Gazeta do Povo
Cidade de Pernambuco destruída pela enchente de 2010: ministro usou esse desastre para justificar prioridade dada ao estado. Mas caso não é único no governo| Foto: Jonathan Campos/ Gazeta do Povo

Eleição

Cresce a tensão entre PT e PSB

O fato de o ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra (PSB), ter imposto um desgaste ao governo Dilma Rousseff nos primeiros dias do ano, explicitou uma disputa até então discreta entre PT e PSB. O pano de fundo são os movimentos do partido aliado rumo às eleições presidenciais de 2014.

Dirigentes petistas criticaram abertamente o ministro Fernando Bezerra, apadrinhado político do presidente do PSB e governador de Pernambuco, Eduardo Campos. Secretário nacional de Comunicação do PT, o deputado federal André Vargas, do Paraná, por exemplo, afirmou que a distribuição de verbas foi um equívoco e que Bezerra deve prestar explicações no Congresso.

Para o PSB, o pano de fundo desta disputa é, na verdade, a pretensão política de Campos para as eleições presidenciais. Integrantes do partido acreditam que o PT tem tentado enfraquecer a posição de Campos no cenário político nacional. Nos últimos meses, o governador tem recebido em Recife emissários de vários partidos para sondá-lo sobre 2014. Até integrantes do PMDB têm buscado uma aproximação com Campos. E, na oposição, emissários tucanos já sugeriram uma aliança com o PSB para as eleições de 2014.

Agência O Globo

Ministérios de ‘2.ª classe’ são mais suscetíveis

Clientelismo, personalismo e falta de uma estrutura mais técnica e sólida. Essas são outras causas da distribuição desequilibrada das verbas do Ministério da Integração Nacional. De acordo com cientistas políticos, o problema tem origem não só na estrutura política do país, mas também em problemas típicos de ministérios menos fiscalizados – como o da Integração.

"Esse tipo de problema ocorre em ministérios ‘de segunda classe’. Não ocorreria algo assim na Saúde, na Educação, onde a população fiscaliza mais e onde há uma burocracia mais profissionalizada", afirma Fernando Abrucio, cientista político da Fundação Getulio Vargas de São Paulo. "Nesses casos, a liderança que ocupa o ministério gerencia mais livremente, sem muita fiscalização."

O cientista político Adriano Codato, da UFPR, discorda da avaliação de que o modelo de governo brasileiro, conhecido como presidencialismo de coalizão, possa ser responsabilizado pelo problema. "O problema não está no fato de o partido ocupar o ministério. Ainda assim, a gestão poderia ser boa. O problema está no personalismo e no clientelismo", opina o cientista político.

Federalismo

O problema do paroquialismo na distribuição de verbas públicas não acontece só no Brasil. De acordo com Abrucio, isso ocorre mais em países com regime federativo (com estados autônomos e poder descentralizado), como Estados Unidos, México e Argentina. "Nos EUA, por exemplo, é o Legislativo quem faz o orçamento. E existe muito dessas verbas paroquiais, que servem para atender o distrito de cada parlamentar." Já nos países europeus, em geral, afirma Abrucio, o sistema é diferente. "Na Alemanha, as verbas do governo são distribuídas pela Câmara Alta [equivalente ao Senado brasileiro], o que diminui um pouco esse tipo de protecionismo a uma localidade."

Rogerio Waldrigues Galindo

A falta de regras claras para os repasses de verbas, o sistema político de coalizão montado pelo governo Dilma Rousseff e os interesses políticos dos ministros são vistos como os principais ingredientes do escândalo envolvendo o ministro Fernando Bezerra (PSB), da Integração Nacional. A pasta repassou 90% da verba nacional do programa antidesastres naturais para Pernambuco, estado do ministro. Levantamento da ONG Contas Abertas mostra que dos R$ 29 milhões liberados para o programa no ano passado, R$ 25,5 milhões foram destinados ao estado de Bezerra.

O ministro negou que tenha privilegiado seu estado, pois em 2010 Pernambuco foi fortemente atingido por cheias que devastaram várias cidades. Mas essa não é a primeira vez que a pasta está envolvida num caso como esse. O ex-ministro da Integração Nacional Geddel Vieira Lima (PMDB) foi acusado em 2010 de favorecer a Bahia na liberação de repasses. Entre 2008 e 2009, o ministério repassou cerca de 65% de todos os recursos para municípios do estado de Geddel.

Mais recentemente, o Minis­tério do Turismo também teve um caso semelhante. Em agosto do ano passado, o Maranhão era o líder em novos contratos com o ministério. Na época, o então titular da pasta era o maranhense Pedro Novais (PMDB).

"O que mais motiva esse tipo de ação [a destinação política de verbas] é que o cargo de ministro, que deveria ser técnico, é ocupado por políticos. Desse modo, as políticas adotadas passam a ser partidárias e não públicas", observa o cientista político Malcon Camargos, da PUC de Minas Gerais.

A professora de Ciência Política Maria do Socorro Braga, da Universidade Federal de São Carlos, destaca ainda que os interesses político-eleitorais dos ministros estão concentrados nos seus estados, sintoma do forte sistema federalista brasileiro, o que motiva ainda mais a política de repasses localizados. "Onde o ministro se elegerá como senador, deputado ou governador? Na sua unidade da federação. Então, isso pesa bastante na liberação de verba. Porque ele sabe que a sua trajetória dentro do Ministério, o que conseguiu para o estado, contará na hora da eleição", diz Maria do Socorro.

Um dos sintomas dessa distribuição é a perpetuação de determinados grupos políticos no poder em seus estados, o que é criticado pelo diretor da ONG Contas Abertas, Gil Castelo Branco. "Dessa forma, partidarizada e politizada, a distribuição de recursos acaba deturpando a própria representação partidária", afirma ele.

Coalizão

Para Malcon Camargos, a prática adotada pelo ministro Fernando Bezerra também é um "sintoma da grande coalização partidária necessária para o governo ter apoio suficiente no Congresso". Castelo Branco tem a mesma avaliação. "O ministro se sente devedor do partido ou de quem fez a sua indicação e menos comprometido com o governo como um todo".

Camargos afirma que a situação dificilmente mudará porque a distribuição de cargos em troca de apoio é a principal lógica da política brasileira. Ele ressalta, porém, a necessidade de ser dada a maior transparência possível para os atos do governo para que a prática do uso de critérios políticos na destinação de verbas fique cada vez mais rara.

Critérios claros

Já Castelo Branco acredita que é possível mudar. Ele defende a adoção de critérios técnicos claros para os repasses voluntários, os quais deveriam ser definidos já na elaboração da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). "Para cada ação ou programa do governo, deveriam ser estabelecidos critérios técnicos para os repasses. A mudança já começaria pela LDO, que deveria definir isso."

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]