Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Caixa Zero

É proibido proibir

 |

A Anvisa, agência responsável pela saúde pública dos brasileiros, acaba de se livrar de um trabalho hercúleo. Colocou seus técnicos para ler uma pilha de mais de 267 mil papéis sobre o cigarro. Eram as contribuições que foram enviadas para duas consultas públicas que vinham sendo feitas ao mesmo tempo. Uma prevê a proibição de aditivos no cigarro (eles tornam o tabaco ainda mais perigoso). Outra diz que os maços não poderão mais ficar expostos ao consumidor.

Ao terminar o processo, porém, a agência conclui que apenas 10 cartas referentes à proibição dos aditivos tinham algo a dizer. Da montanha de papel referente à proibição da exposição, só 28 se salvavam. A maioria era pura enrolação. Algumas, diz a Anvisa, nem tinham nada escrito. Eram cartas enviadas em escala industrial só para atrapalhar a Anvisa e retardar as possíveis proibições. Adivinhe quem foi responsável pela maldade? Claro, os lobistas do tabaco.

A ideia da indústria, sabendo que a agência não tem tanta gente assim para trabalhar, era fazer o processo se arrastar pelo maior prazo possível. No fim das contas, demorou menos do que o previsto. As consultas, abertas no fim do ano passado, ainda não completaram 12 meses e tudo está pronto para a audiência pública sobre o tema.

Quem acha que a Anvisa ganhou a parada, porém, é porque não sabe o quanto os industriais do ramo estão obstinados. Para evitar o próximo passo do processo, eles foram à Justiça. E conseguiram anular a convocação das audiências públicas dos dois casos. Elas estavam marcadas para a semana passada. Agora, não têm mais data.

A objeção levada pelo Sindicato Interestadual da Indústria do Tabaco ao Tribunal Regional Federal em Porto Ale­­gre é a seguinte: o auditório que receberia as audiências, no Rio de Janeiro, comporta apenas 200 pessoas. E para provar que se­­riam necessários mais lugares, o sindicato lembrou justamente a montanha de papéis que chegou à Anvisa sobre o tema.

O desembargador Vilson Darós, impressionado com as 250 mil correspondências (que não sabia serem um mero truque) mandou parar tudo. E agora a Anvisa tem de achar um auditório para mil pessoas, no mínimo. Ou a audiência não acontece. E, claro, será preciso seguir novamente toda a burocracia, esperar prazos, etc.

Enquanto isso, claro, mais gente vai vendo os cigarros nas bancas, lojas e cafés. E apesar de o tempo até o fim da consulta ser breve, pode ser suficiente para iniciar mais algumas centenas, talvez milhares, de incautos, no hábito do tabaco. O mesmo associado a tantas mortes, doenças e desespero em todo o mundo. E o cliente cativado agora, nesses meses que a estratégia dos lobistas vem conseguindo, vai ficar cativo, literalmente, por muitos anos. Sabe-se lá até acontecer o que com ele.

PS: Não custa lembrar que muito político paranaense está contra a Anvisa neste caso. Acham que as restrições causarão desemprego na indústria do tabaco. Se for essa a preocupação, o esforço não deveria ser arranjar outra lavoura para o pessoal que planta fumo? Ou a geração de emprego justifica qualquer atividade? Em Foz, por exemplo, há quem fale mal do aperto ao contrabando. Estaria tirando renda do pessoal...

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.