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A reforma da Previdência é necessária, mas mudanças tão rígidas são intragáveis neste momento em que vemos que a classe política que está no Congresso discutindo corte de direitos é a mesma que está sendo encurralada pela Lava Jato. Não gostaria de ser ingênua a ponto de sugerir que esperemos novas eleições para aprovar a reforma. Os próximos parlamentares também podem ter superpoderes corruptos; os que estão aí podem se reeleger por décadas ainda.

Além disso, o problema não são só os políticos. Segundo nota da colunista Mônica Bergamo, da Folha de S. Paulo, o relator da reforma da Previdência, deputado Arthur Maia (PPS-BA), disse que iria gravar as audiências privadas que faz em seu gabinete.

O deputado contou que muitos representantes de corporações fazem pedidos de emendas, vírgulas ou pequenas mudanças no texto a fim de que benefícios específicos sejam mantidos. Mas, em público, falam outra coisa.

Nesse sentido, em que há tantos corruptos e corruptores, dá até para entender a indignação dos políticos que se sentem criminalizados. Eles estão apenas repetindo padrões vigentes na sociedade brasileira, e só eles serão responsabilizados e cobrados?

Dá para entender a lógica da argumentação, mas não dá para aceitar. Não mais. A limpeza da corrupção precisa começar em algum lugar. Que seja no Congresso. Até porque os políticos são responsáveis por bilhões de reais perdidos em propinas e superfaturamento de obras há décadas, e só agora estamos nos aproximando de uma punição efetiva pelos desvios.

Em 1993, por exemplo, tivemos o escândalo dos anões do Orçamento. Deputados aprovavam emendas nas leis orçamentárias para desviar recursos por meio de organizações sociais e empreiteiras. Uma delas era a Odebrecht. Que, por conta do escândalo, mudou sua sistemática de suborn... ops, de “influenciar” o Congresso, conforme delação vazada do ex-diretor Claudio Melo Filho.

Uma CPI no Congresso investigou 37 parlamentares, pediu a cassação de 18, mas só 6 perderam seus mandatos. Naquela época, não havia nenhuma força-tarefa para aprofundar a investigação. Geddel Vieira Lima (PMDB-BA), o ministro de Michel Temer que caiu por ferir o interesse público em nome de seus interesses de bilionário da orla de Salvador, era um dos “anões do Orçamento”, mas foi inocentado na CPI. Ele é um dos políticos que consta na lista atual da Odebrecht.

Ele e outros trezentos, no mínimo. Deputados, senadores, ministros, governadores, ex-presidentes. Alegam que receberam recursos legais ou ainda que foi “só caixa 2”, e não merecem ser punidos.

A Justiça decidirá se é caso de punição ou não. Mas, pela desfaçatez com que tentam se safar das investigações, já perderam o julgamento moral.

Voltando ao assunto da Previdência. Não queria ser ingênua, mas não posso evitar: esses congressistas que estão lá é que vão votar a maior mudança no Estado de Bem-Estar Social do Brasil?

Sim, este é o assunto mais importante para os trabalhadores brasileiros e as novas gerações. E Michel Temer quer aprovar tudo em tempo recorde para mostrar ao mercado que é uma pessoa responsável e comprometida com a gestão fiscal do país.

Tudo bem, ele tem o mérito de propor a reforma, que de fato é fundamental. Mas é preciso tempo não só para analisar os problemas e buscar as soluções, mas principalmente para a sociedade construir um novo pacto em torno do Estado de Bem-Estar Social que queremos e que poderemos ter daqui para frente.

Essa reforma precisa ser melhor debatida e os políticos que temos hoje dão sinais de que não têm condições de apontar a melhor saída para um sistema previdenciário justo e sustentável. Não por falta de capacidade intelectual deles. Mas é que a maioria está preocupada demais em se safar das investigações em curso, e sobra pouco tempo para debater um assunto tão complexo como a Previdência.

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