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Fachada do Tribunal de Justiça: auxílio-moradia começou a ser pago aos magistrados em junho | Felipe Rosa/ Gazeta do Povo
Fachada do Tribunal de Justiça: auxílio-moradia começou a ser pago aos magistrados em junho| Foto: Felipe Rosa/ Gazeta do Povo

Opinião

Aumento não pode vir por subterfúgios

Está claro para quem quiser ver: o chamado auxílio-mo­radia da magistratura tem pouca ou nenhuma relação alguma com o custeio de habitação para juízes que precisam se deslocar de uma cidade para outra. Isso seria perceptível pelo simples fato de o pagamento ser feito a todos os integrantes do Judiciário, independentemente de apresentação de notas ou da necessidade de mudança de sede. No caso dos desembargadores, isso fica ainda mais evidente: moram todos na capital e não têm perspectiva significativa de serem removidos. Se querem discutir seu salário, os juízes precisam fazer isso pelas vias certas, e não por meio de subterfúgios legais. Mais do que isso: é preciso publicar a informação de forma clara e transparente, para que o cidadão saiba o que está pagando e quem está recebendo.

R$ 5,1 mil é quanto, em média, cada desembargador do Tribunal de Justiça do Paraná recebe mensalmente em indenizações.

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De Santa Cruz do Sul (RS), cidade a 150 quilômetros de Porto Alegre, veio a primeira manifestação pública de um magistrado contrário ao auxílio-moradia de que se tem notícia. O juiz Celso Fernando Karsburg, do Tribunal Regional do Trabalho da 4.ª Região, abriu mão do benefício de R$ 4,4 mil mensais por considerar o pagamento "imoral" e "antiético". Depois dele, que publicou artigo em um jornal regional no início de outubro explicando seu ponto de vista, outros dois desembargadores gaúchos também negaram o auxílio.

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Os gastos com indenizações para desembargadores do Tri­­bu­­nal de Justiça do Paraná (TJ-PR) quase quadruplicaram desde a instituição do auxílio-moradia. Em maio, último mês antes do início do pagamento do benefício, o total gasto foi de R$ 163,9 mil. Em setembro, último mês disponível para consulta no Portal de Transparência do órgão, o valor passou para R$ 607,1 mil.

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Cada desembargador recebia, em média, R$ 1,4 mil mensais em indenizações. Ao englobar o auxílio-moradia, a partir de junho, a média subiu para R$ 5,1 mil mensais. A categoria de indenizações da folha de pagamento do TJ inclui ganhos como auxílio-alimentação, auxílio-saúde e outros quatro auxílios. Diárias, férias e 13º não entram na conta.

Levantamento da Gazeta do Povo mostra que, entre os 117 desembargadores do TJ, apenas oito não apresentaram o aumento brusco no recebimento de indenizações. Apesar de o tribunal não especificar na folha de pagamento o valor exato do auxílio-moradia recebido por cada magistrado, a diferença entre os valores dos dois meses é compatível com a estimativa de gastos do TJ com o auxílio.

O levantamento levou em conta os magistrados do topo da carreira do TJ, mas os cerca de 700 juízes e juízes substitutos do Paraná também podem receber o benefício.

Além disso, no fim de se­­tembro, o ministro do Supre­­mo Tribunal Federal Luiz Fux concedeu liminar para que todos os magistrados do país passassem a receber a verba no mesmo patamar que um ministro: R$ 4,4 mil mensais. Portanto, o número de beneficiados e o valor podem ter aumentado. A folha salarial do TJ de outubro ainda não foi divulgada.

A estimativa é que os gastos com o pagamento no estado fiquem em torno de R$ 47 milhões por mês. A reportagem procurou o TJ em diversas situações em busca de informações oficiais relacionadas ao auxílio-moradia, mas nunca obteve resposta.

Além da assessoria de imprensa do tribunal, a reportagem também tentou obter respostas, ontem, com diversos setores internos do órgão, que tampouco repassaram dados sobre o auxílio-moradia.

O recém-eleito presidente do tribunal, Paulo Vascon­­celos, disse por telefone que não poderia comentar o assunto porque estaria ocupado durante todo o dia de ontem. Ao ser questionado se recebia o auxílio-moradia, ele pediu para agendar uma entrevista em outro dia e desligou o telefone.

Em entrevista na segunda-feira, quando foi eleito, Vas­­concelos disse que a concessão do benefício era "coisa de momento" e que não cabia a ele julgar a procedência da concessão, uma vez que foi decisão do atual presidente, o desembargador Guilherme Gomes.

Vasconcelos é um dos desembargadores que aumentaram o rendimento em indenizações. Em setembro recebeu R$ 5.424, ante R$ 1.302 em maio. Gomes também: os ganhos passaram de R$ 1.108 para R$ 5.458. Tribunal terá de divulgar salários

A ministra Luiza Cristina Fonseca Frischeisen, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), deu 15 dias para o Tribunal de Justiça do Paraná (TJ) mudar o sistema de divulgação de salários dos magistrados em seu Portal da Transparência. O TJ deverá retirar a exigência de o usuário ter de informar uma série de dados pessoais para poder ter acesso a cada informação.

A decisão foi tomada a partir de questionamento da reportagem da Gazeta do Povo ao CNJ em setembro deste ano, quando o TJ havia completado três meses sem divulgar salários. A interrupção teve início em maio, quando o TJ instituiu o auxílio-moradia. Os vencimentos de junho seriam os primeiros a virem com o benefício.

As remunerações de junho, julho e agosto só foram divulgadas pelo TJ em setembro, depois que o CNJ intimou a presidência do tribunal a cumprir os prazos. Quando as publicações foram retomadas, o portal do TJ havia sido reformulado com uma mudança de ordem prática: para acessar cada um dos pagamentos, os usuários devem informar nome completo, e-mail e endereço pessoal.

A ministra, que na decisão afirma ter sido surpreendida com a mudança, aponta que a mesma exigência não é imposta a usuários que querem informações sobre a execução do orçamento do TJ e relatórios de gestão, por exemplo.

A justificativa do TJ que consta no Portal de Transparência é que a medida é respaldada pela Lei da Transparência, de 2011. A ministra, porém, afirma que os dados pessoais do solicitante só são necessários em caso de transparência passiva – ou seja, de pedidos de informação sobre assuntos que não foram divulgados espontaneamente. Já a publicação de salários seria um dever do órgão público, que não poderia impor qualquer limitação de acesso às informações.

"Decorre disso que o usuário não deve ser compelido a identificar-se para ter acesso a qualquer informação que o Poder Público já esteja obrigado a prestar espontaneamente", escreve Frischeisen.

A assessoria de imprensa do TJ informou apenas que o órgão ainda não foi notificado. "Os 15 dias contam a partir da notificação e isso ainda não ocorreu", disse, por e-mail. A decisão da ministra é de 3 de novembro.

Colaboraram: Angieli Maros e Rogerio Galindo

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