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Aécio e Dilma no SBT, quinta-feira: nos dois últimos debates, Bolsa Família foi citado 25 vezes pelos candidatos, demonstrando a importância que dão aos eleitores beneficiados pelo programa | Marcos Fernandes/Divulgação
Aécio e Dilma no SBT, quinta-feira: nos dois últimos debates, Bolsa Família foi citado 25 vezes pelos candidatos, demonstrando a importância que dão aos eleitores beneficiados pelo programa| Foto: Marcos Fernandes/Divulgação

DNA do programa gera polêmica

Uma das inovações de Aécio Neves na abordagem tucana sobre o Bolsa Família é ligar a "paternidade" do programa ao PSDB. "Se fizermos um DNA do Bolsa Família, o pai será o presidente Fernando Henrique e a mãe será a dona Ruth Cardoso", disse o candidato do PSDB, durante o debate de terça-feira na Band TV. O senador argumenta que a lei que criou o Bolsa Família cita que a iniciativa começou com a unificação do Bolsa Escola, Bolsa Alimentação e o Auxílio-Gás, criados na gestão FHC.

Dilma rebateu afirmando que o principal programa tucano, o Bolsa Escola, "não era compatível com o tamanho do Brasil". O programa atendia a 5 milhões de pessoas, contra as 50 milhões beneficiadas pelo Bolsa Família atualmente.

O economista Henrique Kawamura, estudioso dos efeitos do Bolsa Família, não concorda com a premissa de que o programa nasceu apenas da junção de experiências do governo FHC. "Ressalte-se que muitos desses programas não tinham abrangência nacional. Além disso, a gerência desses programas era muito difícil e alguns deles não tinham as contrapartidas das famílias, o que limitava os efeitos de longo prazo", diz.

No Bolsa Família, as principais exigências são a vacinação das crianças, acompanhamento pré-natal das mães, matrícula escolar e frequência mínima de crianças e adolescentes. Apesar do reconhecimento sobre o sucesso do programa – na semana passada, a diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, disse que o Bolsa Família é "um modelo para o mundo" e que deve ser mantido –, há dilemas sobre o seu futuro. "Há um consenso de que é preciso dar o passo seguinte ao Bolsa Família. Por outro lado, também é preciso avaliar se esse novo passo carrega a possibilidade de desqualificar ou descaracterizar o programa", diz o especialista em políticas públicas Aninho Irachande.

Ele diz que qualquer avaliação final sobre o Bolsa Família precisa ser feita dentro de uma perspectiva de 20 a 25 anos (um ciclo geracional), ou seja, a partir de 2023. "O ideal é que uma política de distribuição de renda ofereça a ela mesmo alternativas de autoextinção. É algo difícil porque precisa do apoio de outras coisas, como uma política eficiente para a juventude e educação. Acho que o PT até pensou nisso, mas sem uma conexão eficiente para que uma alavanque a outra."

Na avaliação dele, o PSDB também peca ao achar que pode encontrar uma "porta de saída" dentro do próprio programa. "Não há solução fácil para um problema construído ao longo dos últimos séculos e que, bem ou mal, só foi encarado nas últimas duas décadas."

Nos dois primeiros debates televisivos do segundo turno, Aécio Neves (PSDB) e Dilma Rousseff (PT) falaram 25 vezes sobre o Bolsa Família. O assunto também não passou em branco em nenhum dos últimos dez dias de propaganda eleitoral. O bombardeio faz sentido: um a cada quatro brasileiros é beneficiado pelo programa.

INFOGRÁFICO: Veja mitos e verdades sobre o Bolsa Família

Em meio à disputa presidencial mais acirrada dos últimos 25 anos, essa fatia do eleitorado será fundamental para o resultado final. É nela que esteve a base mais sólida de Dilma no 1.º turno. Nos 150 municípios do país com maior proporção de famílias atendidas pelo programa em relação ao total de habitantes, a petista teve uma média de 78% dos votos válidos – ou seja, 36 pontos porcentuais a mais que a média nacional de 42% que a petista obteve.

Quando Marina Silva (PSB) despontou como favorita no início de setembro, boatos de que ela acabaria com o programa ajudaram a fazê-la despencar nas pesquisas – estratégia que já havia sido utilizada contra os tucanos Geraldo Alckmin, em 2006, e José Serra, em 2010. Nem um emocionado depoimento da ex-senadora relembrando que passou fome na infância amenizou a queda. Em um distante 3.º lugar até a última semana antes do 1.º turno, Aécio passou inicialmente ao largo desse tiroteio, mas sabia que uma hora precisaria entrar na dança.

Pré-candidato à Presidência desde 2011, o senador mineiro prepara antídotos para o embate sobre o Bolsa Família há dois anos. É autor de um projeto que incorpora o programa à Lei Orgânica de Assistência Social (Loas). A intenção é transformá-lo em "política de Estado", ou seja, que não pode ser extinta por quaisquer governos.

A sugestão foi uma resposta a uma declaração do ex-presidente Lula, em 2013, de que a oposição iria acabar com o programa, caso eleita. Aécio também apresentou um projeto que amplia o pagamento do benefício por mais seis meses para quem conseguir emprego com carteira assinada. Ambas as proposições ainda tramitam no Senado.

FHC x Lula

"Fernando Henrique Cardoso pode até ter iniciado o processo que desencadeou o Bolsa Família, mas foi Lula quem inegavelmente ficou com o rótulo de ‘pai dos pobres’", diz o professor de Comunicação Política da Universidade Presbiteriana Mackenzie, de São Paulo, Roberto Gondo. "A melhor saída do Aécio tem sido tentar explicar para o beneficiário do programa que o maior inimigo dele é a inflação."

Especialista em políticas públicas e professor da Universidade de Brasília, Aninho Irachande ressalta que tanto o PSDB quanto o PT moldaram discursos eleitorais diferentes da realidade do Bolsa Família. Segundo ele, o núcleo duro dos tucanos não acredita no programa. Por outro lado, seria falsa a premissa de que qualquer adversário dos petistas possa simplesmente acabar com o benefício.

"A verdade é que você tem um programa que não é governamental. Apesar de associado ao PT, é uma conquista do povo brasileiro e transcende qualquer gestão. De fato, o Bolsa Família já é uma política de Estado, posta na legislação, e qualquer presidente precisaria fazer um esforço imenso para desfazê-lo", diz Irachande.

O economista Henrique Kawamura, autor de uma tese de doutorado na Universidade de São Paulo sobre os efeitos do Bolsa Família, também vê poucas mudanças no futuro do programa com qualquer dos dois candidatos. "Não vejo muitas diferenças. O Bolsa Família continuará como está e aumentará a cada dia o número de beneficiários."

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