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Eleições 2016

Em Minas, prefeituras doam lotes em ano de eleições

Legislação eleitoral prevê que distribuição de terrenos seja em casos de calamidade pública

Sujeira de panfletos jogados na eleição passada: Minas enfrente problema com doação de lotes. | Brunno Covello/Gazeta do Povo
Sujeira de panfletos jogados na eleição passada: Minas enfrente problema com doação de lotes. (Foto: Brunno Covello/Gazeta do Povo)

A procuradoria Regional Eleitoral de Minas Gerais (PRE-MG) instaurou, nos últimos seis meses, 11 investigações para apurar denúncias de compra de votos e fraudes em prestações de contas de campanhas, após um pente-fino em 44 inquéritos abertos pelas polícias Civil e Federal. Todos os casos são referentes às eleições de 2012 e, em sete municípios, políticos são suspeitos de trocar benesses por votos ou usar a máquina administrativa com fins eleitorais.

Há casos de distribuição de cargos, cestas básicas, combustíveis e material de construção. Outros seis inquéritos que passaram pela fiscalização do Ministério Público ainda serão remetidos à PRE-MG; 15 estão em fase de diligências e três, em análise pela procuradoria.

“Infelizmente, o histórico de troca de votos por benefícios imediatos se repete em Minas. Muitos vendem o voto e descobrem que elegeram governos que não investirão em Educação, Saúde, saneamento básico, ou seja, o caos que acompanhamos em muitas cidades mineiras”, diz o procurador regional eleitoral, Patrick Salgado Martins, que explica a lentidão nos processos: “As investigações são referentes a 2012. Isso se explica porque há a dificuldade de reunir provas concretas. O TSE exige provas robustas, seja um documento, uma perícia. Quando um eleitor diz que vendeu o voto e o candidato nega, vale a presunção de inocência”.

O MP investiga a compra de votos em Abre Campo, Caputira, Marilac, Pedra Azul, Rio Paranaíba, Taiobeiras e Visconde do Rio Branco. Segundo o procurador, a cultura da venda do voto se mantém forte principalmente no interior. Em Minas, ele cita como regiões críticas o Norte e o Noroeste, onde há a concentração de cidades com população de baixa renda. A reportagem identificou também em municípios da Zona Mata mineira práticas semelhantes às que levaram a instauração de inquéritos e abertura de investigação, como o uso da máquina.

Enquanto o cerco à compra de votos aperta, prefeituras mineiras vão de encontro à legislação e promovem distribuição de lotes, com indícios de uso eleitoral. A entrega de terrenos em ano de eleição só é permitida em caso de calamidade pública, estado de emergência ou programa social em execução orçamentária. No caso, com processo iniciado em 2014 e orçamento previsto para 2015. Mas, o que se vê são promessas de sorteio de lotes, inscrições de interessados mediante apresentação de título eleitoral e áreas sem qualquer infraestrutura e até ruas.

Distante 204 quilômetros do Rio, em Bicas a prefeitura abriu na última terça-feira inscrições para interessados em receber lotes. A cidade tem 15 mil habitantes e, em dois dias, 50 pessoas se cadastraram. As inscrições vão até dia 4. Em Ewbank da Câmara, a 214 quilômetros do Rio, as inscrições foram abertas em 28 de dezembro e vão até 28 deste mês.

Para o procurador, ambos os casos deverão ser avaliados pela Justiça Eleitoral, já que há suspeitas de estarem burlando a lei. Os dois programas de doações de terra deveriam estar em fase adiantada para se enquadrarem à lei, aguardando para este ano apenas a entrega dos lotes. No entanto, em Bicas os 21 terrenos prometidos pela prefeitura no Loteamento Gilson Lamha não possuem infraestrutura: as ruas são de terra, não há rede de esgoto e os terrenos ficam em uma encosta sem obras de contenção ou drenagem.

A lei que prevê a distribuição foi aprovada no fim de 2015, e o decreto municipal que regulamenta o texto foi publicado no início deste mês. Mas o texto deverá ser modificado, já que previa a entrega a beneficiados com renda entre R$ 1.500 e R$ 3.000 – 70% dos inscritos têm renda de até um salário-mínimo (menos de R$ 900).

A aposentada Maria Pedra, de 71 anos, foi uma das primeiras a se inscrever para receber um lote. Com renda de um salário-mínimo, paga R$ 200 para morar numa garagem que transformou em casa: “É o que dá para arrumar com R$ 200 em Bicas. Tenho fé de conseguir um lote e sair do aluguel”.

No município de Ewbank da Câmara, o que deveria ser um loteamento urbanizado se resume a uma rua improvisada aberta numa encosta. Parte da área já apresenta deslizamentos provocados pelas chuvas que caíram este mês. O acesso é precário e não há qualquer infraestrutura.

De acordo com o prefeito de Bicas, Geraldo Magela Longo (PTB), o atraso na distribuição dos lotes deve-se à morosidade na aprovação do programa por parte da Câmara Municipal. Ele nega usar eleitoralmente a distribuição de terrenos:

“O loteamento era para estar mais adiantado, mas o projeto recebeu emenda e atrasou. Não uso eleitoralmente a doação de lotes, não devo disputar a reeleição”, afirma Longo, que promete corrigir falhas no projeto caso seja acionado judicialmente.

O chefe de gabinete de Ewbank da Câmara, Leandro de Oliveira, diz que o processo de criação do loteamento começou em 2015, mas a oposição teria atrapalhado a aprovação na Câmara. Segundo ele, porque o prefeito Mauro Martins Mendes (DEM) tem chance de se reeleger. Oliveira nega o uso eleitoral dos lotes e diz que a infraestrutura está sendo preparada, sem dar prazo para conclusão.

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