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O art. 470 do Código de Processo Penal (CPP), a partir da alteração legislativa processual penal, Lei 11.689/2008, é polêmico. Com efeito, o referido artigo proíbe as partes de fazer referência em plenário a respeito da pronúncia e das decisões posteriores que julgaram admissível a acusação.

Tais hipóteses estão elencadas nos incisos I e II do art. 478, do CPP, que vêm sendo alvo de diversas críticas por parte da doutrina, no sentido de que tal vedação afronta os princípios constitucionais basilares do ordenamento jurídico.

Inicialmente, acredito na importância de destacar-se a relevância política, social e jurídica, advinda com a força de publicação da Lei 11.689/2008, vigente desde 9 de agosto de 2008.

Nesse sentido, sabe-se que na época do positivismo, caracterizado pelo Estado Legislativo, a lei valia em razão de sua autoridade, não levando-se em conta os princípios da justiça. Ou seja, o que predominava era unicamente a vontade do legislador.

Não seria exagero questionar se na atualidade a lei ainda invoca o posto de supremacia? O mais grave é que sua vontade (vontade da lei) deve estar diretamente entrelaçada pela Constituição Federal de 1988.

O fato é que existe um caráter simbólico em tal alteração.

Guilherme de Souza Nucci destaca que "em primeiro lugar, fere-se o direito da parte de argumentar, como bem quiser, em torno das provas existentes nos autos. A decisão de pronúncia e o acórdão, afinal, fazem parte do acervo documental dos autos e não há qualquer lógica em se impedir que a parte deles possa fazer uso. Se a pronúncia ou o acórdão for prolatado em termos inadequados, deve ser anulado e refeito sob o prisma ideal. Entretanto, proibir a parte de fazer referência a importantes decisões constantes dos autos é medida completamente inadequada. A vedação imposta pelo art. 478 é inconstitucional".

A situação contraditória decorre ainda, de que, em primeiro lugar, deve-se ressaltar que a decisão de pronúncia, e até mesmo outras posteriores, estará nas mãos dos jurados, conforme conceitua o parágrafo único do art. 472 do CPP. Sendo assim, pode-se deduzir que eles, os jurados, possuem livre acesso ao conteúdo.

A propósito, evidentemente, o sentido de tal alteração seria coibir termos exagerados, viciados na decisão de pronúncia, e até mesmo um julgamento antecipado, os quais seriam objetos de recurso, face ao adentrar no mérito da decisão... Ou seja, o magistrado deve ser comedido ao elaborar uma decisão de pronúncia, sob pena de tal decisão sofrer os efeitos da nulidade.

Identificado o problema, se a decisão estiver constituída de acordo com a lei, entendo não haver impedimento na leitura e utilização de peças aos jurados.

Justamente por isso, ao impedir o advogado, defensor e/ou promotor de justiça, da leitura de decisão de trecho imprescindível para a busca da verdade real, e no caso, para que se comprove a (in)existência do animus necandi, fere-se flagrantemente o princípio constitucional da ampla defesa e contraditório.

Além do mais, os jurados têm o direito de ter o pleno conhecimento do processo, e é justamente esse ponto que lhes garante a soberania para julgar.

Justamente por isso, é que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já se manifestou sobre a problemática: "Muito embora o STF, em recente julgado de 3/2/09 (HC 96.123/SP, Rel. Min. Carlos Brito), tenha expressado entendimento no sentido de que em razão da superveniência da Lei 11.689/08 – que deu nova redação ao art. 478 do CPP, impossibilitando as partes fazerem referências à sentença de pronúncia durante os debates – não mais haveria o interesse de agir das impetrações que alegassem excesso de linguagem, de outro lado, a norma inserta no novo art. 480, § 3º, do CPP permite aos jurados a oportunidade de examinar os autos logo após encerrados os debates, o que, em tese, e ao meu sentir, justificaria tal interesse. 3. Devem ser desconsiderados da sentença de pronúncia trechos nos quais o magistrado emite opinião quanto à autoria do crime, pois, de alguma forma, pode, em prejuízo à defesa, influir na convicção dos jurados. Entretanto, se a sentença de pronúncia subsiste de maneira independente, admitindo a acusação em face das provas até então produzidas quanto à materialidade e aos indícios de autoria (antigo art. 408 do Código de Processo Penal), não há por que anulá-la por completo. Precedentes do STJ. (REsp-946.289/PE, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ e de 16.3.09)."

E, ainda, Andrey Borges de Mendonça entende que "não há qualquer vedação a que o promotor faça referência à pronúncia ou àquilo que nela conste, inclusive podendo ler referida decisão, até porque a acusação em plenário será feita nos limites da pronúncia, nos termos do artigo 476, caput".

Terá importância suprimir a busca pela verdade real, sendo que o Tribunal do Júri é, sem sombra de dúvidas, palco da democracia, do debate, da cidadania e da justiça social?

À parte do valor jurídico, o contrário disso não é julgamento, senão reprodução (im)perfeita do Estado Legislativo.

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