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Como demonstrar ou evidenciar (o que serve de prova) que a infração foi cometida por decisão de representante legal ou contratual, ou do órgão colegiado, para efeitos de responsabilização penal da pessoa jurídica, a fim de atender à regra do art. 3º da Lei nº 9.605/98?

Sob a ótica da responsabilidade civil e administrativa ambiental, basta a comprovação do dano, que, na maioria das vezes, se reflete com o auto de infração lavrado por autoridade ambiental competente, ou até pelos documentos juntados ao Inquérito Civil Público instaurado pelo Ministério Público.

E no processo penal? Como se prova a autoria da conduta pela pessoa jurídica se a lei especial nada dispõe? Socorremo-nos, neste caso, com a aplicação subsidiária do Código Penal e do Código de Processo Penal. No processo penal o acusado se defende dos fatos e, para tanto, podemos nos utilizar dos meios de prova em direito admitidos para instrumentalizá-la no processo.

Dá-se muita ênfase ao art. 156 do CPP, segundo o qual, a prova da alegação incumbirá a quem a fizer. Na prática, no entanto, vislumbra-se que cabe ao denunciado provar a sua inocência; ou seja, há uma indevida inversão do ônus da prova, como é curial.

O direito processual brasileiro admite qualquer meio de prova, desde que lícita. As mais comuns são: pericial, documental e testemunhal. Inexiste no nosso ordenamento a hierarquia de provas, eis que o sistema adotado para apreciação delas é o livre convencimento motivado do juiz, prescinde de contraditório, como está explícito nos art. 155, caput do CPP, combinado com o art. 93, IX da CF.

A partir da Constituição Federal de 1988 (art. 225) e com a edição da Lei 9.605/98 (art. 3º) surge um problema pouco enfrentado pela justiça: como ficam as garantias processuais penais quando o acusado é a pessoa jurídica em decorrência de atos considerados lesivos ao meio ambiente? Importante destacarmos que, para tal responsabilização, é necessário que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade, disposição legal muitas vezes esquecida pelos operadores do direito.

Como dissociar a conduta da pessoa jurídica da conduta do seu representante legal ou contratual ou de seu órgão colegiado? Quais os procedimentos a serem adotados para atingir tal fim, já que há dois acusados distintos e ambos necessitam de um processo penal justo?

O legislador pátrio ainda não solucionou tal questão, como a Lei de Adaptação francesa (Lei 92-1336 de 16/12/1992) o fez. No Brasil vigora o princípio de não produção de prova contra si mesmo, também chamado direito de não se autoincriminar disposto no art. 8º, 2, "g", do Pacto de São José da Costa Rica. E aqui reside a dificuldade quando o acusado é pessoa jurídica, um paradoxo processual.

Se há uma intimação policial ou do órgão do Ministério Público para que a pessoa jurídica apresente todas as atas de reuniões e assembleias, poderia ela se recusar a fazêlo? Cremos que sim, respaldado no princípio do nemo tenetur se detegere. No entanto, poderia se entender que estariam os seus representantes legais incursos no art. 330 do CP (desobediência) ou até mesmo no art. 10 da Lei de Ação Civil Pública.

Mas e se a intimação é para pessoa física? Aqui teremos uma armadilha processual. Ao se juntar a documentação para tentar eximir a responsabilidade do indivíduo, invariavelmente se incriminará a pessoa jurídica. Portanto há uma responsabilidade penal objetiva velada.

Caso não seja possível a produção de prova documental, nos socorremos com a prova testemunhal. Aqui, não vale, para se aferir a responsabilidade penal da pessoa jurídica, o depoimento dos fiscais do órgão ambiental, pois estes não integram o dia a dia da sociedade. Faz-se necessário a oitiva de testemunhas que saibam da decisão do representante legal ou contratual ou do órgão colegiado. De novo há uma dificuldade. Ao se ouvir um diretor, por exemplo, e este confirmar a sua presença e participação no ato decisório, temos o que pode ser a denúncia aditada para incluí-lo no polo passivo da ação penal; e, se ele faltar com a verdade, incorrerá no crime de falso testemunho. Embora, neste caso, não há como se tomar o compromisso, pois é óbvio que a testemunha tem interesse direto na causa.

Outra questão é o interrogatório, quem seria ouvido neste momento? E a confissão. Se não se sabe quem deverá ser interrogado, como admitir-se a confissão? Criaríamos um contrassenso jurídico ao admitir a confissão da pessoa física em prejuízo da pessoa jurídica e dos seus demais sócios. Seria retirar dessa prova (sem adentrarmos na questão de ser prova ou meio de defesa) o seu caráter personalíssimo.

Não há dúvidas de que existirão conflitos de interesses e de princípios, os quais deverão ser dirimidos pelo julgador caso a caso quando da busca da verdade real processual, pois, caso contrário, a pessoa jurídica será sempre responsabilizada e a ampla defesa lhe será negada.

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