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A prática de atos processuais respeita os prazos previstos na lei. É assim que o procedimento "caminha", de modo a cumprir a função jurisdicional do Estado. Mas isso é um tormento para quem trabalha com o processo civil. Prazos impróprios para o juiz; prazos próprios, que são fatais para as partes.

O Projeto do Novo Código de Processo Civil contém várias propostas inovadoras a respeito. Separei três delas para tratar neste texto. A primeira é a que praticamente uniformiza os prazos para a interposição de recursos. O art. 1.016 § 5º dispõe que o prazo para interposição e para resposta, em todos os recursos, menos o de embargos de declaração (5 dias), será de 15 dias.

É um bom avanço, sob a perspectiva da gestão dos prazos. Sem que haja prazos diferentes para cada tipo de recurso, haverá elemento facilitador no seu controle. Mas não é só! Igualar os prazos da apelação e do agravo significa tratar esses dois recursos com isonomia, especialmente porque há decisões que mesmo tendo conteúdo de sentença, são agraváveis, como o é a decisão da liquidação de sentença.

A segunda proposta é fonte de muita discussão e polêmica. O art. 219 prevê que na contagem do prazo, quando se der em dias, "computar-se-ão somente os úteis". Há três argumentos contrários: o primeiro é o de que haveria confusão na contagem desses prazos, dificultando seu controle pelos órgãos judiciários. Reconheço que essa norma pode causar certo desajuste inicial, pois nos tira da zona de conforto, mas esses problemas serão compensados pelas vantagens.

O segundo argumento é o de que essa alteração beneficiaria apenas os advogados. Concordo que esse método é bom para os advogados que atuam sós ou em pequenas sociedades. No Paraná há um bom número de sociedades familiares. Tenho ex-alunos e ex-alunas que se associam ao pai ou à mãe, ao irmão, à irmã, à esposa ou ao marido, ao colega de faculdade. Que mal há em beneficiá-los com regra que contém traços de humanidade se com isso ninguém terá prejuízo? Prazo de cinco dias corridos, com início na quinta-feira, por exemplo, exige do profissional dedicação no fim de semana. E isso vira regra de trabalho, o que é desumano. Ministério Público, Defensoria e Procuradorias também serão beneficiadas, quando de prazo próprio se tratar. Nada há de ilegítimo na proposta. Ao contrário, preservar-se-ão os dias de descanso desses profissionais, em respeito à sua dignidade.

A última das três críticas é a de que prejudicaria a celeridade do processo. Considero cínica a afirmação de que aos prazos e ao sistema recursal se devam debitar as mazelas do processo, inclusive a eventual morosidade. Há questões culturais que estão na base desse problema. Destaco a burocracia e seus múltiplos e nefastos efeitos.

A burocracia é "mãe" da ineficiência e gera lentidão em qualquer tipo de procedimento, seja judicial ou administrativo, inclusive no plano privado. Há exemplos históricos dessa herança cultural que "grudou" na alma do brasileiro. Não faz muito tempo que o candidato à obtenção de algum benefício previdenciário devia provar a condição de estar vivo. Para isso, apresentava o "atestado de vida".

A boa-fé não é a regra motriz dos relacionamentos pessoais, institucionais ou negociais. Queremos mais e mais "garantias". A mentalidade burocrática nos sugere mecanismos que nos fazem exigir prova antecipada da boa-fé, mediante certidões e mais certidões. Estou errado?

Também não há eficiente gestão da massa de processos e isso "beneficia" a demora. Não trabalhamos de modo multidisciplinar. Com isso, deixamos de adotar noções de gestão eficiente, organização de procedimentos e logística. A ideia de produtividade passa longe de nós. O que afirmo é que há causas de origem cultural determinantes da morosidade dos processos em algumas áreas do Poder Judiciário.

A última das três propostas que destaco é a que resolve o problema da precocidade na prática do ato processual. O 4º do art. 218 prevê que será tempestivo o ato praticado antes do início do prazo. Parece óbvio, mas não é. A discussão sobre a precocidade na prática dos atos processuais é intensa. A parte que se adianta à intimação pode ser penalizada porque estaria praticando esse ato fora (antes) do prazo.

O recurso interposto depois do final do prazo é intempestivo. O problema é que setores da jurisprudência entendem ser intempestivo o recurso interposto antes do início do prazo. Eu vejo aqui um exemplo dessa cultura do atraso (burocrática), segundo a qual a parte cuidadosa, vigilante, é penalizada porque se adianta à intimação. Se a decisão já é conhecida pela parte (por seu procurador) e se estão presentes os requisitos gerais e específicos exigidos pela lei para a interposição do recurso, não há justificativa razoável para que a parte seja impedida de recorrer antes do início do prazo.

Espero ter sido claro! Os textos do projeto falam por si mesmos.

Luiz R. Wambier, advogado no Paraná e em Brasília, é doutor em Direito pela PUC-SP e professor no Programa de Mestrado da Unipar e nos cursos de especialização do Instituto Bacelar e da PUC-SP.

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