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Excesso de leis é comum na sociedade contemporânea

O levantamento do Ins­tituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) mostra também que 4,6 milhões novas normas foram criadas no Direito brasileiro desde a promulgação da Constituição de 1998. O professor do mestrado em Direito Constitucional da UniBrasil Paulo Schier avalia que a inflação legislativa é uma tendência da sociedade contemporânea. "Isto reflete uma pretensão de que a lei trate de todas as matérias", afirma.

Depois da Constituição Federal de 1988, o Brasil presenciou a criação de leis que atendem a demandas de grandes grupos, como o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), Código do Consumidor (1990), Estatuto do Idoso (2003) e o Estatuto da Igualdade Racial (2010). Mas há também leis que parecem fazer pouco ou nenhum sentido.

Scheir aponta como absurda, por exemplo, existência de uma lei que trate dos rótulos de bebida (Decreto Nº 6.871/2009, da Presidência da República). Outro exemplo é o decreto municipal, feito pelo prefeito de Bocaiúva do Sul (PR), Élcio Berti, em 1997, que proibiu a venda de camisinhas e anticoncepcionais para tentar reverter a baixa taxa de natalidade na cidade. Após 24 horas a lei foi revogada.

Insegurança jurídica

Uma das piores consequências do excesso de normas é a insegurança jurídica. Para Schier, a quantidade de leis que surgem a todo instante, aliada a interpretações que se alteram com frequência, fazem com que exista cada vez menos segurança jurídica. "Cada vez mais os direitos adquiridos são revistos, a segurança jurídica é relativizada e, cada vez, mais precisamos dela. O cidadão fica numa situação de instabilidade."

O professor de Direito Tributário da Universidade Federal do Paraná (UFPR) José Roberto Vieira tem um posicionamento semelhante. "Vivendo numa parafernália legislativa como essa, nos sentimos absolutamente inseguros. Este é o grande problema da nossa civilização. Nietzsche dizia que, quando não temos segurança, nossa civilização se transforma em uma nova barbárie".

"Vamos absorver riquezas tributáveis por meio dos impostos e vai chegar um momento em que não haverá o que ser tributado."

Betina Treiger, professora de Direito Tributário da UFPR

"[As reformas] não foram aprofundadas, na raiz dos problemas, mas casuais."

João Eloi Olenike, presidente do IBPT

"Vivendo numa parafernália legislativa como essa, nos sentimos absolutamente inseguros. Este é o grande problema da nossa civilização. Nietzsche dizia que, quando não temos segurança, nossa civilização se transforma em uma nova barbárie."

José Roberto Vieira, professor de Direito Tributário da UFPR.

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Levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) mostra que, desde que a Constituição Federal entrou em vigor, em 1988, foram criadas 290.932 normas tributárias no país. Em média, foram cerca 30 novas normas tributárias editadas por dia, nos últimos 24 anos. O estudo do IBPT, chamado "Quantidade de Normas no Brasil: 24 anos da Constituição Federal de 1988" apurou, ainda, que, neste período, foram feitas 14 reformas relativas ao Direito Tributário.

A quantidade não tem sido sinônimo de qualidade. A professora de Direito Tributário da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Betina Treiger avalia que as mudanças no Direito Tributário têm sido mais frequentemente negativas, já que a intenção é agravar a tributação. "Evoluíram os procedimentos administrativos de fiscalização, diante da informatização, mas isso não é devido à legislação", constata a professora.

O presidente do IBPT, João Eloi Olenike, observa, ainda, que as reformas "não foram aprofundadas, na raiz dos problemas, mas casuais." As melhorias, na opinião dele, foram para o governo, já que a arrecadação aumentou. "Foi bom para aumentar o consumo, com desoneração. Este tipo de ação só é feita pela política econômica e não pela população."

Mudanças necessárias

Apesar da quantidade de normas já existentes, os especialistas em Direito Tributário reconhecem que é necessário revisar a legislação atual. A carga tributária brasileira é a 15ª do mundo e equivale a 35% do Produto Interno Bruto (PIB).

O professor de Direito Tributário da Universidade Federal do Paraná (UFPR) José Roberto Vieira observa que a carga é ainda mais pesada devido ao grande índice de evasão, ou seja, aqueles que pagam, pagam pelos que sonegam. Além disso, o retorno que o contribuinte tem é muito baixo se comparado ao que paga.

O presidente do IBPT defende que não é preciso fazer uma reforma ampla, geral e irrestrita, de uma só vez. Ele sugere que este trabalho seja feito de forma paulatina, fatiada, começando pela contribuição do Programa de Integração Social (PIS) e pela Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Confins). A cada ano, sustenta Olenikeiria, deveria se tratar de um assunto distinto, até que, em três ou quatro anos, houvesse uma reforma completa.

A professora Betina defende uma revisão que tenha como foco a "sustentabilidade do sistema tributário". Segundo ela, se o sistema continuar como está "vamos absorver riquezas tributáveis por meio dos impostos e vai chegar um momento em que não haverá o que ser tributado". Por isso, ela argumenta que qualquer novidade na lei precisa visar à manutenção das riquezas para que continuem a ser tributadas.

Operadores do Direito

Uma revisão ou organização mais eficaz das leis se faz necessária não apenas para reduzir a carga tributária, defendem os especialistas, mas também para que os operadores de Direito, que lidam com o assunto no dia a dia, tenham mais clareza de quais normas devem levar em conta ao executar seus trabalhos.

De todas as normas sobre Direito Tributário criadas desde 1988, apenas 7,5% estavam em vigor no início de outubro deste ano. Para Vieira, se a legislação vigente fosse obedecida, boa parte dos problemas seria resolvida. Ele chama atenção para o fato de o Código Tributário Nacional (CTN) determinar no artigo 212 que, até o dia 31 de janeiro de cada ano, os Poderes Executivos federal, estaduais e municipais devem expedir por decreto a "consolidação em texto único, da legislação vigente, relativa a cada um dos tributos". Isto, diz ele, poderia ser um bom remédio para a confusão sobre qual decreto, lei ou resolução seguir.

Vieira descreve a situação como "caótica, em termos de confusão legislativa". Por outro lado, ele reconhece que a grande dificuldade para se lidar com a variedade leis em boa parte justifica o trabalho do advogado, já que se torna praticamente impossível para o cidadão comum lidar com tamanha complexidade legislativa.

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