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O cruzamento de informações tributárias não é novidade para as empresas e para os profissionais da área, já que é uma realidade tecnológica recorrente e evolutiva. Contudo, essa interseção de elementos fiscais ficou ainda mais evidente em 2016, inclusive para as pessoas físicas e para suas respetivas movimentações bancárias.

As transações financeiras das pessoas físicas sempre foram, de certa forma, identificadas pelo Fisco Federal, mas o que aconteceu em 2016 é um divisor de águas no monitoramento dos saldos das contas e o reflexo no imposto de renda dos cidadãos. É que desde agosto deste ano os bancos e demais instituições equiparadas estão obrigadas à apresentação das informações relativas às operações financeiras quando o montante global movimentado ou o saldo, em cada mês, for superior a R$ 2 mil. Esse controle também atinge pessoas jurídicas, mas com enquadramento acima de R$ 5 mil.

A propósito, toda vez que uma pessoa física ultrapasse este limite de R$ 2 mil, as instituições deverão prestar as informações relativas a todos os saldos anuais e a todos os demais montantes globais movimentados mensalmente, ainda que para estes o somatório mensal seja inferior ao referido limite.

Todo esse volume de informação é repassado pela e-Financeira, obrigação acessória que os bancos, de uma maneira em geral, estão obrigados a transmitir à Receita Federal por meio do SPED, sob pena de aplicação de severas multas pecuniárias.

Em outras palavras, a Receita Federal já tem acesso a um relevante mecanismo de controle que servirá, dentre outros objetivos, para a arrecadação de eventual imposto de renda pessoa física omitido integral ou parcialmente. Com o controle nas duas pontas, o Fisco poderá confrontar de modo certeiro as informações da e-Financeira com outros dados, como, por exemplo, as informações inseridas ou não na declaração de ajuste anual do imposto de renda das pessoas físicas, notadamente de evolução patrimonial e os rendimentos recebidos.

Os técnicos da Receita, no entanto, negam que a nova regra represente uma invasão de privacidade dos dados sigilosos, uma vez que o Fisco não pode ter acesso nem à origem nem ao destino dos recursos. De acordo com a legislação, está vedada a inserção de qualquer elemento que permita identificar a origem ou o destino dos recursos utilizados nas operações financeiras.

Originalmente, o fundamento da obrigatoriedade da e-Financeira é extremamente válido, uma vez que é uma das inúmeras medidas que o governo brasileiro pactuou em acordos internacionais, com o objetivo de evitar lavagem de dinheiro em se tratando de corrupção, terrorismo, tráfico de armas e entorpecentes, bem como para reprimir planejamento tributário internacional abusivo. Um deles é o acordo entre o governo da República Federativa do Brasil e o governo dos Estados Unidos da América para intercâmbio de informações e melhoria da observância tributária e implementação do Foreign Account Tax Compliance Act (FATCA). Essa transparência e controle das informações financeiras e tributárias é uma realidade nos países que concentram o comércio mundial, e o Brasil, enquanto um player global, está necessariamente obrigado.

Por outo lado, em tempos de ajuste fiscal e caixa apertado, esse intercâmbio de informações pode ser uma justificativa do governo para um incremento na exigência de imposto de renda. Afinal, o limite mensal de R$ 2 mil tem alcance da maioria dos contribuintes que, por algum motivo, pode não estar recolhendo o imposto de renda pessoa física na forma como o Fisco Federal entenda (que nem sempre é a posição correta).

Mesmo com a justificativa oficial da implantação da e-Financeira, resta aguardar como será o comportamento da Receita Federal ao passar dos anos. Em resumo, os contribuintes pessoa física terão que aguardar como será a conduta do Fisco no sentido de cruzar informações e, a partir destes dados, aproveitará para exigir mais imposto de renda dos cidadãos que tenham movimentação ou saldo acima do parâmetro. Mesmo porque a transparência das informações, inclusive das tributárias, é um caminho sem volta aos contribuintes brasileiros.

Ricieri Gabriel Calixto, consultor tributário do escritório Marins Bertoldi e professor de Direito Tributário. Especialista em Direito Tributário, Internacional e Contabilidade.
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