
O histórico da execução orçamentária do governo do Paraná mostra que um dos maiores riscos apontados pelos críticos ao recém-criado Sistema de Gestão Integrada dos Recursos Financeiros do Estado (Sigerfi) o caixa único estadual pode de fato já estar ocorrendo. Desde 2005, o Tribunal de Contas do Estado (TC) alerta que nem toda verba do Executivo com destinação específica prevista em lei é aplicada onde deveria. Com a conta única, em que todo o dinheiro estará "misturado", esses recursos poderão ser gastos da forma como o governo quiser e não serem repostos. Isso ocorre no Rio Grande do Sul há 14 anos, a ponto de o déficit nas contas públicas gaúchas ter atingido R$ 2 bilhões.
Regulamentado na última terça-feira, o Sigerfi vai gerir todas as receitas e despesas do Executivo estadual numa única superconta bancária. Integrantes do próprio governo admitiram que, diante das dificuldades financeiras do estado, essa foi a forma encontrada para permitir o remanejamento de dinheiro dentro do caixa. A regulamentação da lei, porém, não cita em nenhum momento como se dará a garantia de que recursos com destinação específica como verbas destinadas à saúde, educação, segurança pública e meio ambiente, por exemplo não serão usados em outras áreas. E, se isso ocorrer, como serão repostos.
Nos relatórios de análise das contas do governo desde 2005, o TC aponta reiteradamente irregularidades na gestão dos fundos especiais, que, por lei, "se vinculam à realização de determinados objetivos ou serviços". Classificando como "sofrível" o desempenho dos fundos em 2011, já na gestão Beto Richa (PSDB), o tribunal afirma que o Executivo não realiza "o repasse integral dos recursos que compõem as receitas previstas nas respectivas leis" que criaram os fundos a média histórica é de 70%. Alertando para o "descaso" com que são tratados os fundos especiais, a corte determinou que o governo reavalie a utilização desses recursos.
Críticas
Presidente da Comissão de Gestão Pública e Controle da Administração da OAB do Paraná, o advogado Luciano Elias Reis diz ter uma enorme preocupação em relação ao modo como o caixa único vai gerir as verbas dos fundos especiais. Segundo ele, desvirtuar a finalidade do dinheiro público atrelado a um fim específico é uma falha gravíssima. "A conta única deixa uma probabilidade para que isso ocorra, além de criar o risco de os recursos não serem devolvidos", alerta.
Já a representante da OAB estadual no Fundo Penitenciário (Fupen) um dos 15 que compõem o Sigerfi , a advogada Isabel Kügler Mendes classifica a criação do Sigerfi como absurda e diz que levará o debate sobre a legalidade da medida à próxima reunião do grupo. Ela questiona, por exemplo, como passará a ser feita a prestação de contas dos cerca de R$ 3 milhões mensais administrados pelo Fupen, que é "rigorosa ao ponto de detalhar gastos de alguns centavos apenas". "Como vamos aprovar essas contas? E se o dinheiro do fundo for autorizado para outro fim?", compara.
Outro lado
Richa defende método e cita exemplo do governo federal
Na última quarta-feira, o governador Beto Richa (PSDB) defendeu a criação do caixa único estadual e afirmou que o mesmo modelo é adotado pelo governo federal desde 1987. Segundo ele, o sistema vai "otimizar" e dar mais "transparência e racionalidade" aos gastos públicos. "As acusações [contra a conta única] são indevidas, sem sentido. O governo federal utiliza esse modelo há 20 anos, e nunca houve problema. Pelo contrário, é um avanço", afirmou. "Não há o que temer. Qualquer erro, o governo e eu, pessoalmente será responsabilizado por isso."
No entanto, o desvio de finalidade apontado pelo TC desde 2005 em relação ao uso dos recursos dos fundos especiais paranaenses, por exemplo, não teve qualquer implicação efetiva ao gestor. Isso porque o tribunal nunca reprovou as contas do Executivo em sua história. Via de regra, a corte aprova os números com algumas ressalvas e determinações.
Já o secretário Luiz Carlos Hauly, em entrevistas à Gazeta do Povo, defendeu que o novo sistema vai servir para modernizar e tornar mais transparentes as contas públicas de todo o Paraná com relação às prestações que devem ser feitas ao governo federal.
Outro argumento é que, ao centralizar todas as verbas numa única conta, é possível negociar com os bancos uma remuneração de juros maior.



