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Solar do Rosário: complexo cultural privado é tido como exemplo de imóvel bem preservado. | Ivonaldo Alexandre/Gazeta do Povo/Arquivo
Solar do Rosário: complexo cultural privado é tido como exemplo de imóvel bem preservado.| Foto: Ivonaldo Alexandre/Gazeta do Povo/Arquivo

No meio do caminho tinha um patrimônio histórico, tinha um patrimônio histórico no meio de muitos caminhos e interesses, e, por isso, ele não foi preservado. Esta é a sina de muitos bens no Brasil, país que ainda patina em legislação e incentivo para a preservação. Se mesmo uma cidade turística como Ouro Preto (MG), tombada como patrimônio cultural da humanidade em 1980, não consegue se manter intacta, o que Curitiba pode fazer nesta área?

O arquiteto e historiador Key Imaguire Júnior, natural do bairro São Francisco, que abriga o Centro Histórico de Curitiba, reconhece avanços na legislação recente sobre a preservação de bens materiais e imateriais, mas ressalta: “A lei não resolve a situação atual. É preciso mudar a mentalidade dos proprietários, assegurando que a manutenção dos espaços não represente prejuízo”, observa.

Um exemplo bem-sucedido, diz ele, é o Solar do Rosário, um complexo cultural inaugurado por iniciativa privada em um casarão do fim do século 19. O espaço, também usado pelo poder público, oferece cursos e tem galeria de arte, livraria e café.

No geral, porém, o poder público precisa alocar recursos para a preservação. Na Europa, observa o professor Key, a paisagem cultural-histórica é extremamente importante para muitos locais, que se beneficiam do turismo. “Sem investimento não há retorno. Mas há que se dizer que a preservação deve ser feita pela importância que carrega, não pelo turismo em si”, acrescenta.

Participação pública

O arquiteto Frederico de Holanda, pesquisador-colaborador da Universidade de Brasília (UnB), ressalta que o poder público tem papel fundamental para discutir o que é preciso preservar.

“Toda cidade tem uma memória, mas é preciso sensibilidade para levantar, com inúmeros sujeitos sociais, o que é mais importante”, diz. Ele lamenta casos em que apenas uma categoria profissional é chamada a dar um veredicto.

“Não se pode fiar apenas no conceito dos arquitetos, ou só dos antropólogos, ficar só atendendo as corporações é uma visão muito estreita. É preciso conversar com pessoas de todas as classes sociais, representando diversas categorias profissionais”, explica.

Holanda sugere a atuação efetiva de conselhos consultivos e a ampla divulgação de temas de preservação em audiências públicas, em reuniões de associações de moradores e de outras entidades.

“Haverá muito embate, muito conflito, mas a cidade é assim, é preciso fazer o embate para ver qual posição vai ganhar, o que precisa mesmo ser preservado. Há muita coisa antiga que não presta, assim como coisas novas. É preciso fazer muito debate mesmo”, afirma.

Curitiba ganhou legislação de tombamento somente em 2016

Tem apenas cinco meses a Lei de Proteção ao Patrimônio Cultural de Curitiba (nº 14.794/2016), que criou mecanismos para preservação de bens imóveis e bens imateriais. A norma prevê incentivo para a manutenção das edificações e penalidades ao descumprimento das normas.

Até então, a capital paranaense geria os bens de interesse histórico por meio de decretos que criavam unidades de interesse de preservação (UIPs), mas que com o passar do tempo foram sendo questionadas na Justiça por proprietários que preferiam derrubar as edificações.

A preservação já estava prevista no Plano Diretor sancionado no fim de 2015. Segundo a arquiteta e historiadora Manoela Rufinoni, professora na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), a preservação de arquiteturas e espaços urbanos de interesse histórico e cultural precisa ser debatida junto com o plano mestre de desenvolvimento da cidade.

“Quando a questão da preservação do patrimônio arquitetônico chega a ser discutida em âmbito municipal, geralmente fica restrita às secretarias ou conselhos especificamente voltados para esse tema, sem contato com os órgãos públicos responsáveis pela gestão das transformações urbanas”, lamenta.

A vantagem de fazer a discussão conjunta, diz Manoela, é permitir uma gestão mais cautelosa das “transformações urbanas que tanto ameaçam o patrimônio das cidades”.

Mecanismos como incentivo à recuperação e restauro de imóveis históricos, tombados ou não, atraindo a atuação da iniciativa privada para este setor, são fundamentais, ressalta Manoela. “Na maioria das cidades, a política dos planos diretores e as legislações voltadas ao uso e ocupação do solo, infelizmente, apresentam normativas que incentivam somente as novas construções, alimentando o processo de demolição e reconstrução das cidades” observa a arquiteta.

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